domingo, 30 de março de 2008

Megga Fun: o segundo peixe grande no aquário

Depois de longos meses de gestação, ontem finalmente a noite paulistana ganhou um segundo grande clube gay: a Megga Fun, que abriu suas portas numa travessa erma da avenida Marquês de São Vicente, na Barra Funda. Na porta, o drama típico de toda inauguração: filas quilométricas, estacionamento lotado e carros quase que empilhados uns sobre os outros pela rua. Amigos meus chegaram ao ponto de estacionar na Flex e pegar um táxi (“Pelo menos para isso a Flex vai continuar servindo”, alfinetou um deles). Transtorno sim, mas também sinal de que o basfond prometia.

A imponente fachada, que já havia sido divulgada para a imprensa por fotos nos blogs afora, tinha até um certo quê da The Week. Aliás, no inconsciente coletivo, todas as questões e expectativas em relação à nova casa tinham a ver com a TW: será que a Megga é maior e/ou melhor e/ou mais bonita? Será que vai desbancar a TW e se tornar a “boate número 1” de São Paulo? Depois que a TW ditou novos padrões, não tem jeito: qualquer outro clube grande que apareça na cena gay vai carregar o peso da comparação. Mas essa resposta eu vou deixar para o final do texto.

Em termos de instalações e estrutura, a Megga Fun é uma casa do mesmo porte da The Week – com semelhanças e peculiaridades. Na entrada, após ser revistado e pegar a comanda nos caixas, você atravessa uma porta e chega ao primeiro ambiente, que a casa chama de lounge. É um espaço retangular, amplo, que serve como átrio de circulação para os demais ambientes, mas não deixa de ser uma pista. Uma das paredes possui painéis coloridos piscantes, adaptando a idéia da pista 2 da TW (que, por sua vez, bebeu na fonte do D-Edge). O DJ do lounge não toca no mesmo nível do público, mas do alto de uma espécie de balcão elevado, como um mezanino.

Atrás do lounge, isolada acusticamente por duas portas de vidro, está a pista principal. Quadrada e com pé direito bem alto, dá a impressão de ser mais ampla do que a da TW. Nas laterais, há discretos camarotes, com sofás brancos, e paredes com painéis d’água iluminados, que parecem aquários e vão mudando de cor. No meio da pista, um bar quadrado (que precisa de mais gente no atendimento!); entre o bar e o palco onde o DJ toca, dois queijos para go-gos dançarem e fervidos em geral darem pinta. Projeções no palco e na parede dos fundos (bem bacanas) e raios laser coloridos (que já estão meio saturados, né?) completam os efeitos visuais. O som é alto (até demais) e o ar condicionado dá conta do recado – mesmo com a muvuca da inauguração, ninguém passa calor. Gostosa de dançar, a pista será excelente para eventos eletrônicos paralelos nas noites de sexta (a Megga só funcionará aos sábados).

Nos fundos, os banheiros e os caixas mostram que a MF fez a lição de casa direitinho – a vantagem de ter demorado para abrir foi justamente poder ajeitar os detalhes com calma, sem falhas de acabamento típicas de quem inaugura às pressas (Ultra Diesel, Studio Roxy). Os banheiros são impecáveis, com arrojadas pias em mármore negro, cabines de sobra e um espaço para o povo que adora ficar de fofoca por ali (tipo o Gui). Os caixas são muitos, rápidos, aceitam todas as formas de pagamento e tratam o cliente com cortesia. Aliás, todo o staff da casa foi muito bem educado, o que não deixa de ser outra (boa) influência do padrão TW de qualidade.

Cruzando a pistona e voltando para o lounge, mas pelo lado oposto, chega-se a um anexo com um café e uma pequena parte ao ar livre, com algumas mesas e guarda-sóis. Essa área não me agradou: ela destoa completamente do resto da casa. O café não tem charme algum e parece um daqueles cafés de cinema de bairro; no balcão, há uma daquelas estufas de boteco, com coxinhas (!) e baurus (!!!) à venda. OK, eu até gosto de coxinha, mas acho totalmente inadequado um troço daqueles dentro de um clube. Tem até coifa no teto! Imagina só você chegando na pista com duas coxinhas e uma coca na mão... falta só o molhinho de pimenta! E as mesas lá de fora são idênticas às do Black Dog da Al. Joaquim Eugênio de Lima – fiquei esperando alguma biba aterrissar com uma bandeja com dois cachorros-quentes cobertos de batata palha e purê... viva a área externa da The Week!

Mas esses são detalhes até bastante pequenos. Talvez colocando umas plantinhas lá fora e trocando os salgados de padaria por algo menos gorduroso e antiestético (sanduíches naturais? temakis? açaí? precisa mesmo ter comida?), o aspecto fique melhor. Ah, e uma iluminação melhor em cima do DJ da pistona. Mais do que esses detalhes, porém, o que preocupa mesmo é a questão do estacionamento – a casa precisa pensar com urgência em uma solução melhor para acomodar a demanda, e de preferência num lugar que não leve meia hora até o seu carro chegar de volta. Senão, quando chegar a Semana da Parada, a Flex vai acabar ficando sem vagas...

O som da Megga Fun não chegou a me emocionar, mas também não posso deixar de ser justo com eles. A linha musical superpintosa do Paulo Ciotti sempre me desagradou (desde a época da Level), mas o som dele no lounge estava até bem agradável. E, na pistona, o simpático Paulinho Agulhari acertou a mão e equilibrou no set dele momentos mais gays e outros mais eletrônicos, mantendo a pista acesa e conseguindo agradar a todos – o que é especialmente difícil quando se está diante de um público heterogêneo como o da casa.

E bota heterogêneo nisso: tinha de um tudo na pista da Megga. Habitués da Bubu (cujos sócios são também os donos da MF), alguns club kids novinhos da Flex, outros mais velhos, um punhado de descamisados da The Week, héteros do bem, meninas... todo mundo se divertindo feliz, beijando muito, sem muito carão nem colocação. Inauguração é sempre um balaio de gatos, vamos ver como a casa irá definir seu público nas próximas semanas.

