quarta-feira, 30 de julho de 2008

Trocando o certo pelo desconhecido

Existem duas maneiras de viver a vida. Alguns se prendem as primeiras descobertas e referencias e optam por se manter sempre em caminhos jah conhecidos, fugindo dos riscos. Jah outros preferem expandir os horizontes e se arriscar por novas trilhas, novas escolhas. Quem se encaixa no primeiro grupo leva uma vida segura e se contenta com a dose de felicidade e recompensa que recebe sempre daquela mesma maneira, sem novidades. Jah quem faz parte do segundo grupo pode ateh pagar o pato por algumas decisoes, mas tambem tem o gostinho unico de descobrir novos sabores - e ter algumas excelentes surpresas.

Trocar Paris por Berlim foi como abandonar o calor do utero materno para se aventurar num mundo desconhecido. Na capital francesa eu jah sabia de cor e salteado o que iria me acontecer. Jah conhecia bem a cidade - e sabia que gostava muito dela. Em Berlim eu teria que comecar minhas descobertas do zero, sem uma rede de amigos que quebrasse meus galhos (consegui apenas o contato do amigo de um amigo meu, e ainda assim era alguem com quem eu nao tinha a menor intimidade).

De Berlim, tudo o que eu sabia eu tinha lido em algumas reportagens em revistas de turismo (bem poucas, porque esse nao eh um destino muito explorado pelos brasileiros). Da Alemanha, as referencias que eu tinha eram as da viagem "a jato" que eu tinha feito em 1996, quando passei por Frankfurt, Koln/Colonia e Freiburg. Naquele meu primeiro contato, minha simpatia pelo pais foi muito pequena.

Se o espanhol eh um idioma feio mas facil e o frances eh uma lingua bela mas arisca, o alemao nao se salva em nada: tem uma sonoridade horrorosa e eh dificilimo (menos pra Lindi, que arrasa). Com o agravante de que eh falado apenas na propria Alemanha, na Austria (oh!) e em um pedacinho da Suica, que jah eh um pedacinho de terra (ou seja, aprende-lo eh o mesmo que comprar um celular que soh pega no Piaui, Sergipe e parte de Alagoas). Nao tenho pela cultura alema a mesma curiosidade que tenho pela cultura francesa. Para completar, ao contrario do que acontece com outras culinarias europeias, eu nao tenho o menor interesse em expandir in loco o meu repertorio de comida alema - os pratos que eu saboreio nos restaurantes especializados em Sao Paulo jah me sao mais do que suficientes.

Quando saio de casa para conhecer um lugar novo, jah vou predisposto a gostar de tudo. E quem incluiu Berlim no roteiro fui eu. Mesmo assim, tendo saido do feitico parisiense, a primeira impressao que tive da cidade nao foi exatamente empolgante. Enquanto Paris eh praticamente uma cidade cenografica, Berlim nao tem um lado monumental tao evidente, muito menos o mesmo charme da Cidade-Luz. Ainda sem me aprofundar nas atracoes de Berlim (soh fui fazer os passeios turisticos alguns dias depois), eu vivi a sensacao de estar numa cidade alema - uma sensacao que jah me era familiar e que nao me agradava muito.

A coisa comecou a mudar - e mudou radicalmente - quando eu aluguei uma bicicleta e decidi sair sem rumo. Berlim pede por isso. A cidade eh inteiramente plana e, nos trechos em que nao ha ciclovias (e ha muitas), as bicicletas dividem a faixa da direita com os carros, em pe de igualdade. Isso significa que possuem os mesmos direitos (voce nao eh uma mosca a ser eliminada, mas um veiculo como outro qualquer) e deveres (o sinal vermelho tambem vale para voce, que deve parar antes da faixa de pedestres, como um carro). Nessas andancas sobre duas rodas, pude ver uma Berlim mais agradavel, humana (bem menos muvucada e mais receptiva do que Paris), com parques, areas verdes e bairros tranquilos. Finalmente consegui juntar as pontas e ter uma visao de todo da cidade, um entendimento que eu considero fundamental.

