sexta-feira, 30 de maio de 2008

Londres em alerta: as bibas estão se matando

A TimeOut é uma verdadeira bíblia para quem viaja a Londres. Trata-se de uma revista semanal que indica tudo o que importa na cidade, de museus a brechós descolados, de restaurantes de comida contemporânea a afterhours ensandecidos. Tudo de um jeito dinâmico, atual, feito por jovens e para jovens. A seção Gay & Lesbian é bastante completa e traz matérias de interesse da comunidade, com textos sobre política, comportamento e costumes.

Na edição de 27 de novembro de 2007, a revista publicou a reportagem O mundinho gay de Londres em crise, assinada pelo jornalista Paul Burston. O texto mostra como o abuso de drogas pesadas e a prática de sexo sem proteção estão dizimando a população gay local - e ninguém parece dar a mínima para isso.

O gueto gay do eixo São Paulo-Rio de Janeiro não tem o mesmo porte da gigantesca cena londrina, mais diversificada e engrossada pela presença maciça de turistas o ano todo (não só sazonalmente, como aqui). Tudo chega até nós com um certo atraso - incluindo novas modas, novos comportamentos e novas drogas. Não me parece que a coisa esteja tão grave por aqui, mas a reportagem não deixa de ser um aviso bastante pertinente. Afinal, o GHB vem, de mansinho, ganhando mais adeptos - e já fez muita gente cair e levar sustos nas The Weeks da vida. O sexo bareback também vem crescendo, na esteira da falsa idéia de que o vírus HIV é "perfeitamente administrável" com as novas medicações.

Longe de mim fazer pregações ou passar lições de moral: sempre sustentei que cada um deve fazer suas próprias escolhas e ser responsável por elas. Mas acho que essa reportagem traz uma reflexão saudável a todos nós. Pratiquem seu inglês e leiam aqui.

terça-feira, 27 de maio de 2008

Doze comentários sobre a Parada SP 2008

Ainda não estou 100% recuperado, mas não posso mais adiar este texto-balanço da Parada, porque hoje já é terça-feira e o assunto envelhece rápido. Então, aqui vão minhas impressões bem pessoais sobre o que eu vivi nesses 5 dias. É claro que não deu para viver tudo: mesmo tendo enfiado o pé na jaca como poucas vezes na vida, deixei várias festas de fora, não fui a nenhum after, perdi o Gay Day do Playcenter (que eu até tinha decidido conferir), não pus os pés na 269 (e olha que chegavam o tempo todo relatos de que o movimento nas saunas estava incrível), fiz menos passeios pela cidade do que gostaria e não tive forças para ir à Parada no domingo. Mesmo assim, a sensação que tenho é de missão (muito bem) cumprida: este foi o ano que melhor aproveitei até hoje.

Deixo aqui meus comentários e convido os leitores a conhecer outros olhares. A equipe da DOM foi a absolutamente todos os eventos e se lançou numa intensa produção de notícias para o novo portal da revista. O Mix Brasil fez sua costumeira cobertura das festas e dos eventos diurnos. O site ParouTudo, de Brasília, também postou um bom material sobre o agito diurno, as festas e a Parada em si. Já os blogueiros, que não trabalham em equipe e precisam conciliar blog e rotina, devem soltar seus posts gradativamente, nos próximos dias. Indico meus amigos Italo, Lindinalva, Glamaddict, Gui, Tony e, para quem arrasa no inglês, o bacanérrimo Made in Brazil. Eu mesmo ainda não tive tempo de ler mais nada em lugar algum e só vou fazer minha romaria virtual nos próximos dias.

LOTAÇÃO ESGOTADA. A maior cidade do país já começa a parecer pequena para tanta gente que vem se jogar. A Praça da República quase não deu conta do movimento da Feira Cultural, o trânsito nas ruas Oscar Freire e Frei Caneca esteve infernal, a Paulista foi mais uma vez tomada no domingo (novamente com muitos incidentes e 78% mais furtos) e clubes como Pacha, The Week e Blue Space operaram no limite. Até hotéis com preços mais salgados comemoraram a ocupação completa de seus quartos. Se a freqüência continuar se multiplicando nesse ritmo, daqui a pouco São Paulo terá que celebrar seu Orgulho Gay em Brasília, para ganhar mais espaço. [Mesmo assim, devo reconhecer que estou morrendo de saudade dessa muvuca. Ver a cidade voltar ao normal, sem a euforia dos turistas, me deixa tão melancólico...]

ANESTESIA GERAL. Já participo da Parada e das festas que a cercam há muitos anos. Já passei vários Carnavais no Rio e em Florianópolis. E já dei meus pulinhos pelo meio gay no Exterior. Portanto, não fico mais deslumbrado com qualquer coisa. Mesmo assim, fiquei espantado com a quantidade de homens bonitos que vi em São Paulo nesses cinco dias. Arrisco dizer que a cidade nunca viu algo parecido. Era tanto macho bonito e gostoso, em todas as direções, que num dado momento aconteceu comigo a coisa mais improvável: eu, que sempre fui ligadíssimo no físico dos homens, perdi a sensibilidade e fiquei anestesiado. É sério: depois do corpo perfeito número 300, todos os demais passaram batidos, tornei-me indiferente a eles, como se não tivessem mais nada a me dizer. [Com o refluxo de um certo número de beldades para suas cidades de origem, espero voltar ao normal dentro de alguns dias].

CADA MACACO NO SEU GALHO. A exemplo do que já se vê em capitais européias e norte-americanas, o crescimento e a maturidade da cena gay de São Paulo trouxeram a tiracolo um efeito colateral inevitável: a segmentação. Clubes, festas e até saunas se profissionalizam e especializam, e com isso em cada ambiente passa a existir pouca ou nenhuma mistura de tribos. Quem seguiu a programação de festas da The Week, por exemplo, teve a impressão de que todos os gays do mundo são bombados, tatuados e descamisados. No circuito moderninho, nas festas de meninas, na cena bear, o fenômeno se repete: é cada macaco no seu galho, e pronto. O público ganha ao encontrar exatamente quem quer encontrar, mas perde ao se privar da rica experiência de conviver com o diferente. Confirmando isso, muitos torceram o nariz e ignoraram olimpicamente os poucos eventos caracterizados pela pluralidade (Feira Cultural, Gay Day e a própria Parada).

O REINADO DOS CLUBES. Enquanto em outros anos festas como Magma, X-Demente, E-Joy e R.Evolution tentavam disputar uma fatia do público baladeiro, neste ano o fervo todo rolou nos clubes: The Week, Flexx, Blue Space e A Lôca prepararam programações especiais e estiveram intransitáveis. Megga e Bubu fizeram tudo o que puderam, mas não conseguiram contornar a interdição pela Prefeitura, causada por "entraves burocráticos" que permanecem mal-explicados. Entre as poucas festas que aconteceram fora dos clubes, destacaram-se as do Pacha e do Clube de Regatas Tietê (ambas com a assinatura da The Week) e os eventos específicos para ursos e meninas, em espaços menores e com divulgação praticamente restrita a essas comunidades.

SÓ PARA A DIRETORIA. As festinhas private são feitas por clãs menores, têm divulgação controlada e convidados selecionados. Mesmo assim, algumas são tão caprichadas que acabam repercutindo até entre os que não foram incluídos na rodinha. Entre as melhores da temporada 2008, estiveram a bafônica festa no apartamento do DJ Eric Cullemberg, o coquetel organizado pela festa Toy na galeria Romero Britto e o já tradicional chill in do blogueiro Tony Goes - tão bom que ninguém queria saber de arredar pé e ir para a balada depois, para desespero do anfitrião.