No geral, a casa é legal, sim. Se não fiquei boquiaberto e de queixo caído, foi porque, depois que a The Week inaugurou a era da grandiosidade, ficou cada vez mais difícil para um novo clube causar impacto. Mas a Megga Fun é um espaço bonito, grande, confortável e que tem tudo para emplacar, ainda mais se lembrarmos que muita gente já não se satisfazia mais só com a TW. Toda casa vai fazendo ajustes quando abre (comparem a TW 2008 com a TW 2004); até que a MF abriu bem acertada, com poucas mancadas e muitas bolas dentro. Na Semana da Parada Gay, o clube deve bombar, especialmente se tiver a preocupação de investir em bons DJs convidados (aliás, não pode ser só na Parada, não; para a casa se impor, seria de bom tom receber uma atração de fora por mês).

Agora, para encerrar: a Megga Fun derruba a The Week? Não. Existe uma numerosa parcela do público da TW que dificilmente vai se interessar pela nova casa: as barbies. É na casa de André Almada que os melhores corpos se reúnem, e vai continuar sendo assim. Até porque todos eles se conhecem e formam ali uma grande e unida família, junto com os queridos DJs Cecin, João e Pacheco, a Grá e o próprio Almada. Prova disso é que, tirando uns poucos curiosos, boa parte dos fiéis do templo TW ignorou olimpicamente a inauguração da Megga e foi prestigiar a Babylon de sempre, que teve sua lotação inabalada. E os que foram estranharam o ecletismo da pista - preferem dançar em uma pista onde todos sejam iguais.

Engana-se, porém, quem pensa que a Megga se importa com isso. Dá para ver que os dois clubes tem propostas e públicos-alvo bem diferentes. A TW sempre teve a pretensão de ser o clube das "finas", das "tops", sempre flertou com o jet set e os "formadores de opinião"... uma preocupação que a MF simplesmente não tem. A própria Bubu cresceu completamente "na dela", conquistou seu espaço e seu público sem fazer alarde nem puxar o tapete de ninguém. A Megga promete ir no mesmo sentido. E será que ela precisa mesmo roubar o público da TW? Parece que não: a noite de ontem, com as duas casas lotadas, mostrou que existe espaço para ambas. Só não sei se sobra espaço também para a Flex. Rodrigo Zanardi vai ter que pensar, rápido, em alguma repaginada incrível, se não quiser ver seu espaço deixado de lado, pelo menos pelo público gay razoavelmente qualificado.

quinta-feira, 27 de março de 2008

Parada 2008: The Week já escolheu DJs gringos

O blog Glamaddict saiu na frente e já revelou a programação da The Week para a semana da Parada Gay em São Paulo, ainda não divulgada oficialmente. A julgar pelos DJs de fora que se apresentarão desta vez, a filosofia do clube parece ter sido "em time que está ganhando não se mexe". A equipe de André Almada preferiu jogar no seguro, trazendo apenas atrações que já foram testadas e aprovadas no último verão.

A noite de quarta era sempre reservada para DJs de fora da panelinha do tribal, como Danny Tenaglia e Victor Calderone - que traziam novas sonoridades, mas dividiam opiniões. Desta vez, a casa decidiu agradar a todos e escalou o mexicano Isaac Escalante, cada vez mais querido por aqui, e que roubou a cena no Carnaval da TW Floripa. Quinta continua sendo a noite em que a TW descansa (e o povo vai prestigiar as festas paralelas, porque ninguém ali precisa dormir). Sexta será a vez do americano Chris Cox - o gorducho foi destaque no réveillon da TWRJ e atração do carnaval de Floripa (onde tocou na E-Joy), além de ter abrilhantado o nome da X-Demente na festa do Pacha, na Parada de 2007.

No sábado, a TW repete a bem-sucedida dobradinha do ano passado: durante o dia, a day party Gira-Sol (a grande surpresa de 2007), com João Neto, Renato Cecin, Pacheco, Ana Paula e uma atração do selo espanhol Matinée Group; à noite, o ponto alto da programação, uma edição especial da Babylon com os endeusados Offer Nissim e Peter Rauhofer (não se sabe se eles tocarão em back-to-back ou separados). E, no domingo, para encerrar, a saideira da jogação será na Nova Pool Party, mais uma vez com participação do clã da Matinée. Afinal, muita gente nem pensa mais em ir à Parada mesmo.

Se muitos ainda comemoram a chance de mais um encontro com seu DJ preferido (especialmente os maníacos por Offer e Peter), para outros tantos esses nomes já começam a dar sinais de cansaço. Nessa Parada, a The Week está sendo extremamente conservadora, para dizer o mínimo. No entanto, se a casa deverá continuar sendo um endereço seguro para encontrar gente bonita, dessa vez ela não será mais a única opção. Megga Fun e Flex também estarão concorrendo no cenário, podendo inclusive trazer bons DJs gringos. No caso da Megga Fun, a própria suntuosidade das instalações serve como chamariz, especialmente para os turistas que só freqüentam SP nesta época. Isso tudo sem falar nas outras festas que sempre pipocam pela cidade (se bem que, com o poder de fogo dos clubes, as Magmas da vida vão ter que rebolar muito mais para serem notadas).

De tudo o que se apresenta até o momento, o que mais me interessou mesmo foi a Gira-Sol. A edição do ano passado foi espetacular, com cara de grande comemoração, uma energia única. Qualquer que seja a locação escolhida, só o astral da festa já justifica o ingresso. E a presença da Matinée também me agrada (a experiência em Floripa foi ótima). Além disso, ir a uma festa diurna te permite descansar um pouco à noite e fazer outras coisas no feriado, aproveitar o fervo na cidade - e não só ficar se jogando da-festa-pra-cama-pra-festa-pra-cama, cinco dias seguidos, para chegar ao final de tudo arrasado. Jurei que não iria mais cair nesse esquema, e pretendo cumprir a promessa.

quarta-feira, 26 de março de 2008

Saideira do podcast

Para quem gostou dos podcasts que gravei a convite da Folha Online, um aviso: já está no ar mais uma edição dos Destaques GLS - e essa de hoje contém minha última participação na coluna.