Mais do que isso: soh com uma bicicleta eu comecei a achar lugares bacanas e descolados, que nao estao enfileirados numa mesma "rua hype", mas sim dispersos, como tesouros que precisam ser descobertos. Enquanto o oeste da cidade sempre foi puro capitalismo, com direito ateh a uma "Champs-Elysees berlinense" (a avenida Kurfustendamm, ou Kudamm para os intimos), os bairros da antiga Alemanha Oriental tiveram uma modernizacao bem mais recente (apos a queda do Muro) e bastante peculiar. O Mitte foi alcado a condicao de novo bairro cool da cidade, e aos poucos tambem foi se tornando mainstream (vide a chegada de lojas como Diesel, Replay e G-Star). Jah Prenzlauer Berg foi tomado por artistas e intelectuais e modernizado pelos proprios moradores, de uma forma menos agressiva: parece um Leblon sovietico.

Agora, Berlim me conquistou mesmo de vez quando finalmente cai nos lugares certos, os tais "bafos" de que falei no post anterior (cada um deles vai merecer um post, mas soh quando eu estiver de volta ao Brasil). Se no final das contas o saldo de Berlim foi mais do que positivo, e hoje eu posso dizer que gostei da cidade e recomendo, eh justamente por causa desses babados fortissimos que eu pensaria em repetir a dose e voltar para lah, mesmo com tantas outras cidades europeias para descobrir ou revisitar.

domingo, 27 de julho de 2008

Um shalom rapido

Estou em Berlim ha exatamente 72 horas. E ainda nao visitei nenhuma atracao turistica. Nem mesmo o Portao de Brandemburgo, o simbolo da cidade (que eh tipo a Torre Eiffel ou Cristo Redentor de Berlim).

Sabem o que isso significa? Sim, isso mesmo, acertaram. Bafo. B-A-F-O. Fortissimo.

Agora sao 16h00 de domingo, acabo de sair de uma balada que foi um divisor de aguas na minha vida. Depois de conhecer o fervo de Ibiza, eu achava que jah tinha visto tudo. Bem... acho que eu estava errado.

Eu poderia aproveitar esse momento totalmente "off my face" para escrever a respeito do que vivi nessas horas berlinenses. Seria um depoimento autentico, com a vantagem de que ele captaria o momento, no calor dos acontecimentos. Mas acho que eu nao conseguiria chegar ao final do post. Nao... na verdade acho melhor estar 100% sobrio para vasculhar os meandros da lingua portuguesa e caprichar no texto, para descrever o assunto do jeito que ele merece. Talvez daqui a uns dias... talvez soh em Sao Paulo. Vamos ver. Por enquanto, vou me limitar a respirar fundo, contar ate dez e refazer o caminho deste internet cafe ateh minha "casa", ou pelo menos algum lugar seguro. Je crois que c'est suffi pour l'instant. Auf wiedersehen!

quinta-feira, 24 de julho de 2008

Paris e eu mudamos

Em fevereiro de 1996, Paris era apenas um amontoado de atracoes turisticas grudadas em uma cidade toda lindinha, com um rio no meio, gelada e cinzenta como todas as outras capitais da Europa. Era meu primeiro contato com o Velho Mundo, presente que ganhei da minha mae pelos meus 18 anos. Fizemos uma excursao de 30 dias por 10 paises. Deu para ter uma ideia de onde valeria a pena voltar com mais calma (a Franca e, principalmente, a Espanha, paixao instantanea e o primeiro pais para onde eu me mudaria hoje) e onde nao havia tanta identificacao (a Italia, decepcionante). Mas nao deu para aprofundar nada: foi so uma maratona de fotos em cartoes postais. Olha a Madeleine: FLASH! Invalides: FLASH! Mas perai, o que eh esse tal de Invalides, alguma associacao de apoio a paraplegicos? [na verdade, eh lah que estao enterrados os restos mortais de Napoleao Bonaparte] Ah, nao importa, vamos correndo para a proxima atracao, que o tempo eh curto e o onibus estah esperando.

No ano seguinte, a capital francesa reapareceu no meu caminho. Pela minha aprovacao na USP, meu tio me premiou com um curso de ingles em Cambridge, Inglaterra. Nos finais de semana, eu dava uns pulinhos em outros lugares (Amsterdam, Edimburgo, Brighton, Londres) e, quando o curso terminou, fui passar uma semana em Paris. Eu estava completamente sozinho no mundo pela primeira vez e nao falava nadinha de frances. E no entanto me sai bem, o idioma nao era tao dificil assim - e foi entao que eu percebi que conseguia me virar em qualquer lugar do mundo. Flanando sem rumo pela cidade, fazendo incontaveis correspondances no metro, pude finalmente sentir um pouco da alma de Paris e passei a considera-la um pouco minha tambem. Voltei a me encantar com as atracoes conhecidas, descobri outras - e embarquei para o Brasil com um aperto no coracao. Enfeiticado e sem previsao de volta.