RACIONAMENTO DE ENERGIA. Com noites de peso acontecendo nos clubes e festinhas private bem animadas, em algum momento o povo precisava descansar. E quem saiu perdendo foram os afterhours, que estiveram bem mais vazios do que o previsto. A julgar pelo grande movimento que vinha tendo nas semanas anteriores à Parada, era de se esperar que o Ultradiesel vivesse manhãs históricas, que avançassem dia afora e só terminassem ao entardecer. A casa inclusive anunciou investimentos extras, como projeções em 3D e café-da-manhã com whey protein. Mas nada disso foi suficiente para fazer as pessoas abrirem mão do pouco tempo de sono de que dispunham.

HINO OFICIAL. Se a música mais tocada nas festas da Parada 2007 foi "Say It Right", da Nelly Furtado, neste ano só deu Mariah Carey e sua "Touch My Body", que veio em diversas versões (principalmente o ótimo remix do Seamus Haji) e empolgou geral. Ressuscitada por Peter Rauhofer e transformada no hino do último Carnaval, "Tocame" do Fragma [aquela do refrão "I need a miracle"] ainda causa um estrago danado nas pistas - na GiraSol, ela provocou uma gritaria digna do festival argentino Creamfields. Já Madonna praticamente passou em branco com a pouco inspirada "4 Minutes".

OS MEUS HINOS. Já na minha vitrola pessoal, as músicas que me fazem lembrar desses loucos dias que passaram são o ótimo remix do Soulcast para "Rehab", da Amy Winehouse (tema bastante apropriado para esse contexto de excessos), o remix de Frankie Knuckles para "Blind", do Hercules and Love Affair, e a ótima "Stomp That Shit (Promo Dub Mix)", de Tristan Garner, que tem presença cativa nos sets do DJ João Neto e fez o Pacha inteiro gritar. Ah, e "Touch My Body", é claro.

NOSSAS MAJESTADES, OS DJs. Na festa de quinta-feira, no Pacha, DJ Paulo fez um set bem gostoso (embora curto demais) e até cheguei a pensar que seria o melhor desta Parada. Mas no sábado Peter Rauhofer presenteou a todos nós com uma viagem musical de puro sonho, com vários momentos mais progressivos (ou seja, do jeitinho que eu gosto!), e roubou para si o título, fechando a temporada com chave de ouro. Entre os DJ nacionais, João Neto é o meu predileto no momento, mas preciso ser justo: Renato Cecin também mandou bem, com menos drag hits e mais bombação, e Ana Paula simplesmente arrasou na pista da GiraSol. Ah sim, e o abraço mais gostoso continua sendo o do Pacheco.

DEZENOVE HORAS DE MAGIA. Tive uma noite deliciosa no Pacha na quinta (apesar das várias falhas na estrutura da casa) e gostei do clima leve da The Week na sexta. Mas foi no sábado que vivi os momentos mais especiais da temporada. A GiraSol já foi a melhor festa da Parada 2007, mas ainda assim conseguiu me surpreender. A TW mudou completamente a configuração do espaço do Clube de Regatas e colocou o povo dançando dentro e em volta da piscina, como num anfiteatro. Gente 100% linda (festa vencedora também nesse quesito), DJs arrasando (adorei o espanhol Iordee remixando "Physical" da Olivia Newton-John; depois Cecin e Ana Paula arrebentaram) e uma vibe indescritível, com todo mundo dançando e gritando feliz, como num grande festival. Saí de lá à 1h50 da manhã, direto para a The Week, onde tudo continuou perfeito. A área externa serviu como prolongamento da pista principal, onde pude aproveitar a noite gostosa, rodeado de gente especial por todos os lados. Para onde eu olhasse, havia rodas de amigos queridos que me puxavam, me abraçavam, me davam carinho: nunca me senti tão bem acolhido. O set farofa de Offer Nissim passou voando, e depois Peter Rauhofer serviu seu néctar progressivo até 11h20 da manhã. Só posso dar os parabéns à TW, que consegue a proeza de se superar o tempo todo. Essas 19 horas de magia ficarão na minha memória para sempre.

E A PARADA? Não posso falar bem nem mal da Parada, porque eu não estava lá. Depois da overdose de emoções e desgaste físico descrita na nota anterior, eu estava destruído. Até fui para a Paulista, onde cheguei às 12h55. Uma hora depois do previsto para o início, alguns carros nem haviam chegado, e eu não tinha condições de ficar ali parado, fritando no sol e esperando a coisa acontecer. Fui embora, mas teria ficado se tivesse forças. E isso porque, de todos os argumentos pró e contra que expus, aquele em que mais acredito é o último: a Parada que queremos, quem faz somos nós - porque ela é nossa. A maioria dos meus amigos não foi; entre os que prestigiaram, não houve consenso de opiniões. Mas achei muito lúcida a visão de André Fischer, que no post de 25/5 resumiu bem a crise de identidade em que o evento se encontra. Entre militância e festa, ela não cumpre direito nenhum dos dois papéis. Eu acho que a Parada deveria abraçar a primeira opção e ser uma manifestação de força e dignidade dos gays perante a sociedade. Algo de que todos pudessem participar, inclusive os gays que não se encaixam em caricaturas. Festa por festa, os clubes fazem melhor e com mais conforto.

FINAL INFELIZ. Eu ia dizer que as pessoas finalmente pareceram ter aprendido a segurar a onda e controlar os excessos. Afinal, dessa vez não vi nenhuma daquelas cenas deploráveis, comuns em outros carnavais, de pessoas estrebuchadas no chão, convulsionando e estragando a festa dos amigos. Mas ontem tive a notícia de que Lucas, um lindo rapaz de apenas 24 anos, foi protagonista de uma tragédia. Depois de misturar álcool e drogas, ele acabou morrendo afogado na piscina de um hotel nos Jardins. Aos amigos de Lucas e, especialmente, à mãe do garoto, meus mais profundos sentimentos. E àqueles que pensam que isso foi apenas "obra do destino", um recado: abram o olho e sejam responsáveis! Isso também poderia ter acontecido com vocês.

[FOTOS: ParouTudo.com (Paulista e go-go boy) e Introspective]

domingo, 25 de maio de 2008

O que será que aconteceu com eles?

Alysson venceu um concurso de dublagem com a música "Tati Mai Bare". Dr. Otávio nem imagina que o vice-presidente ligou na sua casa no sábado para convocar uma reunião em Maringá (sua esposa o aguarda furiosa com o pau de macarrão na mão). A Diesel da Oscar Freire teve que pedir reforços ao estoque da filial do Shopping Leblon. O coração de Odair foi fisgado por um lindo urso gaúcho. Muscle27SP levou picaduras nos glúteos por cinco noites seguidas. As camareiras do Formule 1 se revoltaram com o volume de roupa de cama suja e ameaçam chamar o sindicato. A Marajó bege de Clemente e Joventino teve o motor fundido a 50km de Cuiabá. Marta Suplicy teve uma conversa franca com Gilberto Kassab: "Fui sexóloga por anos, você precisa se soltar mais..." Gui foi humilhado pela maxibolsa absurda de Aline - e prometeu vingança para 2009. Os donos da Megga foram vistos tomando um porre homérico, ouvindo boleros num solitário bar de hotel. O jovem M. virou brinquedo nas mãos de um casal de balzaquianos insaciáveis. Claudinho ficou de fora do outro post, mas não deveria se sentir menos querido por isso. O tenente Freitas se engraçou por um cafuçu na dispersão e ainda não sabe que ele é um dos líderes foragidos do PCC. Renato Cecin está perdoado por seus pecados depois de ter mandado bem no Pacha e na GiraSol. Tavinho Albuquerque e Ricardo Bragança de Mello compraram cinco quadros de Romero Britto, só para fazer bonito na frente das amigas. O Playcenter recebeu uma montanha de currículos de beeshas querendo trabalhar lá. Laurinha só vai reabrir o salão na quarta, porque dois de seus cabelereiros estão em paradeiro desconhecido. Estefânio não conseguiu achar nada do tal DJ do sobrenome ininteligível na internet, mas continua pesquisando. Eu não vi o Mauro Borges por aí, ele ainda existe? Kadu finalmente encontrou o Universo Perfeito (mas ainda não descobriu como sair dele). O Kit Parada DOM já está virando item de colecionador. Horácio não entendeu por quê sempre havia um espaço vazio ao seu redor na pista de dança. Os seguranças do Shopping Frei Caneca apenas exclamavam: "Vixe Maria, sacudiram o pé de viado e caiu tudo aqui dentro!". Marcos não economizou nas queixas, críticas e reclamações em seus posts sobre a Parada. Pablo foi preso com 5 cédulas falsas de R$10 que recebeu como pagamento por um dos seus ingressos. Ítalo vai fazer um apelo público para os DJs pararem de tocar "I Need A Miracle". Ana Paula comemorou porque não choveu e sua escova durou até o final da Parada. Mans foi buscar mais churrasco e aproveitou para trocar o CD da Ana Carolina pelo da Adriana Calcanhoto. Rogério ficou todo ardido e não conseguia abraçar ninguém nas festas. Depois de comandar a multidão numa animada coreô ao som de "Tocame", André Almada está pensando em começar carreira política. Enfermeira Elza levou uma surra de vários clubbers que lhe prepararam uma cilada. Xande tirou a jogação de letra e sabe que daqui a 67 dias tem mais (na Espanha, gata!). O fiofó do pastor Josué passou de mão em mão na festa dos mascarados do RG Bar. Depois de chegar a dançar por 19 horas seguidas e ficar sem comer por quase 24, preciso descansar (mas prometo que amanhã postarei aqui um resumo do que foram esses cinco dias de muita informação).