Antes que me perguntem "mas e o quarto podcast"? , explico: esse era o quarto. O terceiro deveria ter ido ao ar na semana passada, em 19 de março, mas o Sérgio Ripardo ficou doente e não publicou a coluna. Agora ele está saindo de férias e os Destaques GLS só voltam em maio. Como até lá o conteúdo daquele terceiro papo já estará muito desatualizado, ele acabou sendo descartado. [UPDATE: Sérgio informou que o terceiro podcast foi publicado sim, mas fora da coluna - ouça aqui].

Ou seja: Introspective, agora, vocês só vão ter aqui. Pelo menos até que surja algum outro convite...

O dia de ontem rendeu

7:00AM - Alguns meses atrás, numa ida ao supermercado (rara, porque não moro sozinho e não sou eu quem abastece a casa), eu me deparei uma pasta de dente de baunilha (!), a Sorriso Vanilla Mint. Comprei para provar, e vi nela uma ótima aliada contra a larica de sobremesa que sempre tenho após o almoço: como ela é docinha (sem deixar de ser refrescante) e tem cara de pavê, basta escovar os dentes logo depois de comer, que eu perco a vontade de comer doce. Pois hoje experimentei um novo sabor de Sorriso: menta com guaraná. É ainda mais gostoso - parece aqueles refrescos de guaraná da minha infância.

1:55PM - Não tenho o hábito de ler a Superinteressante, porque muitos dos assuntos curiosos que eles abordam não despertam o meu interesse. Mas adorei a matéria de capa deste mês, um mergulho no universo dos presídios, onde a vida segue leis paralelas e tudo tem seu preço, desde telefone celular até o direito de continuar vivo. A seriedade do tema poderia render uma reportagem sisuda e deprê, requentando o livro Estação Carandiru, mas a dupla de repórteres soube inovar: costurou suas descobertas em um texto surpreendentemente saboroso e bem-humorado - sem deixar de ser informativo e trazer curiosidades que são, afinal, o mote da revista (a receita caseira de "maria-louca", por exemplo). E a editoria de arte da Super - acostumada a transformar assuntos pesados em matérias visualmente atraentes - fez, mais uma vez, um trabalho colorido e vibrante.

4:20PM - Gosto de descobrir comidinhas gostosas na cidade e cultuá-las como se fossem pequenos segredos que só eu conheço. Um desses tesouros escondidos era o Desfrutti, uma casinha com jeito praiano na Rua Tabapuã, que fazia ótimas vitaminas e os melhores wraps da cidade - com pão-folha fininho e crocante (bem diferente do borrachudo da cadeia Wraps) e recheios fartos, em deliciosas combinações. Aos poucos, a receita foi dando certo. Primeiro, rendeu uma filial bem maior na Faria Lima; depois, novos pontos na Vila Olímpia e na Alameda Santos (onde ficava o Pequi). Agora, eles vão desocupar a casinha da Tabapuã e abrir uma nova loja no Itaim, na Rua Joaquim Floriano. O melhor: eles estão crescendo sem perder o sabor e a qualidade do começo. Estive na filial da Alameda Santos e constatei que meu wrap favorito, o Nias, continua irresistível, assim como o suco de limão, hortelã e leite condensado light.

6:45PM - Cheguei à faculdade um pouco mais cedo, fui matar o tempo na biblioteca e me encantei com a Lürzer's Archive, uma revista que seleciona as melhores campanhas publicitárias do mundo. Espécie de bíblia dos diretores de arte e criação, foi criada em 1984 e tem cinco edições (americana, européia, alemã, chinesa e internacional), que circulam bimestralmente - a capa da edição internacional nº 06/2007 traz Gisele Bündchen nua, coberta por uma espécie de jato de água, que imita um vestido esvoaçante de caimento perfeito. Os trabalhos selecionados são absolutamente fascinantes: criativos, irreverentes, geniais. Dá vontade de virar publicitário amanhã - de preferência, em um país onde não se façam propagandas grosseiras e retardadas do tipo "Nã-Nã-Nã-Nã" e "Zeca-Feira".

8:20PM - No segundo ano do meu curso de jornalismo, duas disciplinas fazem um panorama crítico da história recente do Brasil, discutindo, por exemplo, as conseqüências do regime militar e os planos econômicos que se sucederam após a abertura política. É um amadurecimento dos conteúdos de história que os alunos tiveram no colégio, para ajudá-los a entender melhor o país em que vivem (vale lembrar que a maioria deles nasceu entre 1987 e 1989). Vendo vídeos da época das Diretas Já e também das campanhas presidenciais de 1989, fiquei impressionado ao ver como, mesmo após 20 anos de repressão política, a sociedade brasileira era muito mais mobilizada. Hoje, somos todos apáticos, entorpecidos mesmo. Sentimo-nos impotentes, maldizemos os políticos em geral - e desistimos, tocando a vidinha diária e cuidando dos nossos interesses individuais. Uma manifestação popular como as que ocupavam a Sé e a Cinelândia seria impensável nos dias de hoje - no máximo, protestamos sentados na internet, e olhe lá.

domingo, 23 de março de 2008

Agenda eletrônica

::: Para quem gosta de dançar feliz, rebolando e cantando o refrão, o nova-iorquino Erick Morillo [foto à dir.] traz de volta ao Brasil sua boa house music com vocais conhecidos e um certo apelo comercial. No estado de São Paulo, serão duas apresentações - a primeira no dia 4 de abril, na The Week, e a segunda no dia 20 de abril, véspera de feriado, no Sirena, em Maresias. Ele também passará por Brasília (5/4), Belo Horizonte (18/4) e Balneário Camboriú (19/4). Morillo é um dos donos do selo Subliminal Records, há sete anos responsável por uma das noites de house mais bombadas do verão de Ibiza, que rola todas as quartas no Pacha de lá. O cara realmente toca com o coração: dança, canta junto e, a cada virada, fecha os olhos e dá tudo de si, como se estivesse tendo um orgasmo. Sem dúvida, alguém que ama o que faz.