Muita coisa mudou na minha vida nesses onze anos que se passaram, a comecar pela minha propria sexualidade. E desta vez vi Paris com um olhar completamente diferente. Mais maduro, mais sexual, mais adulto. A cidade-luz continua deslumbrante, poetica, linda - mas foi desmistificada. Eh bem menor do que parecia: era inesgotavel, e agora parece caber nas minhas maos. O carao dos parisienses nem eh tao grande assim: em geral, quem eles esnobam sao turistas que praticamente pedem para ser gongados. Mesmo com tanta beleza e opulencia, Paris tambem eh caotica, sujinha e talvez nao tenha uma qualidade de vida exemplar - coisa que um mochileiro de 19 anos, preocupado apenas com a beleza do Champ de Mars, jamais conseguiria enxergar.

Percebi algumas mudancas de 1997 pra ca. Nao eh de hoje que Paris eh o destino mais visitado do mundo, mas a expansao do turismo de massa trouxe mais onibus de turismo, mais cybercafes, mais filas para tudo, muuuuuito mais comboios de japoneses, chineses e coreanos. Deslocou a Mona Lisa para uma sala muito maior no Louvre, onde o caos da multidao que se acotovela nao causa tanto transtorno ao resto do mseu. No Quartier Latin, que sempre teve um charme intelectual-cult por conta da Sorbonne, dos cafes, livrarias e brechos que protagonizaram 1968, varias vielas que saem do Boulevard Saint-Germain foram tomadas por restaurantes e cafes de baixissima qualidade, com paineis amarelos mostrando fotografias esverdeadas de pratos do dia a 10 euros. Claro que Paris ainda tem refugios descolados, boas mesas e boas lojas, mas de repente parece que eh preciso ter mais talento e mais referencias para fugir das armadilhas pega-turista.

Mas o mais legal foi redescobrir os motivos que me fizeram amar a cidade. O D'Orsay ja era meu museu predileto no mundo (junto com o Prado em Madrid), mas agora, aos 30, parece que tenho um pouco mais de sensibilidade para me emocionar com a capacidade dos pintores de traduzir emocoes em fisionomias tao realistas. Tambem passei a dar muito mais valor ao Louvre, que antes me dava preguica e desta vez me tomou uma manha inteira sem choro. Falando frances o tempo todo, o tratamento eh incomparavel, os parisienses te tiram do limbo do turista mediano e te colocam nos bastidores da vida real deles, sem as distorcoes e simplificacoes que teriam que fazer ao traduzir tudo para um "ingles macarronique niveau 1".

Foi uma visita de velhos e novos prazeres. A Fontaine Medecis, dentro dos Jardins de Luxemburgo, ainda eh meu canto preferido na cidade e estava linda, emoldurada por um ceu de brigadeiro, enquanto gente do mundo todo lotava as cadeiras sob o sol. Jah o Marais foi uma redescoberta: minha nova identidade gay me fez enxergar um mundo que eu nao conhecia e que passava batido quando, em 1997, eu ia apenas ver a Place des Vosges e a arte moderna do Pompidou. Um verdadeiro gueto, com tudo o que isso tem de pior e de melhor. Cafes e restaurantes com 100% de frequencia de bibas (alguns codigos locais, mas a maioria eh bem universal). Um submundo do sexo infinitamente mais evoluido, esclarecido, bem-resolvido, que nos faz ver como ainda somos presos a nossa moral catolica tacanha, cheia de culpas, inquisitoria. Em Paris, vc tem espaco para ser o que quiser, gostar do que quiser e fazer o que quiser - realmente nao importa, como nao deveria importar por aqui tambem.

Estamos vivendo avancos inegaveis no Brasil, com a midia tentanto achar uma forma menos estereotipada de tratar os gays, duas revistas engatinhando tentando conquistar o mercado... mas quando eu entro em um lugar como a Les Mots a La Bouche, uma livraria espetacular inteiramente gay, bacanerrima, com muito mais a oferecer do que Tom of Finland e Vogue Homem, soh consigo concluir que ainda estamos na idade da pedra, e que ser gay no Brasil eh se contentar com migalhas, copiar a moda dos outros, tirar a camisa na The Week e esperar o proximo carnaval. Na verdade, como diria Lindinalva, o babado das bilus eh mesmo aqui. Ateh a proxima.

sexta-feira, 18 de julho de 2008

Bye bye Brasil!

