Quando escrevo um texto como este, lamentando a alienação política e a apatia generalizada que tomaram conta do meio gay, não acho que esteja chovendo no molhado. Mesmo sem me considerar um formador de opinião, acredito que compartilhar essas reflexões pode levar outras pessoas a também pensar sobre o assunto. Não deixa de ser uma forma de fazer alguma coisa para tentar melhorar nossa situação. Por outro lado, não ignoro que esse tipo de iniciativa tem um impacto limitado. Muitos leitores até concordarão com o que eu digo, irão se sentir incomodados por alguns instantes, mas logo virá outro post para distraí-los, e a eventual indignação acabará evaporando sem que ninguém tire a bunda da cadeira. E assim ficamos.
Tenho pensado em outras maneiras de fazer a minha parte. Como é possível virar a mesa? Algumas pessoas são realmente acomodadas: aguardam a misericórdia da sociedade, e contentam-se em colher os frutos do que for plantado por outras pessoas. Mas sei que há gente que se importa e até gostaria de fazer algo, mas não sabe como.
"As bibas são individualistas", "está todo mundo entorpecido pela mídia", "a inclusão que importa hoje é a do consumo". Sim, essas constatações são todas verdadeiras. Se formos esperar que os 3 milhões de pessoas espremidos pela Avenida Paulista dêem as mãos e promovam uma mudança, estaremos ferrados. Seria lindo se toda a vasta comunidade LGBT se unisse, mas, sejamos realistas, isso possivelmente não vai acontecer. Não posso falar por todos, mas olho ao meu redor e vejo muito mais gente tirando o corpo fora do que se importando de verdade. Então, não há saída? Há sim, mas não dá mais para viver uma utopia, sonhar com uma união que parece cada vez mais distante. A esperança não está nas atitudes coletivas, e sim nas individuais.
Mas por onde começar? Transformando palavras vagas e ideais abstratos em atos concretos, coisas que estejam ao alcance de cada um de nós. Nasceu aí minha ideia de fazer uma cartilha, uma lista de medidas exequíveis, palpáveis, realistas. Pequenas atitudes para cada um adotar no seu cotidiano, dentro de suas possibilidades individuais, que variam de uma pessoa para outra. São sugestões; ninguém precisa acatar todas elas, basta cumprir aquelas que estão mais próximas de sua realidade. Rodolfo, que é fortão, pode socorrer uma biba que está levando um coió ou sendo agredida; já Lucas, que é franzino, pode escrever uma manifestação de repúdio a um programa de TV homofóbico, e mandar para um jornal. Plínio, que é podre de rico e não suja as mãos nem com seu poodle, pode remanejar o valor de um jantar por mês para ajudar alguma ONG que auxilie travestis, soropositivos ou vítimas de preconceito. Todos nós podemos nos manter melhor informados sobre o mundo que nos cerca, e deixar de abaixar a cabeça quando vemos nossos direitos sendo preteridos.
A ideia é que cada um, sozinho, tome pequenas atitudes que transformem o mundinho ao seu redor, e assim ajudem a fazer a diferença. Eu faço aqui. Você faz aí. Eventualmente, os amigos dos amigos, que moram em Novo Hamburgo, Manaus ou Feira de Santana, se animarão também. Claro que nem todo mundo pode se dar ao luxo de sair do armário heroicamente e ser crucificado em seu círculo social. Mas cada um faz o que pode. E olha: tem coisa pra caramba que dá para fazer. Cada um no seu quadrado, podemos acabar gerando uma formidável corrente do bem. Pessoas comuns, anônimas ou não, entre seus amigos e familiares, fazendo um trabalho de formiguinha e multiplicando-o, semeando inclusão, promovendo cidadania e ajudando a enfraquecer o preconceito.