::: Já os amantes da house progressiva não podem perder a apresentação do top holandês Sander Kleinenberg [o bonitão da foto à esq.], dia 5 de abril na Anzu, em Itu (a 92km de SP). O clube, gigante, é um dos mais bonitos do Brasil, e os preços são até camaradas para um DJ desse porte: para homens, entrada a R$ 30 mais consumação de R$ 20 (pista), R$ 40 (mezanino) ou R$ 80 (camarote). Tive a oportunidade de ver Sander tocando no Amnesia, em Ibiza, e posso garantir: o som do moço - arrasa-quarteirão, extremamente dançante e bem-humorado, passeando por diversas vertentes da house - vale a viagem até Itu.

::: Para quem puder ir um pouco mais longe, no mesmo dia 5 de abril acontecerá em Buenos Aires a quinta edição do minifestival Southfest - terceiro maior evento eletrônico da cena portenha, atrás apenas do gigantesco Creamfields e da South American Music Conference. Desta vez, a festa será em Costa Salguero, em formato menor e mais intimista. Os destaques do line up serão Paul Oakenfold, a dupla Underworld e o ídolo argentino Hernán Cattáneo - que deve fazer mais uma de suas apresentações apoteóticas. Quem for se aventurar pode aproveitar e esticar a balada no Caix - o famoso afterhours também fica em Costa Salguero e vive suas melhores manhãs quando acontece depois de festivais.

quinta-feira, 20 de março de 2008

Curitiba, boa opção para um feriado diferente

O feriado de Páscoa está aí e, como de costume, o Rio de Janeiro promete praia e uma programação noturna animada (agenda completa no Cena Carioca). Por outro lado, se você já está meio cansado de ir às festas de sempre e encontrar as mesmas pessoas, ou está numa fase um pouco mais tranqüila, Curitiba pode ser um passeio interessante. Para quem está em São Paulo, a capital paranaense é mais próxima do que o Rio e tem ponte aérea pelo mesmo preço - mas muitos se esquecem dela. Não deveriam. Curitiba tem parques lindos, comida excelente a preços menores do que os de SP e uma noite até bem diversificada. Além disso, começou ontem a 17ª edição do Festival de Teatro de Curitiba - que terá diversas peças escritas por dramaturgos gays ou relacionadas ao universo homossexual, e deve trazer um agito extra para a cidade.

O BRASIL QUE FUNCIONA
Já virou clichê falar que Curitiba é a capital mais evoluída do país, mas esse papo não é balela - tudo funciona direitinho por lá. A cidade é limpíssima (se bobear, o assento do banheiro público tem cheiro de tutti-frutti), o transporte público é modelo e as pessoas são educadas. Para o turista, esse banho de progresso significa ter à mão mapas de bolso com as ruas e atrações da cidade (coisa que Rio e São Paulo jamais se dignaram a fazer pelos seus visitantes) e até uma linha de ônibus (a "Jardineira") que percorre todos os pontos turísticos a intervalos regulares - a exemplo de grandes capitais como Londres, Nova York e Madri. A geografia turística da cidade é fácil - com o centro e os bairros nobres no meio e os parques no entorno - e a segurança, se já não é mais a mesma de vinte anos atrás, não chega a ser uma preocupação.

A CAPITAL DOS PARQUES
Enquanto o Rio ferve na praia e São Paulo vive uma intensa programação cultural, Curitiba é a capital dos parques. Há muitos e de todos os tipos, espalhados pela cidade. O Jardim Botânico, com sua estufa de vidro e suas alamedas em estilo francês, é o símbolo da cidade [foto acima]. O Barigüi é o Ibirapuera local: onde as pessoas vão para fazer esporte, tomar sol nos finais de semana e também ver e serem vistas. O Bosque Alemão tem uma trilha onde é contada a fábula de João e Maria, além de um pequeno mirante e uma lanchonete com tortas alemãs deliciosas. E tem ainda os parques Tanguá e Tingüi, o Bosque do Papa, a Ópera de Arame... Muitos bairros têm bastante verde e um clima relaxante, com cara de subúrbio americano - quem conhece Montreal terá uma sensação de déjà vu ao andar no Bigorrilho (que foi rebatizado de "Champagnat" pelo mercado imobiliário) e nas Mercês. Para completar, todas as facilidades de uma cidade grande estão lá, com bons shopping centers, a multimarcas Capoani, que vende todas as grifes de luxo adoradas pelos gays (Diesel, D&G, Prada, Armani), além de ótimos restaurantes, que são uma atração à parte.

PARAÍSO GASTRONÔMICO
Se Curitiba não é a terceira maior cena gastronômica do país, deve estar perto disso. Há bons representantes de várias nacionalidades: italiana, francesa e japonesa, mas também tailandesa e até polonesa (há muitos descendentes no Paraná). Em alguns restaurantes, a própria beleza do ambiente é um destaque, caso do contemporâneo Zëa Mais, do tailandês Lagundri, da pizzaria Gepetto e da churrascaria Grimpa Steakhouse. Além desses, outros lugares recomendáveis são o japonês King Temaki (dá de dez em qualquer temakeria do eixo Rio-SP e fecha bem tarde), a cantina Barolo, a hamburgueria Mustang Sally e as pizzarias Carola D.O.C. e Avenida Paulista. Mas meu favorito pessoal é, de longe, o Babilônia & Cia. Versátil e despretensioso, faz pratos asiáticos e também uma saborosa comida de bistrô (dois destaques: o risoto spoleto, feito no vinho, com tiras de filé mignon, shiitake e radicchio, e o frango dijon). Abre 24 horas, tem preços honestos e é um concorrido ponto de encontro. E para as comidinhas e guloseimas, entre os inúmeros cafés e padarias charmosos da cidade, indico a Prestinaria, com boas quiches e doces.