Quem melhor do que nós mesmos para saber o que buscamos? Do que gostamos, do que precisamos... aquilo que pode nos fazer felizes? Aquilo que pode nos dar prazer? Aquilo que faz nossos olhos brilharem de verdade? Quem mais, a não ser cada um de nós, é capaz de trazer para perto aquilo que tanto queremos? Realizar nossas vontades, fazer as coisas saírem como esperamos... na hora certa, na dose certa... do jeito que sonhamos?

Quem melhor do que nós mesmos para reconhecer nosso próprio valor, aplaudir nossas vitórias, cuidar com carinho da nossa vida, regar a plantinha que somos para que ela cresça saudável e se torne aquilo que queremos ser? E quem melhor do que nós mesmos para fazer o agrado que gostamos, dar o prêmio que queremos... a recompensa que tanto merecemos?

Pois bem, é chegada a hora de desembrulhar o melhor presente de aniversário que eu ganhei pelos meus 30 anos: um merecido descanso de tudo aquilo que me cerca, num giro pela Europa. Presente dado pelo meu melhor amigo, a primeira pessoa que torce por mim, luta por mim, veste a camisa, vibra e orgulha-se daquilo que sou e do que eu realizo... eu mesmo.

Vou passar quase um mês fora, entre outras paisagens, outras pessoas, melodias, cores, sabores, bossas e brisas. Do jeitinho que eu queria que fosse, com o itinerário e todos os detalhes que eu escolhi. Uma viagem que eu faço não para o blog, ou para os outros, ou para algum trabalho... mas pelo e para o Thiago. E isso faz toda a diferença. Vou fazer apenas o que eu quiser, quando e como eu quiser. Dono do meu tempo, do meu caminho. Do meu destino.

Posso voltar a postar a qualquer momento, mas também é perfeitamente possível que eu me dê um mês inteiro de folga do blog. Sinceramente, não sei o que vou fazer. Nem preciso saber agora. Só sei que tenho um mundo de coisas novas para viver. Àqueles que me acompanham, agradeço pelo carinho de sempre e deixo o meu abraço. Bye bye Brasil!

quarta-feira, 16 de julho de 2008

E viva o segundo round

Quem diria: o Fosfobox, baluarte do underground carioca, se rendeu à house tribal. Das caixas de som do clubinho de Copacabana, acostumadas aos long sets do mestre Maurício Lopes e ao som podreira-juízo-final do DJ Schild, estão saindo os conhecidos gritos e batuques que fazem as descamisadas vibrar.

Não se trata de uma mudança radical no perfil do clube, mas sim de um after hours que começou sem pretensões há três domingos e deu mais certo do que se podia imaginar. O fervo tem rolado forte até duas horas da tarde (!) – isso sem outros fatores que poderiam colaborar, como convidados especiais no som, festonas na noite de sábado ou mesmo domingos chuvosos.

Amigos que foram dizem que há muito não se divertiam tanto e já comparam os tais afters às antológicas manhãs pós-X-Demente, em que a antiga Bunker recebia o rescaldo da festa para um animado "segundo round".

No próximo domingo, tem mais. Mas talvez não seja o melhor dia para sentir o novo clima do Fosfo. Algumas horas antes, a The Week celebra o primeiro aniversário da filial carioca com uma festona, com cenografia de Gringo Cardia (que pretende transformar a pista principal numa selva) e pick-ups nas mãos de Peter Rauhofer (que já é praticamente de casa). A comemoração, que está atraindo as tradicionais caravanas de fora, promete se estender até as dez da manhã. Isso se a casa não der chorinhos e mais chorinhos para os coelhinhos da Duracell de plantão...

segunda-feira, 14 de julho de 2008

O insensível corte da guilhotina

Sites de encontros do tipo Disponível, Gaydar e Manhunt podem ser uma mão na roda para quem quer conhecer gente nova. Há quem ainda insista em ver a coisa de forma meio estigmatizada, como se paquerar na internet fosse coisa de perdedores ou menos aceitável do que caçar na The Week, numa sauna ou no Central Park. Bobagem: quem escreve e acessa os perfis são as mesmas pessoas de carne e osso que flanam pelo mundo real, embora ali algumas dêem uma "carregada na maquiagem". Como em tantas outras situações, a internet só facilita as coisas - pensem em quem mora numa cidade pequena ou, por qualquer motivo, não pode se expor publicamente para saciar suas necessidades sexuais e afetivas.