quarta-feira, 21 de maio de 2008

Eu vou-me embora, é chegada a hora...

É chegada a hora. Depois de semanas de espera e especulações, a comunidade gay dá hoje a largada para os cinco dias de festa e fantasia que transformam o feriado de Corpus Christi numa espécie de minicarnaval gay. Os paulistas se prepararam, os turistas acreditaram, aeroporto e rodoviária despejam bichas pelo ladrão: enfim, é o momento de viver a Parada. E cada um tem sua programação pessoal, seu jeito próprio de usufruir de tudo isso.

Se eu ainda estivesse com minha cabeça de 2005, começaria já me jogando hoje na The Week, para ver o Isaac Escalante. Depois daria uma descansada em casa e uma olhada no after da Ultradiesel (ou vice-versa). Emendaria com a Feira Cultural GLBT, onde ficaria de olho nos cafuçus do Centrão. À noite, iria à festa do Pacha, pé na jaca e happy people, e ficaria até a festa acabar e as faxineiras começarem a jogar sapólio no chão. Dormiria só um pouquinho e iria bater perna na Paulista, na Oscar Freire e no Frei Caneca, tudo na mesma tarde, para ver as caras de fora dando pinta pela cidade. Terminaria na 269. Iria a algum chill in e depois para a Ultradiesel, ver o tal projeto israelense que o Ítalo hypou. Dormiria em casa (isso se não emendasse o after ali mesmo) e daria uma conferida no fervo da praça Benedito Calixto. De lá, direto para a day party Gira-Sol, até a festa esfriar. Jogaria uma água no rosto e voaria para a festa-das-festas na The Week, Peter e Offer juntos tocando para milhares de fãs. Ficaria até tipo 9 da manhã, voltaria para casa, dormiria três horinhas e iria correndo para a Parada na Paulista. Ficaria zanzando atrás de amigos e pegações, tentaria tirar fotos sem ser roubado, desceria até metade da Consolação, dali pegaria o metrô até a Armênia; Nova Pool Party, saideira, ferver até umas 23h30, voltar para casa e ficar uns cinco dias de cama, arrasado, destruído e com a sensação de que não aproveitei legal, mesmo tendo feito absolutamente tudo. Ufa.

Em vez disso, o Introspective 2008 resolveu programar menos e deixar rolar. Em princípio, as festas em que mais estou apostando são a do Pacha na quinta e a Gira-Sol no sábado. O resto, decidirei na hora, escutando o meu coração e quem estiver comigo. Não vou tentar preencher metas, quero apenas me divertir e curtir com qualidade. Vai ser especial poder dividir as coisas gostosas de São Paulo com amigos queridos daqui e de fora, que estão chegando ávidos, sedentos, cheios de boas energias. Será ótimo recebê-los e estar com eles, adoro me sentir um turista na minha própria cidade.

Com este texto, despeço-me de meus leitores e coloco o blog em recesso até segunda-feira, quando tudo terá acabado. Aos que estão vindo: São Paulo está tendo dias incríveis de sol e céu azul, aproveitem esse tempo maravilhoso para viver e explorar a cidade. O Ibirapuera é de lei, mas que tal passear pelos belíssimos jardins em estilo francês do Parque da Independência, no Ipiranga, um dos cenários mais bonitos e fotogênicos de São Paulo? Também sugiro um entardecer na Praça do Pôr-do-Sol, no Alto de Pinheiros, que faz jus ao nome. Se forem à Feira Cultural, não percam a mostra do Mix Brasil, que exibirá os sensacionais 69 - Praça da Luz e Flores de 70 (de que já falei aqui).

Tragam um agasalho para a noite, mas só por desencargo de consciência, porque não deve esfriar, muito menos chover. Por mais rigorosa que tenha sido a dieta, permitam-se algumas extravagâncias gastronômicas, vocês estão na cidade certa para isso. Tem uma porção de peças de interesse gay em cartaz. E as festas, é claro. Mas acho que já falei sobre elas o suficiente. Se quiserem saber mais, comprem a revista DOM e leiam o Kit Parada DOM, que preparei com muito carinho
(mas, se quiserem dicas para ursos e meninas, o Mix Brasil tem um roteiro mais completo). No mais, cuidado com os excessos, comam e descansem, usem camisinha. E divirtam-se! E se me encontrarem por aí, não se acanhem em vir falar comigo (eu sou meio desligado e nunca reconheço ninguém!)

Boa Parada para todos vocês!

Reportagem sobre as festas da Parada

Hoje o Rraurl.com, um dos principais sites especializados em música eletrônica do país, publicou reportagem que eu e Marcos Carioca fizemos sobre a programação dos clubes de São Paulo em torno da Parada. Começamos fazendo um apanhado da cena gay (até porque o site é voltado a um universo mais underground e boa parte de seus leitores não freqüenta as boates), conversamos por e-mail com André Almada (The Week) e Rodrigo Zanardi (Flexx) e passamos o serviço completo e atualizado de todas as festas (já considerando que a Megga não vai mesmo abrir). A reportagem você vê aqui.