E TAMBÉM DÁ PARA SE JOGAR
Curitiba tem a melhor noite entre as capitais do Sul. No meio gay, cada dia da semana tem seu clube. Os mais guerreiros começam a jogação da semana já na quinta, na Cat's - que tem três andares, freqüência pra lá de eclética (de novinhos e fag hags a cafuçus e micheles) e um perigón bem abusado no subsolo. Sexta é dia de Twiga (com dois andares e freqüência bem jovem) e sábado, de Black Box (conhecida apenas como "Box", um caixote preto com som alto para o povo perder a linha). O bar-com-pistinha Side Caffe é meio bagaceiro, mas faz bons drinks e pode ser uma opção de esquenta se você não for convidado para um chill in na casa de alguém. Vale dizer, porém, que os curitibanos são bem discretos - muitos preferem se jogar em outras cidades. No meio eletrônico, os clubes Liqüe e Vibe recebem top DJs de house e progressive como John Digweed e Deep Dish - no entanto, se tiver alguma coisa boa rolando nos clubes de Santa Catarina, é para lá que o pessoal vai. A cena indie tem um povo bem estiloso e animado. Adorei o Wonka, um clube no estilo d'A Lôca, 100% autêntico, com estampas coloridas incríveis nas paredes do bar, a pista bombando no porão e um público com atitude bem bacana. O James reúne os modernos da cidade, interessados em ouvir cruzamentos de rock com eletrônica. E, last but not least, o Kitinete [foto à esq.] é um barzinho fofo, fofo, fofo - acho que o mais fofo que eu já vi. Se pudesse, eu comemoraria todos os meus aniversários lá.

[ENDEREÇOS Restaurantes: Avenida Paulista. Rua Emiliano Perneta, 680, Centro. Babilônia & Cia. Al. D. Pedro II, 541, Batel. Barolo Trattoria. Av. Silva Jardim, 2487, Água Verde. Carola D.O.C. Al. D. Pedro II, 24, Batel. Gepetto. Al. D. Pedro II, 390, Batel. Grimpa Steakhouse. Rua Comendador Araújo, 671, Batel. King Temaki. Rua Gutemberg, 17, Batel. Lagundri. Rua Saldanha Marinho, 1061, Centro. Mustang Sally. Rua Coronel Dulcídio, 517, Batel. Prestinaria. Rua Euclides da Cunha, 699, Bigorrilho. Zëa Mais. Rua Barão do Rio Branco, 354, Centro. Noite: Black Box Club. Rua Mateus Leme, 585, Centro. James. Av. Vicente Machado, 894, Batel. Kitinete. Rua Duque de Caxias, 175, São Francisco. Liqüe. Av. Vicente Machado, 866, Batel. Side Caffe. Al. Cabral, 613, Centro. Twiga. Av. Vicente Machado, 1082, Batel. Vibe. Rua Desembargador Motta, 2311, Batel. Wonka. Rua Trajano Reis, 326, São Francisco. ]

[Post atualizado em 22.11.2009]

terça-feira, 18 de março de 2008

The Week Rio, brincando de fazer X-Demente?

Nos seus anos dourados, antes de ter sua característica musical reduzida à figura da DJ Ana Paula (e muito antes de começar a dar calotes em seus fiéis seguidores, enterrando de vez sua reputação), a X-Demente era a festa mais importante - e esperada - da noite carioca. Reunia todo mundo que importava na cena: as barbies (que ela ajudou a multiplicar pelo Brasil) e também os descolados, os fashionistas, os gringos, os globais. Primeiro, todo mundo dançava lado a lado, ao som dos sets de house e tech house de gente como Felipe Venâncio, Pareto e Márcio Careca. Depois, descamisados e modernos foram se separando em duas pistas: o primeiro grupo na pista principal, regada a tribal, o segundo no terraço da Fundição e na "edícula" da Marina. Mas, ainda assim, todos na mesma festa.

Com o declínio da X-Demente e, em paralelo, o surgimento de projetos bem mais interessantes para os modernos, como a Delírio e a Moo, deixou de existir uma festa que fosse unanimidade, que agregasse gregos e troianos. Uma noite que atraísse a cena inteira e onde fosse possível encontrar todo mundo no mesmo lugar. Os fortões e amantes do tribal foram para um lado, o povo mais underground foi para o outro - repetindo a mesma polarização que já se via na noite de São Paulo.

E então veio a invasão da The Week. Cumprida a primeira missão, de conquistar o seu lugar entre o público barbie, a casa de André Almada agora aproveita o feriado da Páscoa para arriscar mais um passo: ser uma opção de diversão conciliadora, que junte todas as tribos sob o mesmo teto, como a X um dia foi. Na noite de sábado, na pista principal, os residentes Ana Paula e Felipe Lira receberão o convidado Escape (de NY), servindo tribal para as massas descamisadas; enquanto isso, na pista 2, o ídolo Maurício Lopes e o querido Gustavo Tatá tentarão atrair o povo mais moderno (que por enquanto estava sem opção para o feriado).

Com essa iniciativa, a TW está mostrando que sabe olhar além. Ela já é manda-chuva entre os bombados e fãs do tribal, mas por que se limitar a eles? Por que não tentar, ainda que apenas em feriados, ser "o" endereço certo na cidade para todo mundo ir? Claro que os modernos continuam contando, ocasionalmente, com outras opções mais direcionadas a eles (embora adorados por seu público, Mau e Tatá não são nenhuma novidade). De qualquer jeito, a noite de sábado no galpão da Saúde é uma tentativa de fazer clãs diferentes voltarem a se divertir no mesmo espaço, como nos velhos tempos. Será que essa festa vai conseguir recriar o clima da X-Demente?

