segunda-feira, 7 de maio de 2012

Tesão reprimido

Tive a maior boa vontade do mundo para dar uma chance à Virada Cultural. De toda a (extensa) programação, o que mais me chamou atenção foi o "festival gastronômico" armado no Minhocão. A ideia parecia irresistível: chefs de restaurantes renomados venderiam quitutes como steak tartare, polenta com cogumelos e sanduíche de picadinho em barracas, a preços populares (entre R$5 e R$15). Deu muito errado, como todos sabem: a demanda foi bem maior do que os organizadores podiam sequer sonhar. Pensar que míseras 500 porções de galinhada com a assinatura de Alex Atala dariam conta do recado foi de uma ingenuidade atroz. Ainda mais com o interesse cada vez maior do paulistano leigo por gastronomia.

Nem me abalei a pagar esse mico anunciado, mas esperava que durante o domingo as coisas fossem mais calmas, com o movimento diluído ao longo do dia. Cheguei com dois amigos às 14h30 e mal dava para se movimentar pelo Minhocão, que estava completamente abarrotado. Filas indianas impensáveis serpenteavam em frente às barracas. O caos. Ficamos quinze minutos e acionei um plano B que salvou o dia: o Bar da Dona Onça, que também estava lotado, mas recompensou a espera com uma comida infinitamente superior à das outras vezes em que eu havia estado lá.

Enquanto cruzávamos o Centro até o Copan, percebíamos a dimensão que a Virada havia tomado. Qualquer atração atraía multidões, indiscriminadamente; não dava pra chegar perto dos palcos. As pessoas estavam ávidas por qualquer coisa que lhes fosse oferecida. São Paulo é uma cidade privada; os lazeres e prazeres são praticamente todos privados, e se celebra muito pouco o espaço público (ao contrário do que acontece no Rio, e nesse sentido não estou falando apenas de praia). Quando se acena com a menor migalha que seja, nota-se o quão absurda é a demanda reprimida que temos, de tudo. Uma estação de metrô é inaugurada e, em menos de doze meses, já atinge a saturação (a Paulista já superou a Sé). É muito depressa. E como explicar o inchaço da Parada Gay, tomada de assalto por uma multidão que, em boa parte, não está ali para apoiar a causa LGBT? São pessoas que veem no evento uma rara oportunidade de lazer grátis, com música e bebida barata. Qualquer coisa que vier é lucro. Se fizéssemos três Paradas e três Viradas por ano, certamente todas elas lotariam. Em São Paulo, estamos todos famintos, à espera de pedaços de galinhada.

2 comentários:

Lucas disse...

Hahahahaha adorei o final.

deco disse...

Tb entramos nesta roubada. E pior,estávamos de bicicleta no Domingo. Estou preparando a verdadeira galinhada do Atala.Demanda mais de 50 horas entre salmoura,marinada e cozimento.Obviamente não foi esta a que foi servida. Cheguei a ver uma caixinha e o que vi foi uma pedaço pálido de galinha em cima de um arroz branco. A do Dalva e Dito é bem "morena" com arroz de pequi,quiabo à parte e pirão. Nada a ver com o que foi servido. Não caio mais nesta cilada. Quanto à Virada eu e Carlos a acompanhamos desde quando ela não reunia + de 5 mil pessoas na São João.O crescimento foi exponencial.Este ano melhorou muito no quesito limpeza.A região do Arouche chegou a ficar + limpa que em dia normais.Quatro anos atrás vimos Cesaria Evora no palco São João.Por uma hora fui o ser humano mais feliz da face da terra.
A demanda represada por cultura é imensa. Hj em dia até concerto de violoncelo lota o Municipal semanas antes. A nova classe C não quer só comida. Ela quer diversão,arte ,ballet e o que mais vier.Se for de graça ou barato então....