segunda-feira, 19 de maio de 2008

Todos numa só direção, uma só voz, uma canção

Alysson já reservou a colchonete amiga na quitinete da Rua Augusta. A CET organizou um esquema especial para desviar o trânsito da Paulista. Diogo mandou vender mais vinte cabeças de gado em Jaboatão. Dr. Otávio disse à esposa que o vice-presidente marcou reuniões em São Paulo na quarta, na sexta e na segunda. A Diesel da Oscar Freire encomendou mais 1200 calças jeans à matriz em Milão. Odair pendurou a jaqueta de couro para tomar ar. Muscle27SP dobrou a dose de injeções no glúteo direito. A rede de hotéis Formule 1 instalou vending machines de camisinhas nos corredores. Clemente e Joventino já estão há três dias na estrada e acabam de cruzar a fronteira de Goiás. Marta Suplicy agendou uma aplicação extra de botox. Gui disputa com as amigas fag hags quem levará a bolsa de mão mais pintosa. Os donos da Megga mandaram acender velas para Santo Expedito. Tony desembolsou R$ 5 mil para mandar os vizinhos passarem o feriado em Visconde de Mauá. A Commando abriu espaço no salão para mais três bancos de supino. O tenente Freitas reza para não ser reconhecido por alguém na multidão. Renato Cecin já separou o vinil de “Greatest Love of All”. Tavinho Albuquerque e Ricardo Bragança de Mello prepararam os ânimos das bunitas com um chill in especial na Vieira Souto. O Playcenter chamou um mecânico para revisar as montanhas-russas. Laurinha deu férias coletivas em seu salão de beleza em Cajamar. Estefânio recrutou um dream team de cafuçus em Sulacap e Belford Roxo. Mauro Borges está com a dancinha de Madonna em “4 Minutes” toda ensaiada. Kadu estocou aditivos suficientes para fazer o Maracanã sair do chão. Duas gráficas concorrentes correm para imprimir as novas edições da DOM e da Junior. Horácio mantém as janelas abertas para dissipar o cheiro dos peidos de whey protein. Os seguranças do Shopping Frei Caneca foram orientados a fazer vista grossa para a pegação. Marcos plantou uma notinha na coluna da Monica Bergamo avisando de seu novo estado civil. Pablo imprimiu 500 ingressos falsos da The Week para tentar descolar uma grana. Ítalo pediu proteção a Clementina e não desgruda de seu escapulário. Ana Paula deu uma reforçada básica na escova progressiva. Mans colocou o CD da Ana Carolina no repeat. Rogério reservou uma cama de bronzeamento só para ele. André Almada vem tentando dormir pelo menos 8 horas por noite. Enfermeira Elza está planejando novas estratégias de ataque. Xande foi pedir o microondas da vizinha. O pastor evangélico Josué mandou uma manifestação de repúdio para os principais jornais do país. Eu não agüento mais comer atum!

E você? Já se preparou para a Parada SP 2008?

domingo, 18 de maio de 2008

Cris, Geni e o Zepelim

Quando abriu seu primeiro blog, Uomini, Cris escolheu um caminho diferente da maioria de seus colegas. Longe de querer ser espirituoso, descolado ou formador de opiniões, o rapaz expunha, sem rodeios, suas andanças pelos points de libertinagem da cidade. Suas experiências eram relatadas de forma bem livre e desinibida, às vezes acompanhadas de pequenos registros fotográficos. Cris arrebanhou uma legião de leitores fiéis, depois cansou, parou de escrever e, recentemente, reativou seu endereço. Nesses tempos de contagem regressiva para a Parada, onde blogueiros e iniciados dão suas dicas de São Paulo para o mundo, Cris também quis dar sua contribuição: abriu um segundo blog, dedicado exclusivamente aos endereços de pegação na cidade.

Esse novo blog é um verdadeiro mergulho no submundo do sexo em São Paulo. O roteiro vai muito além dos endereços freqüentados pelas ditas "finas e bonitas dos Jardins", como a sauna 269 e o bar Station: vasculha os antros mais humildes do Centro da cidade, onde jovens michês se oferecem nas imediações da Praça da República e homens rústicos e travestis perambulam pelos corredores ermos dos cinemas pornôs. Como não poderia deixar de ser, Cris faz comentários sobre cada lugar com a franqueza habitual, pouco se preocupando com o que vão pensar dele.

Se no primeiro blog, que misturava sexo a outros assuntos mais amenos (arte, arquitetura, vida urbana), Cris já dividia opiniões, nesse novo endereço as reações do público têm sido ainda maiores. Em apenas três dias, Cris recebeu mais de 2000 visitas - sem ter feito qualquer outra forma de divulgação, além de um singelo post no primeiro blog (que continua ativo). Quando o picante roteiro virou notícia no site gay A Capa, a audiência deu um salto - e, com ela, os comentários dos leitores.

A maioria deles aplaudiu Cris. “Genial a idéia”, “valeu a iniciativa, dicas iradas”, “parabéns, o guia é muito interessante, autêntico e pessoal”, “você é uma das pessoas mais originais das quais eu já li um blog”, “discurso popular, sem mentiras e sem iludir o turista”, “com certeza levarei uma cópia desses points”, “é a lista que todo mundo queria ter, mas tinha vergonha de dizer”, “que ótimo, estou cansado dos guias oficiais, em geral muito mentirosos, já quebrei a cara várias vezes”, “ você descobriu o mapa da mina, esta é uma das melhores idéias do mundo gay”, “o seu serviço é de utilidade pública!”, e por aí vai.

Por outro lado, algumas reações contrárias surpreendem pela sua virulência. “Agora você mostrou direitinho o papel do gay na sociedade. Eu sou gay e tenho vergonha por gente dessa laia igual à sua, um bando de pervertido que só sabem e pensam com o pau e a bunda. Depois vocês ficam todos revoltados porque não conseguem lei pra defender os gays, e nunca irão conseguir! Um pouco de caráter não faz mal a ninguém, e muito menos de valorização”, esbravejou um leitor. “Você é do mal! Eu teria vergonha de dizer que esses lugares existem”, disse outro. “Que nojo! Vocês são todos mesmo nojentos, só buscam sexo. Cada dia que passo, tenho mais repulsa a isso. É lamentável!", exclamou mais um. “Essa bicha ainda será 'secretina' do turismo das bibas pobres de Sampa”, ironizou outro, enquanto o sangue azul corria em suas veias. E uma pérola com sabor fascista: “Só tem lugar freqüentado por bichinha podre aqui. Mas é melhor que elas fiquem todas nos seus lugares! Então essa iniciativa foi perfeita: cada um fica na sua”.

Esse festival de recalque e preconceitos me lembrou a música "Geni e o Zepelim", de Chico Buarque, que fez parte da peça Ópera do Malandro. A letra conta a história de Geni, uma prostituta que "dá para qualquer um" e, por isso, é desprezada pelos supostos cidadãos de bem. Um belo dia, um militar poderoso surge num zepelim e ameaça bombardear a cidade, mas cai de amores por Geni e promete poupar o lugar se ela dormir com ele. Geni reluta, mas a população implora e ela atende. O poderoso se esbalda nas suas carnes a noite inteira e parte ao amanhecer, salvando a cidade da destruição; quando Geni, crente que agora tinha o respeito de todos, se prepara para dormir, começa a gritaria: "Joga pedra na Geni!".

Não bastasse serem discriminados pelo resto da sociedade, os gays ainda segregam-se uns aos outros, desenhando um cenário de preconceitos e julgamentos em que existem bichas superiores e inferiores. No nosso mundinho, quem tem coragem de destoar de padrões impostos e assumir seus desejos sem hipocrisia se candidata a ser apedrejado, como a próxima Geni da história.

sábado, 17 de maio de 2008

Pequena seleção de pratos de massa em SP

Quem cultua a forma física e quer um corpo sarado costuma comer muitas proteínas e preferir carboidratos complexos não refinados, como os do arroz integral. Mas, para abastecer o corpo entre uma jogação e outra, nada como um bom prato de macarrão, que desce gostoso e fornece energia. Numa cidade que recebeu tantos imigrantes italianos, eu não tenho a pretensão de fazer um ranking com as melhores massas - São Paulo tem uma infinidade de opções, desde as cantinas do Bixiga e o turístico Famiglia Mancini até endereços venerados como Massimo, Gero, Vecchio Torino, Parigi e Quattrino. Por isso, o que vou listar aqui é apenas uma seleção pessoal de alguns pratos de pasta que eu gosto.

1) RAVIOLI DE CAMARÃO E CHUTNEY DE MANGA AO LEVE CREME DE CURRY [foto] / RAVIOLONI DE CORDEIRO AO MOLHO DO ASSADO E BRUNOISE DE LEGUMES @ Due Cuochi Minha paixão gastronômica do momento, o Due Cuochi faz hoje as massas de que mais gosto na cidade - preparadas na própria casa e servidas com molhos impecáveis. Em breve, vou escrever uma crítica só sobre ele. Esses dois raviolis são muito especiais, mas as porções não são nada generosas: apenas oito unidades no prato. Para quem quiser algo mais substancial, sugiro o bavette alla matriciana com queijo pecorino, também delicioso.