[UPDATE: o DJ Maurício Lopes me contou, via Fotolog, que a festa foi ótima, a iniciativa de colocar os muderrrnos na pista 2 da TW "superagradou" e, agora, a idéia é que isso passe a ser feito com freqüência mensal ou bimestral].

sexta-feira, 14 de março de 2008

Fim-de-semana animado para...

...HOUSEIROS Para quem gosta de house music de verdade, a Pacha faz hoje uma noite imperdível. Comemorando os 7 anos do projeto In The House, o clube das duas cerejinhas recebe o top inglês Sandy Rivera. Nome-chave do selo Defected, que lança compilações incríveis com pesos-pesados como Miguel Migs, DJ Gregory e Roger Sanchez, Sandy é responsável pelo megahit "Finally", que assinou sob a alcunha de Kings of Tomorrow. No terraço, tocam Pareto e Silvio Conchon.

...TRIBALEIROS Já os adeptos do bate-cabelo têm diversão certa na Bubu, que comemora hoje os 3 anos da bem-sucedida noite Fun!, com o convidado Bill Hallquist, de Miami (EUA). Aliás, o pessoal da Bubu está dando o que falar no mundinho: a esperada abertura do seu novo clube, Megga Fun, foi finalmente marcada para o dia 29/3. E parece que o espaço é mega mesmo. Mais pra frente falamos disso por aqui...

...MODERNOS Amanhã, os clubes D-Edge e Vegas vão apostar no minimal techno, vertente que continua sendo a bola da vez na cena eletrônica underground mundo afora. Os néons da Barra Funda vão piscar ao som do argentino Barem, um dos DJs do conceituado selo Minus, do papa Richie Hawtin. Já o vizinho dos puteiros da Augusta receberá o francês Pilooski, que deve misturar rock, disco e outros estilos em seu set (aliás, o som desses DJs está cada vez mais inclassificável!).

...MENINAS Depois de anos com poucas opções e muito marasmo, a cena lésbica paulistana voltou a empolgar. E a grande responsável por isso é a festa Chá com Bolachas, que passou a ter, no calendário das garotas, a mesma importância que a X-Demente um dia teve para as barbies. Com som eclético e descompromissado, meninas lindas e carão zero (o slogan já diz: "bolacha murcha não entra!"), o fervo é total e atrai até alguns meninos mais animados para o Gloria, nova sede do projeto. Nesse sábado, em que a residente Barbie da Silva vai comemorar seu aniversário, a atração da festa é a banda Cansei de Ser Sexy, atacando num DJ set.

...DESCAMISADOS A "gastura" pós-Carnaval já passou e a The Week voltou a bombar como sempre. No sábado a noite Babylon recebe o lindinho Mor Avrahami, mais um nome que desponta da cada vez mais hypada cena tribal de Israel. E, no domingo, para aproveitar o finzinho do verão, a casa faz mais uma edição da Nova Pool Party, com o DJ aniversariante Morais, mais Vlad e Renato Cecin. E, na Semana Santa, a filial carioca vai testar uma idéia nova, que eu conto no próximo post.

...GUERREIROS Quem vive com os dois pés plantados na jaca conhece bem a maratona eletrônica Sunday Away, que o George Actv (do Paradise, lembram?) promovia um domingo vez por mês no Tostex, das 10h até meia-noite (com direito a chorinho). Agora, o projeto migrou para o Vegas, onde passou a rolar duas vezes por mês, das 18h até as 3h de segunda-feira. Nesse domingo, tocam André Juliani, Pil Marques, Gláucia ++, George Actv e o convidado Dokser (Barcelona), entre outros.

quinta-feira, 13 de março de 2008

50.000 vezes Thiago

Hoje este blog completou a marca de 50.000 acessos. Nunca fui de ligar muito para números, ficar controlando nível de audiência, que países estão me acessando ou quais textos foram mais lidos. É lógico que receber atenção faz bem ao ego de um blogueiro (quem gosta de passar despercebido?), mas sempre preferi qualidade a quantidade: menos leitores, mas fiéis, e comentários com conteúdo, que acrescentem aos textos e enriqueçam a discussão. Mesmo assim, acho que esse feito tem um valor simbólico e merece ser festejado.

Fazer blog é dar a cara para bater. Ainda que não mostre o rosto, você está ali de peito aberto, se expondo nos seus textos. E vai receber todo tipo de resposta, positiva e negativa. Nisso se incluem não só críticas construtivas, mas também gongos absolutamente gratuitos e, conforme o caso, até ataques pessoais - protegidos pelo anonimato da internet. Quem se propõe a construir algo sempre desperta reações de despeito e até inveja, que são da própria natureza competitiva do homem. É preciso saber lidar com tudo isso, porque faz parte do jogo. E lembrar que não dá para agradar todo mundo.

Mesmo com todos esses senões, blogar também tem suas compensações. A primeira delas está no simples prazer de escrever, abrir uma janelinha na rotina e fazer algo que você quer, mas não precisa. Além disso, é muito gostoso conhecer pessoas novas, que pensem igual ou diferente, e eventualmente ver boas amizades nascerem. Sem falar que as próprias críticas fazem a gente manter a humildade, lembrar que não é o "dono da verdade" e ainda tem muito o que aprender, sempre. No final das contas, não dá para levar tudo tão a sério. Isto é um blog. Se o prazer acabar, ele terá perdido a razão de ser.

Aos meus leitores, meu muito obrigado pelo carinho, pelo prestígio e pela amizade!

domingo, 9 de março de 2008

... e dez anos de cha-cha-cha!

Como eu ia dizendo no post anterior, foi em 1998 que eu troquei a esfiha pelo kibe e comecei a freqüentar a noite. Mas não foi só na minha vida que esses dez anos trouxeram transformações. Quem olhar para trás e comparar o nosso mundinho de hoje com o daquela época verá que muita coisa se alterou, entre padrões de beleza, hábitos sexuais, modismos e costumes - isso sem falar da maior visibilidade que os gays conquistaram na mídia e na sociedade. Nesse meio tempo, o modo de se fazer noite gay também mudou.