No meu caso, acho bastante prático fazer a linha "vinde a mim": deixo os perfis online para quem quiser ver, vou fazer outras coisas e, quando volto, é só ver as mensagens dos interessados que estão me esperando. O desgaste é zero e a comodidade não poderia ser maior: você se coloca na vitrine, mas quem se expõe primeiro é o outro, que toma a iniciativa. A você, cabe a confortável decisão de abrir a porta ou simplesmente soar o gongo.

Até aí, tudo muito trivial, provavelmente a grande maioria dos meus leitores sabe bem como a coisa funciona. Depois de um tempo, você assimila as regras do jogo e ele flui sozinho. O lance é que, de uns tempos para cá, comecei a questionar justamente as coisas que para mim sempre foram meio automáticas. Eu recebo uma quantidade mais do que razoável de mensagens todo dia (ou melhor, todos os dias em que fico online). A grande maioria delas, eu descarto de imediato. Não são necessários mais do que cinco segundos para eu acessar o perfil do remetente, formar uma opinião e emitir meu veredito binário: serve ou não serve. E tchau. Próximo.

É claro que existem casos em que o perfil em questão fornece indícios - ou mesmo provas - de que o dono não combina comigo. Escrever não é um dom de todos, mas isso não me faz perdoar marmanjos crescidos que usam o miguxês. Ou o gerúndio. E o jargão de bofe? Completamente desnecessário, brother - na hora de engatar uma terceira, o miado não tardará. Mas os piores são aqueles que estão exatamente dentro do que você não quer, mas ainda assim escrevem, porque não se deram o trabalho de ler o seu perfil primeiro. Gente assim não precisa de uma resposta.

Mas não é esse tipo de eliminação que eu questiono. O buraco é bem mais embaixo: falo de outros que não tinham nada de desabonador, mas ainda assim acabaram no paredão. O fato é que, se o cara não tem uma entre três ou quatro qualidades que me instigam e que eu convencionei achar "sexualmente interessantes", ele não tem graça nenhuma e, portanto, não merece o meu tempo. Não compensa interromper a procura para ouvir o que ele pode ter a me dizer. "Dar chance"? Para quê? Chance é para quem você acha que tem chance.

Quem está no jogo adquire um senso crítico implacável. Uma olhadela de relance numa foto qualquer já é suficiente para que se formem sobre aquele pretendente suposições que adquirem peso de verdades. É nerd. É surfistinha. É pagodeiro reformado. Usa cueca da Adventure. Não tem pegada. Dubla horrores. Não sabe beijar. É meloso. Tem amigos varzeanos. É muito paradão. Meio burrinho. Será que uma imagem diz tanto assim sobre uma pessoa?

Mantive meus perfis online, mas nunca deixei de viver e circular em ambientes reais. E foram essas vivências fora da rede que me fizeram começar a repensar os valores que eu sempre pratiquei virtualmente. No dia-a-dia, em rodinhas de amigos, em situações absolutamente insuspeitas, despretensiosas e sem a menor conotação sexual, conheci e conversei com muita gente diferente que passou pelo meu caminho. E tive algumas surpresas. Pessoas para quem eu não daria a menor bola na internet se revelaram ótimas companhias. De diversas formas. Com bom-humor, com doçura, com inteligência. Ou com uma boa dose de safadeza. Virtudes que as tornaram interessantes - e, em alguns casos, acabaram despertando meu interesse. Algumas até me pegaram de jeito. Gente para quem eu não daria "nada"...

E é isso que tem me levado a olhar para trás e fazer a seguinte indagação: será que todos aqueles que chegaram junto e foram bacanas comigo mereciam mesmo ir para a guilhotina, sem mais nem menos? Será que não tinham mesmo nada de bom a oferecer? Em geral, eles tiveram meu silêncio como resposta. Mas com alguns eu quis ser simpático e respondi, agradecendo e dizendo que nossos perfis não batiam. Como eu sabia que não tínhamos absolutamente nada para trocar? Será que não fui ainda mais antipático dando essa resposta a eles? Por que uma pessoa simplesmente "não serve", será que ela não serve pra nada? As pessoas têm tanta coisa a mostrar além da primeira camada de verniz!