Para me ajudar na elaboração dessa cartilha, resolvi convidar mais cinco blogueiros (Gustavo, Cris, Daniel, BHY e Isadora) que, além de estarem entre os meus preferidos, têm uma visão crítica e que vai além dos muros da boate. Nem sempre estamos afinados com as mesmas opiniões, mas as divergências só vão enriquecer o resultado. Minha ideia é trabalharmos em cima disso pelos próximos 15 dias, até chegar a uma lista final com 50 itens. E publicar a cartilha em nossos blogs, na segunda-feira logo depois da Parada - quando todo mundo já "celebrou o orgulho" e está prontinho para esquecer a causa pelo resto do ano. Eu boto fé, e você? Sugestões serão sempre bem-vindas.
27 comentários:
A gente tem que botar fé mesmo, Thi. No dia-a-dia, temos um milhão de críticas ao mundo que nos cerca, mas muitas vezes deixamos escapar as pequenas coisas que podem ser feitas. Já ia começar a dar um montão de exemplos, mas me segurei. Vamos guardá-los para a lista. Um beijo!
Não sabia que você me achava alienado.
Ihhh, será que vou despertar a ciumeira dos outros blogueiros? rs...
Legal, Thiago! Bela iniciativa!
Só discordo de uma coisinha: você diz que a esperança não está nas atitudes coletivas e sim nas individuais. Acho que a esperança está na conjunção de ambas as coisas ou nas duas separadamente, mas envolve as duas sempre. Aliás, sua iniciativa também é coletiva, um coletivo de 5 blogueiros. :)
Esse lance de esperar um novo Milk não faz sentido nenhum hoje. Discordo totalmente da idéia de que ativismo deve envolver sacrifício pessoal. Essa idéia não é nada atraente. É bem mais interessante que todos possam fazer algo com que se sintam bem e dentro dos seus limites do que as pessoas ficarem esperando por alguém que vá se sacrificar por elas.
Contribuirei com sugestões por e-mail!
achei boa a iniciativa e se puder ajudar, conte comigo
Obrigado, Alberto! Se tiver sugestões, mande pra gente. Aliás, isso vale para todos que se interessarem!
Legal, aguardo pela cartilha, será legal transformar palavras em ação :)
sugestão prática:
não publique na segunda logo depois da parada.
o povo ou vai estar semi-morto ou só vai querer comentar sobre o que se passou dentro dos muros das boates.
como achei a ideia das dicas muito interessantes, seria um desperdício elas não receberem a atenção devida!
Gostei! Cada um fazendo a sua parte, esse deve ser o melhor caminho. Conte comigo!!! Ahhhh, estive em SP no fds e não te vi...até falei com o Gui (que pressão..) enquanto a Offer tocava..rs
Abração!
faz virar pdf e vializa a cartilha =D
(é sério! se estiver em formato pdf, outros blogs podem disponibilizar para download e a coisa pode rodar po e-mail entre não blogueiros...)
eu sou alienado
ahsuahsauhsauhsau
falando sério
realmente a gente entrou num ostracismo abusivo de desordem e desunião
a grande maioria acha que parada gay é micareta e faz dela como tal
não que não seja bacana isso de
micareta
beijar na boca é legal, essencial
mas é uma colocação carnavalesca tão grande que tudo acaba na segunda quarta feira de cinzas
em ressaca e calculadora que quantos bofes a bee catou
eu piso longe desse tipo de manifestação
prezo, acima de tudo, pela minha segurança
empurra empurra, bebedeira desenfreada, assaltos, enfim
o sentido perdeu algum bom tempo
aliás, como várias outras coisas
se pedimos por respeito desse jeito
de fato, seremos paródias de nós mesmos
mas que venha a cartilha
e meu papel nisso tudo
beijo grande pra vc
Não conheço de todo a realidade Brasileira e muito menos as várias realidades das diferentes culturas gay do Brasil(sim eu sei, estou sempre a repetir isto) que só me chegam os ecos aqui deste lado do atlántico via alguns blogs.