A primeira grande diferença que salta aos olhos: há dez anos atrás, os gays paulistanos iam a bares, para ver e serem vistos. Na rua da Consolação, antigo epicentro do babado, o Pittomba, o Papparazzi, o Garden e o Allegro marcaram época como concorridos pontos de encontro e ferveção. Mas esses bares não deixaram sucessores que cumprissem o mesmo papel: o de lugares para beber, ouvir música, dar pinta e paquerar, num ambiente menos mega e mais intimista do que o de uma boate. O L'Open (dos antigos sócios do Allegro) até poderia chegar perto, se não fosse tão escuro (o ambiente não favorece os contatos visuais) e tão parado (afinal, é um bar-restaurante, onde todos ficam sentadinhos nas mesas). Sem falar que o crème de la crème dos homens bonitos simplesmente não freqüenta o lugar - alguns até vão ao Ritz, mas esse é um lugar que não se assume como bar gay (tanto que chegou a pedir que os casais gays não se beijassem lá dentro). Não existe mais o hábito de bater perna na rua e zanzar por bares antes da balada - em vez disso, as pessoas passaram a fazer "esquentas" (ou chill ins) na casa dos amigos.

Em relação às boates, é nítido que o modelo "anos 90" praticado em lugares como a Gent's, a Disco Fever, Mad Queen e a SoGo foi deixado de lado. O som era escancaradamente pop, com direito a muito vocal, hinos clássicos como "It's Raining Men" e remixes mínimos (como em "Feel It", o grande hit das pistas em 1998). Apresentações de drag queens e go-go boys tinham papel de destaque - nas casas do então "rei da noite" Sérgio Kalil, a música era interrompida e as pessoas paravam de dançar para ver os shows. O mesmo acontecia na Le Boy, no Rio. Uma certa inocência pairava no ar. Drogas? Só dentro do banheiro e, ainda assim, nas mãos de uma meia dúzia de pessoas (os "drogados", que horror!), que davam seus tirinhos de pó. Em geral, fazia-se mais sexo (e usava-se mais camisinha).

Com a ascensão da festa X-Demente, no início desta década, a cultura barbie explodiu no eixo Rio-São Paulo. Os anabolizantes e as drogas sintéticas mudaram completamente a cara das nossas pistas. O som ganhava um componente eletrônico crescente, com DJs deixando de ser funcionários anônimos e ganhando importância e notoriedade. A B.A.S.E. foi o primeiro clube a viver essa transição; em 2001, Sérgio Kalil abriu a Level, consolidando o formato em São Paulo. Mais tarde, a The Week daria o arremate final à fórmula, inaugurando um novo padrão de infra-estrutura e serviço e podando as referências caricatas que haviam se tornado datadas e cafonas - os shows que Kalil adorava. Afinal, ninguém mais queria saber deles: na nova ordem da noite, o que importava era dançar sem parar, para a droga "bater". Pegação? Enquanto só se tomava ecstasy, todo mundo ficava "fofo", se beijava e fazia trenzinho - 2001 foi o "verão do amor". A chegada do K e do GHB significou mais loucura e menos sexo: as pessoas se distanciaram umas das outras, em viagens cada vez mais individuais - que, não raro, terminavam com elas voltando sozinhas pra casa.

Muitos embarcaram nesses novos tempos com os dois pés e sem olhar para trás. Mas outros tantos não se identificaram com as novidades e sentiram falta de espaços mais sadios e relaxados, onde pudessem conhecer gente nova à moda antiga: olhando no olho, abordando, conversando, seduzindo. Para essas pessoas, que se sentem deslocadas em meio à ditadura do corpo e ao hedonismo químico, a salvação veio com a Cantho, onde a diversão funciona da mesma forma que numa Gent's ou Disco Fever. E as bibas iniciantes, que ainda não seguram a onda de uma arena cheia de touros ensandecidos como a The Week, podem escolher entre a Tunnel e a SoGo, que pararam no tempo (se bobear, a Tunnel ainda toca "Uh La La La" da Alexia), ou a Bubu e a Flex, espaços mais atualizados, com freqüência mista e clima leve.

O mais curioso, porém, é que existe uma boate que consegue agradar aos baladeiros da "moderna" geração TW sem perder os laços com a tradição e o passado: a Blue Space. O casarão azul da Barra Funda sobreviveu ao tempo sem se desvirtuar e, sobretudo, sem deixar de lado os shows, que sempre foram sua marca registrada. Não é para menos: suas superproduções musicais, com performances e figurinos tão extravagantes quanto impecáveis, e seu carismático elenco de drags, com esquetes teatrais ágeis e engraçadas, conseguiram cativar até mesmo aqueles que habitualmente não gostam de shows. Mesmo sabendo que tem em mãos uma fórmula consagrada, o lúcido dono da Blue, Victor Sofredini, faz sua parte para manter a longevidade da casa: foge de intrigas com a concorrência, investe em um potentíssimo sound system e mantém seus DJs atualizados musicalmente. O resultado são 12 anos de casa cheia - que serão comemorados hoje às 16h00, com a tradicional partida de futebol entre as drags e os funcionários machos da casa, seguida pela matinê mais querida da cidade. Não é fácil manter-se em alta por tanto tempo em uma cena ávida por novidades como a paulistana. Parabéns à Blue Space!

quinta-feira, 6 de março de 2008

Dez anos de beijo na boca...

O meu processo de descoberta da homossexualidade foi bastante gradual. Com 17 anos, percebi que sentia algo diferente por um certo vizinho gostosão (moreno, alto, fortão, carioca, ginga safada e cara de bandido), mas não encontrei no meu ambiente familiar a receptividade que eu precisava, naquele momento, para ir lá e ver qual era. Quando vi que aquilo iria dar uma encrenca que eu ainda não tinha condições de enfrentar, enterrei o assunto. Quase dois anos depois, aproveitei um curso de férias na Europa (minha primeira vez completamente sozinho no mundo!) para tentar dar meus primeiros passinhos naquele mundo completamente desconhecido.