2) LINGUINI COM CAMARÃO E ABOBRINHA @ Ritz Esse sempre foi meu prato predileto no Ritz (junto com o chicken shiitake, que eu peço raramente, porque só é servido às segundas-feiras). O linguini vem com um creme levinho, um toque de pimenta caiena, cenoura, cebola, abobrinha e carnudos camarões. Ultimamente, porém, tenho me surpreendido ainda mais com o linguini com cogumelos (que está em vias de se tornar meu novo favorito). As massas do Ritz ficam ainda mais gostosas com o queijo de ótima qualidade (acho que é grana padano) trazido à mesa para que você mesmo rale sobre seu prato.

3) PENNE COM MELÃO E PRESUNTO CRU @ Spot O Spot tem um menu bastante enxuto, apoiado em receitas simples, que exploram o sabor de poucos ingredientes. Esse prato virou um dos clássicos da casa. Os ingredientes são fáceis de encontrar, mas não adianta tentar fazer em casa: tem algum segredinho ali que deixa o penne deles inigualável! Você pode pedir em dois tamanhos (o pequeno é conveniente para quem ainda tem uma longa noite pela frente).

4) PAPPARDELLE ORIENTAL @ Duplex Bistrot Todo mundo ama o penne oriental do Spot, mas eu acho a versão do Duplex bem melhor. Aqui, eles usam pappardelle (aquela massa comprida bem larga, que é minha predileta) e o molho oriental é escuro e bem saboroso, com shiitake e amendoim.

5) PENNE-CAMARÃO-SHIMEJI-ASPARGOS-SHOYU-SAQUÊ-GENGIBRE @ À Côté O À Côté é o restaurante mais recente (e vistoso) de Danielle Dahoui, dona do ótimo Ruella e antiga responsável pela cozinha do Bar d'Hôtel carioca. Essa é talvez a massa mais "diferentona" da minha lista: a redução de shoyu, saquê e gengibre dá um tempero bem intenso aos demais ingredientes. Também vem em dois tamanhos, mas, ao contrário do Spot e do Ritz, o pequeno é ridículo, no limite do desonesto.

6) CAPPELLETTI DE CARNE AO MOLHO ROSÊ GRATINADO @ Pasta & Vino O Pasta & Vino é uma mão na roda: um dos poucos restaurantes de qualidade que funcionam 24 horas por dia na cidade (inclusive citei no meu roteiro 24hs para a revista DOM). Peço sempre esse prato, que vem à mesa no melhor estilo cantina: fumegante, com o saboroso molho rosê borbulhando e bastante queijo gratinado por cima. Duro é conseguir esperar esfriar para começar a comer.

7) PENNE NORMANDIE @ Ruella Essa ótima receita do Ruella leva camarão, shiitake, creme de leite, tomate concassé e manjericão. Não tenho certeza se ele ainda continua no cardápio, que estava prestes a ser reformulado. Se não estiver, é bem provável que eles preparem se você pedir (afinal, o serviço da casa não poderia ser mais fofo e atencioso).

8) GNOCCHI LEGNANO @ Piola Como a pizza do Piola segue o anêmico padrão italiano (ou seja, pouquíssimo molho e economia de ingredientes na cobertura), muitas vezes acabo preferindo comer macarrão. O gnocchi deles é bem delicado e essa é uma versão mais suave do molho quatro queijos: enquanto a mussarela, o parmesão e o provolone se sobressaem, quase não há gosto de gorgonzola (ainda bem). A porção também é miserável.

9) RAVIOLI DE CORDEIRO AO MOLHO DE FUNGHI @ La Pasta Gialla Antes de o Due Cuochi aparecer, era no La Pasta Gialla que eu ia quando queria comer uma massa mais incrementada. É difícil escolher entre tantas opções: além desse ravioli, tem também agnolotti de funghi ao emmenthal, spaghetti ao pesto com camarão e, para quem gosta, um tagliatelle de azeitonas pretas (urgh!) com bacalhau, brócolis e tomate seco. Se estiver acompanhado, vale a pena dividir uma das bruschettas do menu (sugiro a pizzaiola).

10) CAMBURI @ Mestiço Não tem massa mais simpática do que o farfalle, conhecido popularmente como "gravatinha". No Mestiço, o Camburi é preparado com um molho rosado, cremoso e ao mesmo tempo muito leve, de salmão, brócolis e manjericão. Eu não como brócolis, mas não tem problema: os pedaços da verdura são apenas colocados por cima, sem empestear a comida, então dá para separar numa boa.

11) RAVIOLI RÁSCAL @ Ráscal O Ráscal é um lugar excelente para ir em grupo. Por um preço fixo por pessoa, você tem acesso a uma caprichada mesa de antipastos [ou seria "antepastos"? e agora?], com iguarias como cogumelos recheados, ceviche de salmão, atum semicru com molho teriaki e saladas variadas, e a uma estação de massas, finalizadas pelo cozinheiro na sua frente. As opções mudam todos os dias, mas uma é fixa: o ravioli ráscal, massa verde recheada de mussarela de búfala, com molho de tomates frescos e manjericão. Para dar seu toque pessoal, você pode salpicar parmesão, mussarela de búfala ou queijo de cabra ralados.

Endereços: Due Cuochi. Rua Manuel Guedes, 93, Itaim. Ritz. Al. Franca, 1.088, Jardins. Spot. Al. Ministro Rocha Azevedo, 72, Consolação. Duplex Bistrot. Rua Melo Alves, 445, Jardins. À Côté. Rua Bela Cintra, 1.709, Jardins. Pasta & Vino. Rua Barão de Capanema, 206, Jardins. Ruella. Rua João Cachoeira, 1.507, Itaim. Piola. Al. Lorena, 1.765, Jardins (também em Moema e Higienópolis). La Pasta Gialla. Rua Pedroso Alvarenga, 528, Itaim (também em Moema e nos Jardins). Mestiço. Rua Fernando de Albuquerque, 277, Consolação. Ráscal. Al. Santos, 870, Paraíso (também em vários shoppings).

sexta-feira, 16 de maio de 2008

Aconteceu, virou manchete

Acabo de saber que meu rosto está estampado nos jornais. Não, não me meti em nenhuma confusão. É que a Tribuna do Brasil, de Brasília, publicou hoje, na coluna Diversidade (que sai dentro do caderno Programa às sextas-feiras), uma entrevista feita comigo e com Marcos Carioca.

O jornal divulgou o guia da Parada de SP que preparamos para a revista DOM e aproveitou para nos fazer algumas perguntas por e-mail. É engraçado como algumas das nossas respostas bateram, mesmo sem termos tido contato um com o outro. Quem não conseguir ler clicando na imagem da página do jornal pode acessar o texto aqui.

quinta-feira, 15 de maio de 2008

Parada: ir ou não ir à Paulista?

A Parada Gay de São Paulo está vivendo um momento bastante peculiar. Depois de levar mais de 3 milhões de pessoas à Paulista em 2007, num evento caótico onde sobraram queixas de roubos, furtos e agressões, ela perdeu prestígio justamente entre a parcela do público que deveria ser sua principal protagonista. Um sintoma disso é a ausência das boates gays, como observou o jornal O Estado de S. Paulo (esse fato também deve ter outras explicações, como os altos custos de participação impostos aos clubes pelos organizadores do evento, mas não vou entrar nesse mérito aqui). A lista dos trios é quase totalmente formada por carros de ONGs e sites de relacionamentos.