Continuo acessando meus perfis e ficando online na vitrine. E mesmo depois dessas reflexões, ainda descarto a maioria, sem dar explicações. Mas agora sempre me ocorre que posso estar desperdiçando a chance de conhecer alguém que poderia me surpreender. E é isso que tem me feito pensar em desistir da internet. No fundo, ela sempre será palco de julgamentos primários - porque você não se sente estimulado a ir além se não tiver um chamariz imediato (da imagem) muito convincente. Já no mundo real, a pessoa tem a chance de ser e mostrar muito mais, e até de virar a mesa com uma boa conversa, um pouco de jogo de cintura e presença de espírito. Na internet, ela é só mais um perfil, uma entre tantas páginas a serem viradas - por mim e por outras pessoas. Afinal, algo me diz que eu não sou o único que age dessa maneira.

terça-feira, 8 de julho de 2008

Rapidicas

SÃO PAULO Vai jantar com os amigos, mas não está podendo com a espera do Spot e do Mestiço? Uma nova alternativa na mesma região é o Boutique Bistrot, na própria Fernando de Albuquerque, já bem próximo da rua Augusta. O menu curto é ótimo para os indecisos: tem uma carne, um peixe, um frango, um risoto, um sanduíche, uma salada - e só. Gostei do peito de frango recheado de cogumelos com risoto de abóbora, bem servido e por um preço honesto. O ambiente, colorido e com luz baixa, tem jeitão de bar (os drinks são ótimos) e até um pequeno pátio interno (que deve ficar mais gostoso quando o tempo esquentar). Se o povo descobrir e adotar, tem tudo para ser o novo L'Open. Por enquanto, as coisas ainda estão calmas por lá.

RIO DE JANEIRO O bom filho, à casa torna. Meu lugar preferido para jantar no Rio de Janeiro, o Zazá Bistrô, recebeu de volta seu antigo chef, o boliviano Checho González, e está com pratos novos no cardápio. Mas eles não são loucos de tirar do menu os campeões de audiência, como o curry de frango ao leite de coco com legumes orientais, capim limão, gengibre e banana, arroz basmati com damasco e amêndoas (que, salvo engano, foi uma criação do próprio Checho). A simpática casinha verde cheia de plantas fica em Ipanema, na esquina da Joana Angélica com a Prudente, e no andar de cima você come em mesas baixas, sentado em almofadões à luz de velas.

BUENOS AIRES Velho conhecido dos viajantes experientes, o Te Mataré Ramirez não é um lugar qualquer, a começar pelo nome, pra lá de espirituoso. É um misto de restaurante contemporâneo, bar e teatro, e serve comida contemporânea afrodisíaca. Os pratos atendem por nomes impagáveis como "Acariciate, quiero mirarte, acaricia tu sexo señor amado mio" e "Los golpes dentro de mi, esa dulce violencia". Mantendo o bom humor, a programação tem shows de cabaré, monólogos eróticos e até um safado teatrinho com sexo explícito entre bonecos. O lugar deu um upgrade na localização e mudou-se para Palermo Viejo: agora fica na calle Gorriti, 5054.

SALVADOR Não é difícil se divertir na capital baiana: é tudo questão de descobrir qual "o lugar certo" para ir naquela noite. E o fervo do momento entre os só-té-ró-pó-litanos atende pelo nome de Marquês. Instalado num casarão preservado do início do século XX, serve drinks, quiches e comidinhas num ambiente superfofo [foto ao lado]. O povo pede os tragos no balcão, amontoa-se entre as mesas (pensou no nosso Ritz? eu também) ou vai tomar um ar fresco na varanda. DJs cuidam do som eletrônico. Festinhas especiais têm rolado por lá, como a Cocktail, que superlotou a casa no Dia dos Namorados. O Marquês fica na Rua Marquês de Caravelas, 148, na Barra. [Ao meu querido amigo João Figuer, o baiano mais bem-relacionado depois de ACM, Gil e Caetano, obrigado pela dica!]

sexta-feira, 4 de julho de 2008

Nocaute tribal

Não conheço o UltraDiesel até hoje. Quando abriu, o espaço recebeu uma chuva de críticas por conta de falhas de acabamento ("é tudo branco!", "cai tinta em cima da gente!"). Depois, acertou a mão ao apostar nos afters. Aliás, o nível de exigência em termos de ambiente e estrutura para que um after seja considerado bom é bem menor do que num clube - vide o caso do Ultralounge, que como balada de sábado era apertado e cafona, mas como after de domingo era "intimista" e "decadente-chic". Afters costumam ficar melhores mesmo em ambientes menores e mais escuros.