A Inglaterra estava apinhada de brasileiros e eu tinha aquelas paranóias típicas de iniciante-enrustido: achava que, se fosse a um clube gay em Londres, algum conhecido iria me ver, a notícia se espalharia e, quando eu voltasse para o Brasil, meu rosto estaria estampado em todas as capas de jornal e eu seria apedrejado em praça pública. Para evitar isso, resolvi que o meu début tinha que ser num lugar mais seguro, e me mandei para a Escócia - em Edimburgo, não haveria o menor perigo de a notícia vazar.

Descobri que o principal bar e a maior boate gay da cidade eram vizinhos. Cheguei ao lugar e fiquei do outro lado da rua, com as mãos nos bolsos, estudando o movimento das pessoas na porta, tremendo naquela noite de verão. Levei mais de meia hora para tomar coragem e atravessar a porta giratória do bar, que era parecida com a do nosso Ritz. Imediatamente, todos os olhares se voltaram para aquele garotinho com cara de assustado. Não agüentei cinco minutos e voei de volta para minha calçada segura.

Restava, ainda, a boate. Claro que não dava para ter a menor idéia do que se passava lá dentro. Imaginei um grande galpão com luz baixa, homens mal-encarados em roupas de couro, jogando bilhar, fazendo sexo na penumbra, correntes nas paredes. Minha cabecinha tratou de construir a cena: eu cruzaria a porta, todas as atenções novamente se voltariam contra mim e, de repente, alguém gritaria: "Peguem esse menino!!! Vamos já iniciá-lo!!!" Dois caras me agarrariam à força, e sabe lá que maldades fariam contra a minha pessoa, talvez me acorrentassem... Fiquei completamente apavorado e fugi correndo da esquina, de Edimburgo, da Grã-Bretanha, da Europa. Sem ter entrado em uma boate gay. No fundo, eu ainda não estava preparado.

Mas as coisas vieram no seu tempo certo, por etapas. Conheci dois caras mais velhos que tiveram comigo uma conversa muito esclarecedora, que mudou a minha vida (e em seguida desapareceram, como se fossem anjos enviados até mim apenas para me dar aquele recado). Depois, uma amiga fervidíssima do colégio se revelou bissexual para mim. Quando eu finalmente lhe contei sobre a minha indefinição, ela ficou eufórica e acabou virando minha "madrinha". Foi ela que me pegou pela mão e, depois de muita insistência, começou a me levar aos lugares, em São Paulo.

Desci pela primeira vez as escadarias da Tunnel ao som de "I Say A Little Prayer", da Diana King, para encontrar uma cena muito mais inofensiva do que a que eu havia imaginado. Comecei a rir de mim mesmo e do quanto eu havia sido bobo (hoje vejo que aquele lugar era bastante inofensivo mesmo, quase uma "auto-escola da noite gay"). Estávamos no final de dezembro de 1997. Saí com a Corinne algumas vezes (o que não deixava de ser um excelente álibi para minha família), mas aquelas bibas novinhas não me despertavam o mesmo interesse do meu antigo vizinho. Não quis muita intimidade com elas.

Até que chegou o Carnaval de 1998. Sérgio Kalil, o então rei da noite gay da cidade, promovia os concorridos bailes do Basfond, que lotavam um amplo porão na rua Lisboa. São Paulo inteira ia para lá. Eu e Corinne conhecemos dois carinhas na fila, entramos todos juntos, nos divertimos... até que as luzes se apagaram e a música parou, os alto-falantes começaram a gritar "BLECAAAAAAUTE... BLECAAAAAAUTE" e um dos caras me agarrou e me tascou um beijão. Foi assim que eu, finalmente, desencantei e comecei a viver minha vida gay. Era a noite do dia 24 de fevereiro de 1998.

Nesses dez anos, estive em muitos lugares, vivi momentos incríveis e conheci seres humanos de todos os tipos. Alguns deixaram sua marca, outros passaram sem nenhum vestígio, nenhuma lembrança. Conquistei amizades especiais, cada uma no seu tempo e do seu jeito. Tive também que lidar com o lado negativo das pessoas e criar minha casca de defesa. Tudo isso me ajudou a amadurecer, construir minhas opiniões, ver do que eu realmente gostava e qual o lugar que eu gostaria de ocupar no mundo. Hoje, eu me considero um cara bem-resolvido. Não carrego bandeiras, mas também não vivo escondido, muito menos deixo de fazer as coisas que quero. E espero que, daqui a outros dez anos, meu balanço seja ainda mais positivo.

[Esse texto deveria ter ido ao ar no dia 24 de fevereiro de 2008, exatamente 10 anos depois do tal primeiro beijo, mas só tive tempo de terminá-lo e postar agora].

terça-feira, 4 de março de 2008

Três, dois, um... gravando!

Hoje aceitei o convite do jornalista Sérgio Ripardo para participar da coluna Destaques GLS, publicada toda quarta-feira pela Folha Online. Ele me recebeu na Folha de S.Paulo e gravamos uma série de podcasts, que irão ao ar em quatro semanas consecutivas, a partir de amanhã.

Confesso que fiquei meio tenso na estréia. Quando a luz vermelha acende e você sabe que está sendo gravado, dá um certo medo de se atrapalhar e estragar tudo. Eu já costumo falar rápido demais e tinha muita coisa para dizer - mas cada podcast só pode durar dez minutos, cravados no relógio. Por isso, não dava para desenvolver demais as idéias. O Sérgio ia me cortando e, aos poucos, ditando o ritmo da coisa - que não era pensada para ser uma entrevista, muito menos um monólogo, e sim um bate-papo.

No final das contas, foi bem diferente do que eu imaginava, e acabei não conseguindo expor várias idéias que eu tinha na cabeça. Mas foi muito divertido - no quarto podcast, eu já estava bem mais solto e até gostando da brincadeira. Fiquei feliz por ter tido a oportunidade de conhecer o Sérgio pessoalmente e também visitar a Folha. Quem sabe essa história não traga novos leitores pra cá?