Se antigamente terminar o feriado marchando sobre a Paulista era praticamente obrigatório, hoje esse programa está longe de ser uma unanimidade. Enquanto uns dizem, categóricos, que "essa Parada não me pega nunca mais", lembrando o desconforto das últimas edições, outros lembram que esse ato é, acima de tudo, uma manifestação de cidadania, que deve ter seu verdadeiro propósito resgatado. Como não cabe a mim ditar aos leitores o que eles devem fazer, preferi bancar o "advogado do diabo" e dar razões concretas para que cada um tome a sua própria decisão. Vamos a elas:

4 RAZÕES PARA VOCÊ 'FAZER A EGÍPCIA' E PASSAR BEM LONGE DA PAULISTA:

1) A Avenida Paulista está toda em obras, para a substituição das deterioradas calçadas de pedras portuguesas por blocos de concreto. Há inclusive trechos com interdições parciais dos dois lados da via. Se normalmente o excesso de gente já gerava transtornos e empurra-empurra, com o espaço reduzido pelos canteiros de obras a circulação deve beirar o insuportável.

2) Como já foi dito, nenhuma boate gay terá carros na Parada. E a The Week, não satisfeita em deixar de participar, ainda resolveu fazer uma grande festa justo no domingo à tarde. Resultado: se nos outros anos a quantidade de gente feia já era considerável, sem as "bunitas" desfilando provavelmente só vai ter dragão na rua.

3) Na última edição da Parada, os roubos e furtos não foram brincadeira. A situação estava completamente fora de controle: como os policiais foram colocados apenas nas laterais (como se estivessem lá para proteger os prédios e não os participantes do ato), não tinham como ver o que estava acontecendo na muvuca, justamente onde os crimes mais aconteciam.

4) A Parada deixou de ser uma manifestação pela causa gay e virou uma festa de rua esvaziada de sentido, palco de arruaceiros interessados apenas em confusão e baixaria. Em meio à apelação barata e às aberrações, fica até difícil falar em direitos civis ou orgulho gay - é esse o recado que temos a passar para o resto da sociedade?

4 RAZÕES PARA VOCÊ DEIXAR DE SER BESTA E IR À PARADA, SIM:

1) Temos que lembrar que a manutenção da Parada na Paulista foi uma conquista suada da Associação. Diversos setores da sociedade pressionaram para que ela fosse transferida para lugares "mortos" como a Avenida 23 de Maio - o que, além de dificultar o acesso dos participantes, seria como varrer a Parada para baixo do tapete, tirando toda a sua visibilidade. É preciso valorizar esse esforço.

2) A Nova Pool Party da The Week só começa às 15h e não deve começar a decolar antes das 17h ou 18h. É perfeitamente possível conciliar as duas coisas, já que a Parada começa às 12h em frente ao MASP. Dá para pegar pelo menos metade do ato (que termina às 19h30), antes de dar um olé na multidão, entrar no metrô e chegar rapidinho ao Clube de Regatas Tietê.

3) A organização da Parada promete uma estrutura muito melhor, para dar conta dos problemas de segurança. Foi feito um acordo com a Polícia Militar, que colocará seus homens misturados na multidão, e não apenas nas bordas. O efetivo policial será de 1000 policiais militares e 200 homens da Guarda Civil Metropolitana. Desses 1200 machos fardados, é razoável esperar que pelo menos uns 150 sejam apetitosos.

4) Se a Parada foi desvirtuada, não é abandonando o evento que isso vai mudar. É incoerente que um grupo que levanta a bandeira da inclusão social não seja tolerante com a participação de outras camadas da população - afinal, a parada ocupa um importante espaço público, trazendo inclusive transtornos à vida da cidade como um todo. Além disso, a Parada só passará a ter outro sentido se nós reassumirmos o que é nosso e fizermos a Parada que gostaríamos de ter.

quarta-feira, 14 de maio de 2008

Leve minhas dicas da Parada no seu bolso

Eu não quis entregar o ouro no post anterior porque ainda não estava autorizado a divulgar, mas agora já posso: neste ano, as minhas dicas para a Parada Gay de São Paulo vão circular num âmbito muito maior do que os limites deste humilde blog. A convite da revista DOM, eu e Marcos Carioca escrevemos um guia completo com todas as orientações que paulistas e turistas possam precisar para aproveitar ao máximo esses 5 dias de folia.

Está tudo lá: as melhores festas, comentadas e separadas por dia, restaurantes e cafés para todos os gostos, academias que trabalham com diárias avulsas, compras e passeios, saunas e bares de pegação, dicas de transporte e um pequeno manual de sobrevivência para as festas e a Parada em si. Tudo isso de um jeito enxuto, conciso, direto ao ponto e que cabe no bolso, para você ter sempre à mão.

O Kit Parada DOM sairá encartado na próxima edição da revista (que agora virou mensal), mas apenas na tiragem paulistana. Ou seja: só terá o guia quem comprar a DOM numa banca em São Paulo. Ou então quem recebê-lo em alguns pontos estratégicos da cidade, onde ele também será distribuído. A revista chega às bancas na semana que vem e deve disponibilizar parte do conteúdo do guia em seu site.

Mas meus amigos de fora que não vierem a São Paulo não ficarão na mão. Nessa mesma edição da DOM, também assino a coluna 24hs, em que passo um roteiro com as coisas que mais gosto de fazer na minha cidade. É a minha visão bem pessoal de São Paulo, com indicações que muitos de meus leitores mais assíduos já conhecem, e que não valem apenas para o feriado da Parada.

segunda-feira, 12 de maio de 2008

Contagem regressiva

A apenas nove dias da primeira jogação, festeiros de todo o Brasil já estão em polvorosa para a Parada Gay em São Paulo. E o evento menos esperado é a Parada propriamente dita.

Depois que se tornou apenas mais um evento de rua, a Parada foi tomada por multidões populares que não têm qualquer simpatia à causa gay e só querem saber de comprar bebida barata dos camelôs, pegar muié e arranjar confusão (isso sem falar nos ladrões). Com isso, muitos gays debandaram: para eles, o que importa agora são as festas - e nada mais.

A própria The Week se retirou do evento, chegando ao ponto de promover uma festa na tarde do domingo. O que é totalmente compreensível: além de dar um trabalho danado, participar da Parada já não agregaria mais nada à casa, cuja imagem já está mais do que consolidada entre os gays - e também junto aos héteros que lhe interessam.

Já que as estrelas são as festas, o assunto nas rodinhas é um só: quem vai se jogar onde. Os principais clubes já soltaram suas programações, detonando a tradicional correria pelos ingressos, a preços progressivos (a partir desta segunda, as entradas para a TW devem sofrer o primeiro aumento). Nos blogs gays, a tendência é que esse assunto ocupe cada vez mais espaço, com os mais empolgados vestindo a pele de comentarista e fazendo suas apostas pessoais, coisa e tal.

Mais do mesmo? Não deixa de ser. Mas sempre há novidades e fofocas de última hora. Prova disso é que a coluna Destaques GLS, publicada pela Folha Online, passou de semanal a diária, e assim ficará até dia 25, o domingo em que tudo termina com a Parada. Entre os últimos causos, está o misterioso fechamento da boate Megga pela Prefeitura - os donos da casa disseram apenas que há "pendências burocráticas". Enquanto isso, a The Week se prepara para estrear uma gigantesca cobertura para a área externa do clube, antecipada neste vídeo.

No ano passado, este blog fez um guia completo para os turistas, com festas, lugares para comer, passeios e dicas. Já preparei alguma coisa, mas ainda é cedo para falar sobre isso: tenho outros assuntinhos para tratar primeiro. Só voltarei a falar sobre a Parada na reta final - provavelmente, será o último post a ser publicado antes do tradicional recesso entre quarta e segunda-feira.

sábado, 10 de maio de 2008

Octavio Café: um café à altura de São Paulo

Os paulistanos começaram a apreciar cafés especiais há coisa de cinco anos atrás. Em casas como Cafeera, Suplicy e Santo Grão, o café virou bebida de boutique, cuidadosamente preparada por profissionais especializados (os baristas), a partir de grãos selecionados; as nuances de sabor possíveis são tão diversas que, em alguns lugares, o cliente recebe um cardápio só com opções de café. E, na hora de servir, a espuma pode vir com desenhos que são pequenas obras de arte.

