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Minha primeira missão como "foca" do Curso de Jornalismo do Estadão começou às 9h30 da manhã do último sábado, em plena Praça da Sé. Eu e meus 29 colegas encontramos um de nossos professores para um rápido giro pelo Centro - que pelo menos metade do grupo não conhecia, já que muitos alunos são de outras regiões do Brasil. Depois do tour de contato, que foi bem pouco esclarecedor, o grupo se dispersou e cada um tinha que achar sua própria pauta e produzir uma reportagem, que seria entregue por e-mail no dia seguinte. Podia ser
qualquer coisa, desde que surgisse no Centro. Decidi investigar como a cidade mais cosmopolita do país estava tratando seus visitantes estrangeiros, a menos de três anos da Copa do Mundo.
Para isso, tirei partido da minha genética calabresa e me passei por um turista gringo - James Hetfield, norte-americano,
nice to meet you. Saí com cara de perdido, pedindo informações básicas (onde encontro um banheiro público? como faço pra chegar na Paulista?) e, como era de se esperar, a maior parte das pessoas não conseguiu interagir comigo. Na feira de artesanato da República, eu apontava a mercadoria e o dono da barraca me mostrava o preço digitando os algarismos no telefone celular. Nas bancas de jornal ou no comércio local, não foi muito diferente. Entre os bares e restaurantes, só lugares maiores, como Almanara, O Gato Que Ri e Bar da Dona Onça tinham cardápios em inglês - e nem sempre garçons que conseguissem se comunicar em outra língua.
Ainda como falso turista, testei um dos Centros de Informação Turística oferecidos pela São Paulo Turismo. O quiosque da República era novinho e a atendente, muito solícita, tinha um inglês bastante satisfatório - com erros de tradução tipicamente brasileiros, é verdade, mas nada que comprometesse seu trabalho. Eu disse que estava caindo de paraquedas na cidade e não tinha ideia do que fazer e ela, paciente, me deu explicações por quase uma hora. Ponto para ela. Quando pedi que me recomendasse uma boa balada, ela me disse para pegar a linha 4 (amarela) do metrô e o trem da CPTM até a Vila Olímpia - "os lugares de música eletrônica estão todos nessa área", explicou, desenhando um grande quadrado no mapa. Gafe dupla: a linha 4 não opera nos fins de semana, e a Vila Olímpia deixou de ser conhecida pelas baladas há
muito tempo. Imaginei como um gringo desavisado ia pastar no meu lugar, andando desenganado pelo bairro. Quando perguntei sobre restaurantes, ela se limitou a dizer "Caminhe pelos Jardins, estão todos lá". Ah, tá.
Depois disso, me despi do personagem e saí à caça de turistas gringos para entrevistar. Queria saber como estavam sentindo a recepção e também suas impressões sobre o Centro. Cruzei com gente da Espanha, Holanda, Alemanha e até Nova Zelândia. Todos reconheceram que faltava gente que falasse inglês com eles, mas boa parte já tinha se preparado psicologicamente para isso, e alguns até carregavam aqueles livrinhos de português para viagem. Apesar das falhas de comunicação, a
buena onda do brasileiro acabava pesando a favor na avaliação. Em relação ao Centro, atrações como o Mercado Municipal e a Pinacoteca agradavam, mas não faltaram comentários sobre a sujeira, os mendigos e o cheiro de urina em alguns lugares. E pensar que, antes da revitalização, a coisa era muito pior...
Terminei minha apuração conversando com os funcionários de alguns hotéis da região. Eles contaram que o eixo Paulista-Jardins ainda é o preferido pelos turistas, mas o Centro também tem uma clientela cativa, pela própria posição geográfica "perto de tudo", pelo fácil acesso à rede de metrô e pelos preços mais em conta. Quando perguntei se achavam que a cidade estava preparada para receber os turistas para a Copa, ouvi críticas das mais variadas, e uma delas chamou minha atenção. "Se uma simples feira de negócios como a Couromodas esgota os leitos da cidade, e obriga os visitantes a dormir em Santo André, Guarulhos e Itaquá, como será com os milhares de torcedores que virão ver os jogos?", perguntou a recepcionista do Marabá. Pelo visto, o buraco é mais embaixo do que eu pensava - e ainda temos muita lição de casa pela frente.