Concordo consigo com algumas das coisas que diz e que igualmente se aplicam aqui na Europa, mas procuro nunca esquecer que não há uma única identidade gay, nem um único tipo de gays. É verdade que no gay circuit, muitos gays são individualistas no pior verdadeiro sentido pós modernista, mas igualmente é verdade que existem outros tantos que sendo clubbers ou não, tenham o culto do corpo ou não, têm dado a cara e lutado para combater a homofobia, para que os seus direitos sejam reconhecidos. Deve-se às ONGs LGBT todas as conquistas dos direitos das pessoas LGBT, mesmo em casos em que ineditamente como em Portugal, a partir de certo momento, a reinvindicação passou a ser feita pela sociedade civil (talvez não esteja a par mas surgiu recentemente um movimento civil exigindo o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, em que os 700 promotores iniciais são figuras públicas, entre as quais o nobel José Saramago bem como figuras públicas dos mais diferentes quadrantes. Curiosamente algumas das quais, fugiam discutir o assunto há alguns anos atrás, ou então assumiram posições píblicas contrárias.Acreditamos que no momento em Portugal, a questão do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, é uma questão ganha. Num dos países com mais indices de homofobia da Europa, em que o tema ainda há 4-5 anos atrás quase era tabu, é muito bom e, tudo isto não teria sido´conseguido sem o papel de alguns activistas que concertadamente iniciaram várias acções. a saber:
A) exigiram que a constituição portuguesa, mencionasse no princípio da igualdade, a discriminação com base na orientação sexual, a par da discriminação com base no sexo, na raça e na religião
B) após a mudança da constituição duas lésbicas, exigiram poder casar, como isso lhes foi negado, e o processo subiu até ao tribunal constitucional, uma vez que agora a lei do casamento é insconstitucional (aguarda-se parecer do TC)
C) foi entregue na Assembleia da República uma petição de cidadãos, exigindo a mudança da lei do casamento Civil
D) A discussão passou para o domínio público e entrou no discurso politíco.
E) Existe no momento um movimento Civil que exige igualdade no acesso ao casamento civil entre pessoas do mesmo sexo.
Bom já vai longo o comentário, tudo isto para dizer que tem razão, mas todas as conquistas não se conseguirão, sem a pressão junto do poder politíco, das organizações da sociedade civil e claro, estas não conseguirão desenvolver o seu trabalho sem o apoio de parte da sociedade civil.
Aqui fica o site do recente movimento:
http://www.igualdade.net/
Uma curiosidade: Se a mudança de lei do casamento civil for aprovada, muitos casais gay, constituídos por tuga/brasuca terão sérias implicações na sua vida. Como sabe, não é de todo trivial um brasileiro requerer nacionalidade portuguesa.
Thiago,
ótima iniciativa!
fazemos parte de uma parcela da população que tem tudo para reverter esta situação de preconceito e discriminação.
Temos acesso a informação, somos questionadores e consumidores.
Quero participar deste "projeto" e vou te enviar algumas sugestões e experiências vividas aqui em Vancouver.
Não podemos subestimar o poder de influência dos blogs nas pessoas...
take care,
Alex Bez
Adorei a iniciativa!!!Brilhante! Alias, nao é surpresa vindo de vc né Thiagooo! Vou pensar em algumas sugestões...
e vc se cuida!!!
:)
Tem como não amar Tony?
Thiago, claro que a iniciativa é sensacional e como você mencionou, está aberta a todos que queiram contribuir.
Reconhecer essa pasmaceira que nos abate já é um grande passo.
;-)
"Birds in flight are calling there
where the heart moves the stones"
(trecho de música)
A mente não pára desde de que li seu post hoje pela manhã. Acho que pela primeira vez sinto o real espírito da Parada Gay.
A idéia de uma corrente do bem parece boa. Talvez seja um pouco ingênua, mas serve para tentar dar um sentido maior a esse nosso mundo maluco. Boa sorte pra vcs!
Longa vida à iniciativa!
Darei vazão à cartilha o quanto eu puder aqui em Salvador.
Ótima contribuição do poor guy fashion victim, com relação ao que vem acontecendo em Portugal. É ao ler coisas como essas que caímos na real que não somos atenção dos meios de comunicação, porque não dá manchete nem noticiário. Caímos na real de que só depende de nós mesmos saber de nossas conquistas, e, principalmente, promovê-las.