Eu pessoalmente não ligo muito para a bebida, mas freqüento cafés porque são lugares gostosos para reunir os amigos (e menos barulhentos para conversar do que bares). Além disso, eu compenso essa minha indiferença prestigiando os quitutes e guloseimas do menu. Adotei o Suplicy como meu preferido por causa da torta de limão, a melhor que já comi na vida (quando está fresquinha); depois, ele foi desbancado pelo Santo Grão, com seu ambiente aconchegante e intimista (o Suplicy é claro demais, as cadeiras são duras, é um lugar onde não dá vontade de ficar mais do que o necessário) e também por conta do frapê de café, feito com muuuito leite condensado.

Mas agora tenho um novo favorito, e esse vai ser difícil de desbancar: o Octávio Café, um desses lugares incríveis que só uma cidade refinada e megalomaníaca como São Paulo poderia ter.

Tudo no Octávio impressiona, a começar pela arquitetura arrojada, que se destaca no cenário da Faria Lima. A imponente fachada poderia ter sido desenhada pelos Jetsons: ela mais parece um disco voador, ou talvez uma xícara gigante. Quem cruza a porta de entrada e olha para a direita se depara com um salão com pé-direito altíssimo, em que a luz natural entra suavemente, pelas fendas horizontais que cortam as paredes da tal grande xícara de madeira. Há várias mesas e um balcão circular, onde estão expostos alguns doces e bolos caseiros.

Do lado esquerdo de quem entra, primeiro há um lounge com tapete felpudo e oito poltronas egg vermelhas, com entrada para iPod - o cliente traz seu aparelhinho de casa e pode tomar café escutando suas músicas preferidas, que saem de pequenos falantes embutidos no encosto das poltronas. Depois há mais mesas – as do canto do salão são emolduradas por gostosos sofás de couro, que convidam a um longo papo com os amigos. Há ainda uma área externa com mesas e cadeiras brancas, isoladas do caos da Faria Lima por uma espécie de cerca viva. O lugar é realmente muito bonito.

Se o ambiente já justifica a visita, o extenso cardápio não decepciona. Há opções para todos os desejos e situações. No café da manhã, é possível pedir croissants, pães na chapa ou os deliciosos ovos mexidos, que vêm com torradas fofas e macias, em três preparações: parmesão, tomate e ervas, presunto de Parma, queijo brie e tomilho (uma delícia!) ou salmão defumado, ovas e ciboulette. Para o almoço ou jantar, algumas pedidas são o atum semigrelhado, com purê de cenoura e três cogumelos, o risoto de camarão com abobrinha, palmito fresco e castanha-do-pará e o tortelli de mussarela de búfala com perfume de manjericão, tomate fresco, rúcula e um surpreendente toque de laranja.

O menu tem ainda seções com pratos leves (ovos com aspargos, champignons, tomates e ervas), saladas criativas (endívias, peras, queijo brie, avelãs, mel trufado e farofa de bacon), sanduíches (presunto cru, queijo Camembert, shiitake, radicchio e azeite de limão siciliano), petiscos (porções sortidas de bruschettas, pastéis, tapiocas ou canapés) e, claro, sobremesas (mousse de chocolate amargo com café, crême brulée com perfume de capim cidreira). Dei apenas alguns exemplos porque este texto já está longo demais.

Não é um lugar barato, mas também não é tão caro quanto se podia esperar. Os pratos têm preço compatível com os de bons restaurantes (R$36 pela vitela à milanesa, por exemplo); já nos matinais, a cesta de pães custa R$13 e serve muito bem três pessoas. No fim das contas, seja pelo ambiente espetacular, pela freqüência bem-nascida, pelos ótimos ovos mexidos ou pelo denso chocolate quente belga, o Octávio Café é um lugar especial, daqueles que dá vontade de voltar sempre, trazer os amigos e mostrar com orgulho aos turistas de fora. Ainda não esqueci a torta de limão do Suplicy, mas esse café é o meu atual número 1 – aos que estão vindo para a Parada Gay de São Paulo, recomendo que saiam um pouco do fervo da Paulista e dêem uma passada por lá.

Octávio Café: Av. Brigadeiro Faria Lima, 2.996 - (11) 3079-4478
Aberto diariamente das 7h45 ao último cliente

terça-feira, 6 de maio de 2008

Diminui a distância entre a Junior e a DOM

Depois de registrar aqui minhas primeiras impressões sobre as revistas gays Junior e DOM, resolvi esperar alguns meses para retomar o assunto e fazer um comentário sobre a direção que cada uma das publicações está tomando. Até botar as mãos nas últimas edições (cujas capas ilustram este texto), eu já tinha mais ou menos na cabeça o que ia dizer: que as duas revistas tinham propostas claramente distintas e seguiam caminhos bem separados, de modo que não era o caso de tratá-las como produtos concorrentes ou rivais. Tudo isso antes de ler a DOM#3 e, especialmente, a Junior#4.

Se ainda concordo que Junior e DOM têm estilo, linguagem e visões de mundo peculiares, pude constatar que a distância que as separava ficou menor. É nítido que as duas revistas aprenderam com o feedback do público e também uma com a outra. Com isso, de certa forma se aproximaram e passaram a ser potencialmente interessantes para uma mesma parcela de leitores. Ainda que em tese elas tenham consumidores diversos, a intersecção entre seus públicos aumentou.

E o esforço maior para isso parece ter sido da Junior. Depois de uma chuva de críticas, a revista finalmente percebeu que escrever "excessões" não é legal e resolveu investir um pouco no seu texto. Se o pessoal do Mix Brasil não estava dando conta do recado sozinho (e era visível a diferença de qualidade entre os textos do cabeça André Fischer e os demais), a revista teve a humildade de pedir reforço de fora. E não economizou: abriu espaço para gente do naipe de Gilberto Scofield Jr. (articulista da pioneira revista Sui Generis e correspondente na China no jornal O Globo), Christian Petermann (afiado crítico de cinema da Folha de S. Paulo) e Sérgio Miguez (livreiro experiente e dono da antiga livraria gay Futuro Infinito), além de Ricardo Oliveros, Caio Taxi e Tony Goes, pessoas antenadas e capazes de pinçar informação fresca e interessante. Resultado: o conteúdo escrito da revista deu um salto, tanto de qualidade como de quantidade. Ainda que o apelo maior siga sendo o das imagens, começam a chamar a atenção as boas pautas de comportamento. A própria criação de colunas e seções identificáveis deu um fio condutor à Junior, que ficou com menos cara de colagem de trabalhos e mais cara de revista.

A DOM, por outro lado, já nasceu bem formatada e tem tido uma trajetória mais linear, sem reinvenções ou crises de identidade. Vem acertando na estética elegante e nas reportagens (gays muçulmanos, barebacking, militares gays, André Almada, a coluna de Júlio Moreno), mas ainda tem pela frente o desafio de ousar mais, surpreender de verdade (nesse sentido, a formatação mais livre e solta é uma vantagem para a Junior). Explorado como chamariz da edição 3, o especial de moda com Rodrigo Hilbert poderia ter ido muito além: virou uma capa branca, de impacto zero, e um ensaio cinzento, opaco, sem tempero. O fato de ser moda inverno não é justificativa: dava para ter feito algo bacana e "invernal" em uma locação no campo, à la Revista VIP, ou mesmo dentro de uma biblioteca, com os tons escuros das prateleiras dando sobriedade aos ternos e as lombadas dos livros emprestando um pouco de cor e vivacidade. Só perdoei porque a parte de jeans entregou tudo o que as páginas com Hilbert ficaram devendo - e o portfólio me presenteou com o meu lindinho Ramirez numa pose de matar, oferecendo sua cheirosa axila. Aliás, essa concessão ao fashion e aos corpos não deixa de ser uma aproximação com a linguagem mais visual da Junior.