Pois bem, vejam só que fofo esse flyer que recebi por e-mail, de uma festa que rola hoje por lá. Sem grandes firulas ou pretensões, mas transformando um simples back-to-back de dois DJs de tribal em um sensacional duelo de super-heróis. Nunca ouvi o som do Junior Peron (será um descendente cafuçu da Evita?) e tô bem por fora do que o Flávio anda tocando ultimamente. Mas a montagem dos dois lutando boxe é fetiche total. Quisera eu estar no vestiário depois que esses morenos acabassem de se atracar...

quinta-feira, 3 de julho de 2008

Nam Thai, mais um orgasmo pela boca

Ontem foi o aniversário da pessoa mais importante da minha vida: minha mãe. Temos o costume de presentear um ao outro com um bom almoço ou jantar, mais alguma lembrancinha. Quem define o lugar é o presenteado, mas ontem ela deixou a escolha nas minhas mãos. Quando isso acontece, gosto de surpreendê-la com lugares ou comidas que são novidade para ela. Ano passado, por exemplo, ela pirou quando eu mostrei a ela o Green Bamboo, um restaurante vietnamita em Buenos Aires. Confiando que eu daria mais um tiro certeiro, desta vez eu a levei ao Nam Thai, um tailandês que nasceu no Rio e depois abriu uma filial por aqui, no Itaim (na mesma rua de outra paixão nossa, o italiano Due Cuochi).

Eu já tinha ido conhecer o lugar em 2006, alguns meses depois que foi inaugurado. Sempre quis trazer minha mãe, mas ela é meio ortodoxa na cozinha e às vezes é duro vencer seus preconceitos. No caso do tailandês, foi difícil demovê-la da cisma de que todos os pratos levariam frango (ela tem aversão a qualquer tipo de ave), mas enfim consegui. Ela adorou o ambiente e examinamos o cardápio minuciosamente. É uma culinária de temperos fortes, mas eles têm o bom senso de colocar em cada prato uma legenda dizendo o quanto ele é picante (três estrelinhas, só os muito iniciados agüentam). Para abrir o apetite e preparar o paladar, eles servem numa colherinha um tira-gosto à base de frango, broto de feijão e temperos, picante nível 2: no primeiro contato a garganta até fecha, mas logo depois você se acostuma. Não pude deixar de comparar a sensação com outra coisa.

Abrimos os trabalhos com o Mix Dim Sun, com pares de 4 tipos do famoso pastel cozido no vapor, de origem chinesa: filé mignon com curry amarelo, peixe com gengibre, camarão, siri e porco e camarão com broto de bambu. Depois, mantendo o espírito de descoberta, pedimos um mix de quatro entradas. Ela enlouqueceu com a salada de fios de manga verde com truta defumada ("muito diferente, nem reconheci os ingredientes") e eu gostei mesmo dos Goi Cuon, rolinhos-primavera vietnamitas de camarão, broto de feijão e picles de cenoura, envoltos em papel-arroz e mergulhados em dois molhos picantes que se completavam à perfeição (os rolinhos pedidos fora do mix vêm só com o molho de limão; nesse caso, tem que pedir pra trazerem o outro, agridoce). Vieram ainda quatro trouxinhas de frango com coentro (que comi) e dois camarões levemente empanados com alho e pimenta preta (que ela comeu).

Mas foi nos pratos principais que tivemos as melhores surpresas. Ela pensou em pedir o Gaeng Kua Saparood (camarões com abacaxi, leite de coco e curry vermelho), mas ficou com medo das duas estrelinhas do menu e optou por uma preparação mais suave, com leite de coco, capim-limão e curcuma (Kung Ton Kati Kamin). E eu tive outra daquelas experiências gastronômicas únicas com o Ikan Moolee, apelidado de "Malásia". É uma posta de dourado bem macia, marinada em tamarindo, preparada com leite de coco, capim-limão, gengibre, pimenta, castanha-de-caju e curcuma. Leitores queridos, não deixem de ir ao Nam Thai uma vez na vida para comer esse prato maravilhoso, o molho é de lamber o prato de tão saboroso, ainda que delicado. Um dos melhores pratos de peixe que comi até hoje!

Encerramos dividindo um crocante de creme de coco com gengibre, que era tipo um primo-irmão da crème brulée francesa. E agora, enquanto escrevo estas linhas, lá está minha mãe ao telefone, feliz da vida, contando para as amigas cada detalhe do nosso banquete tailandês. Afinal, com quem vocês acham que eu aprendi a gostar tanto assim de comida?