Fui a parada em 2007 e 2008, e fiquei chocado com meus conterrâneos, NINGUEM queria ir à manifestação de domingo - porque a bala do sábado tinha batido mt forte, pq nao tinha bofe bom na rua, porque iam dormir pra pegar o voo de volta. Enfim, nossa alienação não é nenhuma novidade...
Por isso, acredito e MUITO em iniciativas como essas.
Grande abraço e avante!
Vale ressaltar que a falta de atitude social e política acomete o brasileiro de modo geral, não é exclusividade de um grupo.
Mas acho muito positivo organizar idéias a respeito de uma problemática para que as pessoas possam ter uma referência de como começar a fazer diferente e também a diferença.
Acho muito boa esta iniciativa. As revistas como DOM e JÚNIOR não poderiam apoiar também? Haverá abertura para trans também?
Se eu pudesse, faria muito mais. Acho-me atrevido em demasia por publicar algumas coisas em meu blog, que também, infelizmente ou felizmente, é meu gueto. Sua inciativa é ótima, assim que sair a cartilha, vou fazer um posto no meu blog e linkar pra cá, tudo bem? ;D
Thiago parabéns pela iniciativa, pouco te conheço mas já te admiro por suas posturas aqui neste seu recanto. Concordo q precisamos nos mobilizar e estou pronto a contribuir tb. Felicidades e sucesso no projeto, pois todos nós só teremos a ganhar com isto...
bjão...
;-)
GURI,
eu nao sabia do seu blog ainda... sempre acompanho o blog do Bhy, mas o seu me passou despercebido...
simplesmente amei sua iniciativa...
com certeza pode contar comigo e meus meios - blog, orkut, msn e afins - pra ajudar no que puder.
concordo com a pasmaceira q existe hj no meio GLS. é phoda, é triste, mas é a realidade!
eu ja tento fazer alguma coisa, postando em meu blog algumas noticias, alguns textos meus, enfim, tento mostrar q se quisermos direitos iguais, devemos lutar por eles pq eles nao caem do ceu, nao nos sao dados de maos beijadas.
fantastico.
parabens pela iniciativa e conte comigo..
abraços
http://thevoyeurman.blogspot.com
Estou nessa,sempre.
Sou hetero, casada 3 filhos.
Honestamente,sinto que é aqui,no meio hetero que tem que ser feito o trabalho.Diário,em cada criança que chega em casa com uma piada estúpida sobre homosexualidade,um conceito distorcido que ouviu pela rua,recebendo a noção de que somos todos pessoas,não importando nenhum tipo de preferência.
Eu sei, pois luto com isso toda semana,explicando,orientando e educando meus filhos para a tolerância e o respeito,pois eles aprendem de nós e do mundo,e temos obrigação de ajustar o filtro,e ajudá-los a selecionar o que serve á vida humana e o que não.
Percebe como os homosexuais estão longe das crianças?Um pouco pela opção de não ter filhos,e por preconceito mesmo das pessoas.
O mais incrível é, que se orientarmos essas pessoas pequenas hoje na aceitação das diferenças, amanhã todos terão uma coexistência mais pacífica,todos serão beneficiados,inclusive eles mesmos.
Eu faço isso no meu pequeno mundinho, e vejo que realmente funciona.trabalho de formiga,que faz toda a diferença na liberdade dos meus indivíduos.
Bjo, depois explica como posso ajudar mais.
Ótima iniciativa!
Hoje recebi um email homofóbico e vou publicá-lo em breve, junto com a resposta, no meu bloguinho.
É isso aí, todos devem fazer a sua parte. Inclusive (ou principalmente) os héteros!
Fantástica a iniciativa. Parabéns!
Até que enfim alguém toma uma inicitaiva bacana em relações às nossas questões. É primeira vez visito seu blog e logo de cara percebo um espaço muito preocupado e engajado com os homossexuais. Faço suas minhas palavras também, são em pequenas atitudes que podem levar a grandes mudanças. Parabéns pela atitude.
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