É claro que as duas revistas ainda estão muito no começo: com quatro edições, qualquer publicação ainda está engatinhando, ainda mais num segmento cru e pouco explorado como esse no Brasil. Talvez o certo seja dar tempo ao tempo e fazer outra análise quando os rebentos completarem seu primeiro ano de vida. É preciso reconhecer que Junior e DOM estão melhorando a cada edição, na medida em que vão se soltando, ganhando confiança e construindo um diálogo com seu público. Os anunciantes, aos poucos, também estão aparecendo. Ainda que tenham muito a lapidar (e aprofundar), são duas revistas redondas e gostosas, que já mostraram o que se pode esperar delas. Nesse sentido, não são concorrentes, mas complementares. Alguns assuntos ficam melhores na DOM e outros só poderiam estar nas páginas da Junior. Com elas, o mercado editorial gay já tem com que se entreter, pelo menos por algum tempo. Vamos ver como cada uma vai lidar com o impasse de se tornar mensal - e continuar tendo algo a dizer.

Há espaço para uma terceira? Sim, mas agora os nichos vazios a preencher já são mais específicos. Mesmo sabendo que o mercado gay ainda é bastante pequeno, consigo pensar em três possibilidades: uma revista que seja menos fútil e mais séria, substancial, politizada; uma revista de vanguarda, transgressora, que se proponha a um exercício estético e artístico realmente inovador; e uma revista com uma proposta assumidamente erótica, bem sexy, mas que mantenha um bom nível editorial e tenha uma certa irreverência, seja inteligente. Várias revistas estrangeiras bacanas - não necessariamente gays - podem dar exemplos e servir de inspiração. Agora, uma coisa é certa: com os atuais jogadores do cenário, uma nova publicação que seja amadora dificilmente vai emplacar.

domingo, 4 de maio de 2008

B.I.T.C.H. perde a inocência e se adapta aos novos tempos

Quem trabalha com festas sabe que o público é como um rei manhoso que precisa ser muito bem servido por seus criados. Os produtores que sabem escutar e seguir as vontades da freguesia - desejos que mudam com o tempo - sobrevivem; já as festas que não conseguem entender isso acabam sendo engolidas e ficando pelo caminho, como aconteceu com a X-Demente. Na noite de ontem, a B.I.T.C.H. mostrou que de boba não tem nada e está preparada para enfrentar os "novos tempos" que começaram com a chegada da The Week Rio. De volta à locação que marcou seus anos dourados, o parque temático Terra Encantada, na Barra da Tijuca, a label party de Téo Alcântara fez uma edição babadeira, que deve ficar na boca dos cariocas por um bom tempo.

Fazia muitos anos que eu não ia a uma B.I.T.C.H.: meu referencial eram as festas que Téo fez ali entre 2000 e 2002, bem antes de começarem os problemas com o parque, coroados com o trágico acidente com uma bee que caiu de um brinquedo. Não peguei a fase do Monte Líbano, a parceria com a R.Evolution de Rosane Amaral, as megafestas de Carnaval na Leopoldina, nem as recentes edições na Fundição Progresso. Pelo que eu sempre ouvia, a festa tinha deixado de ser um ponto de convergência de pessoas interessantes e só tinha sobrado o povo bagaceiro. Se os tempos mudaram de 2002 para cá, a B.I.T.C.H. mostrou que também mudou.

Esqueçam aquela festinha inocente e fofa em que a pista era montada dentro da tenda dos carrinhos de trombada (que aqui têm o nome de "bate-bate") e a maior loucura possível era cheirar Vick Vaporub e dar uma volta na montanha-russa que emoldurava o cenário. A B.I.T.C.H. de ontem foi uma gigantesca festa open-air, que mais parecia uma edição noturna e carioca da Gira-Sol, a day party que antecede a Parada Gay de São Paulo. Pelo menos cinco mil pessoas, num cálculo modesto, espalharam-se no vão central entre as casinhas da cidade cenográfica do parque, que serviu como pista principal, com um palco enfeitado por uma grande parede de leds, de onde os DJs comandavam a massa feroz.

Por "massa feroz", entenda-se toda a nação tribaleira/barbie/rata-de-festa do Rio de Janeiro e Baixada Fluminense, da Vieira Souto à Estrada do Catonho, com direito a uma espetacular oferta de machos que nenhuma outra cidade do Brasil consegue reunir. Na bombada pista principal, não faltaram peitorais, braços, tanquinhos, sovacos, trenzinhos, almôndegas, fio-terra e pegações diversas. A qualidade dos corpos denunciava que todas as "bunitas" estavam lá. Prova disso é que a The Week Rio dispensou parte dos funcionários e nem abriu a pista principal: funcionou apenas a pequena parte nova que compreende a pista 2 e o puxadinho que se convencionou chamar de "área externa" da casa.

Claro que a B.I.T.C.H. não perdeu a pegada democrática que sempre foi sua marca registrada: para cada adônis esculpido, havia três pessoas fora desse padrão. E tinha de tudo mesmo, desde clone do DJ Ze Pedro até Fergie em versão trava, passando por sapas de pochete e mullet e muitas bees novinhas coreografando a diva Madonna na pista 3 (o tema dessa B.I.T.C.H. era o lançamento mundial do album Hard Candy). Na porta da festa, a cena era dantesca: os funcionários tentaram fazer cu doce e liberar a entrada aos poucos, mas a multidão logo perdeu a paciência e literalmente invadiu a festa, derrubando as grades e avançando sobre os insuficientes seguranças. Com isso, ninguém teve ingresso checado - e quem, como eu, tinha acabado de pagar salgados R$60 na bilheteria se sentiu um idiota.

Felizmente, o Terra Encantada é bastante amplo e houve espaço de sobra para a multidão se acomodar bem. Além da pistona principal e do "cantinho Madonna", havia uma pista coberta com hits pop. A acústica era um pavor (eu me senti no salão de festas de algum conjunto residencial em Belford Roxo), mas era até divertido dançar lá alguns minutos e ver o povo ficando histérico já nos primeiros acordes de cada música da Rihanna (duro foi engolir a virada de "Umbrella" para "Ilariê"). Enquanto a bebida era vendida a preços oficiais nos bares em volta da pista principal, uma dose dupla de vodka com gelo saía a meros R$ 3 no "mercado paralelo", um bar pobrinho que fez a alegria dos mais espertos. E o jeito era entornar o álcool goela abaixo - a menos que você preferisse os espetinhos de coração de galinha da casa ao lado ou, quem sabe, forrar o estômago numa outra portinha que oferecia yakissoba e café.

Detalhes insólitos à parte (nem vou comentar os banheiros, pois, pelo que consta, só paulista se importa com isso), foi uma noite e tanto. Os DJs sabiam fazer o povo pular com pancadões tribais atualizados (não lembro de ter ouvido Safri Duo nenhuma vez) e as pessoas estavam lá para se jogar mesmo. Tanto é que dois rapazes que tinham feito um certo carão para mim no chill in de sexta-feira me agarraram, primeiro em separado e depois ao mesmo tempo. Não sei quando a festa acabou, mas não pode ter sido antes das 8 da manhã - o povo estava descontrolado, era gente pra caramba, e olha que a cidade nem estava tão cheia de turistas (quando tem festa, os cariocas não perdem a chance de sair da rotina e comparecem em peso). Fui embora do Terra Encantada como se tivesse saído de um grande festival, exausto. Aquela festinha meiga e naive de 2002 provou que ainda tem muita munição para defender seu espaço no panteão das grandes.