[Obs.: as fotos são de outros pratos, tirados do site, pois esqueci a câmera em casa].

terça-feira, 1 de julho de 2008

Eu quero um Trem-bala de Prata

Depois de quase três semanas infernais entre a cruz e a espada, tudo o que eu precisava era fugir, escapar, respirar, refrescar, renovar. E o empurrão que faltava, quem deu foi um amigão carioca, que resolveu fechar a nababesca suíte Millenium do motel Vip's para uma superfesta de aniversário, no sábado. Resultado: sem planejar nada nem avisar ninguém, embarquei mais uma vez para meu querido Rio de Janeiro.

Num passe de mágica, lá estava eu de bermuda e chinelos, caminhando pelas areias fininhas de Ipanema, os cabelos ao vento (ok, sem cabelos ao vento), um céu do azul mais turístico possível, e aquele monte de machos monumentais aproveitando a praia. A festa foi ótima. E uma amiga muito especial me levou ao Ten Kai, seu japonês preferido, que tem um ambiente lindo e faz um uramaki salmon skin saborosíssimo. Voltei pra casa refeito.

O tal "passe de mágica" só não foi mágico de verdade porque fui de ônibus. As promoções das companhias aéreas que faziam minha alegria tinham acabado e o menor preço que eu encontrei foi de 400 reais por ida e volta com taxas. Acho bem caro para ir ao Rio, sem falar que eu havia acabado de gastar uma grana em Porto Alegre e tinha outros gastos previstos. Com meio Dramin ou um quartinho de Rivotril, tira-se de letra as seis horas de Dutra, é verdade. Mas já está mais do que na hora de providenciarem um transporte rápido e permanentemente barato entre as duas maiores cidades do país. Se o Brasil quiser mesmo sediar uma Copa ou Olimpíada, isso será fundamental.

A primeira idéia que me ocorre: um trem-bala, que percorreria o mesmo caminho feito entre o histórico Trem de Prata, extinto em 1998. A França tem o TGV, a Inglaterra tem o Eurostar, o Japão tem o Shinkansen, a Itália tem o TAV, a Alemanha tem o ICE, até Portugal tem seu Alfa Pendular. Na Espanha, o AVE liga Barcelona a Madri por tarifas a partir de 47,80 euros, em apenas 2 horas e 38 minutos. De avião, gastam-se umas quatro horas, contando check in e os traslados do centro para Barajas e El Prat, que são aeroportos afastados. Já com o trem, basta chegar, comprar o bilhete e embarcar - e as estações são bastante centrais, assim como são a Luz paulistana e a Central do Brasil carioca.

Os trens-bala costumam atingir velocidades entre 250 e 300km/h. Um modelo brasileiro "popular", viajando a meros 220km/h, ligaria São Paulo ao Rio de Janeiro em apenas duas horinhas. É menos do que se gasta das respectivas capitais até Maresias ou Búzios. É quase o que se gasta da Penha até Santo Amaro, ou da Glória até o Recreio. Seria uma verdadeira revolução. Para começar, o caos aéreo em Congonhas estaria terminado para sempre. A Central do Brasil e a Estação da Luz recuperariam o glamour de outros tempos. Nativos de uma cidade poderiam trabalhar na outra sem a necessidade de se mudar. Ou mudariam por opção: paulistas realizariam o sonho de morar num balneário que dá de dez em Santos, e cariocas trocariam os preços estratosféricos da Zona Sul por bairros de nível equivalente em SP.

Com o trecho em torno de 50 reais, seria possível dar uma escapadinha inconseqüente e saciar um desejo inesperado: um dia de sol e mar em Ipanema ou uma tarde de compras na Oscar Freire, voltando a tempo de jantar em casa. Ou uma balada/night na outra capital para ver gente diferente. As fronteiras e o bairrismo dariam lugar a um intercâmbio cultural sem precedentes, com todos freqüentando como nunca o quintal do vizinho. Paulistas enchendo os olhos com as belezas de lá, cariocas comendo as pizzas daqui (sem colocar catchup em cima). Paulistas mais corados e menos relapsos com o próprio corpo, cariocas com vergonha de furar filas. Não haveria desculpa para nunca terem ido conhecer o que há de bom do outro lado da ferrovia. Pinacoteca, Arpoador, Vila Madalena, Santa Teresa, a boa mesa paulistana, os melhores botequins cariocas, a Benedito e o Coqueirão, o Ibirapuera e o Aterro, domingos batendo perna na Paulista ou no calçadão, as gatinhas branquinhas daqui e os morenaços saradões de lá, tudo ao alcance de muito mais gente. Um dia, chegaremos lá.