quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Rapidinhas gastronômicas

A COCOTA DO BAIRRO Esqueça o que você já ouviu sobre "restaurantes de bairro". Apesar de estar escondido no Ipiranga, fora dos holofotes da badalação, o Nico Pasta & Basta não faria feio se estivesse em plena rua Amauri. O ambiente projetado por Roberto Migotto é belíssimo, com mesas dispostas em torno de um átrio iluminado por uma espécie de clarabóia. O menu, de sotaque italiano, tem massas artesanais como o pappardelle com ragu de filé mignon (tem massa mais apetitosa do que o pappardelle?), além de risotos, polentas e carnes - o stinco de cordeiro com risoto de ervas é sensacional. Ótima sugestão para dar uma cara diferente ao seu almoço de domingo - depois, é só dar um giro pelo Parque da Independência para fazer a digestão.

ONDE A ONÇA BEBE ÁGUA Não é de hoje que a revalorização do Centro paulistano devolveu ao Edifício Copan o status de "cult". Quem tem ajudado a trazer buxixo ao sinuoso edifício de Oscar Niemeyer é o Bar da Dona Onça, que virou queridinho da crítica especializada e dos modernos ao propor releituras de pratos clássicos brasileiros, em clima de boteco estilizado (vide os motivos felinos na roupa dos garçons e no cardápio). Confesso que esperava muuuuito mais do picadinho, mas fiquei boquiaberto com o stinco de leitoa caipira com feijão tropeiro e couve refogada. Como diria meu finado pai, é "batuta"! Isso sim é comida brasileira contemporânea. De sobremesa, o pudim já entra no ranking dos melhores da cidade. Só não vá esperando fazer economia. Os preços da casa estão à altura do seu hype, com pratos de R$40 ou mais, o que significa uma conta que chega fácil a R$100 por cabeça.

MUITO ALÉM DO MIOJO No meu último post sobre comidinhas cariocas, dei a entender que o Brasil não tinha casas especializadas em macarrão oriental. Tem sim: um bom exemplo é o Lamen Kazu, um autêntico noodle bar que fica no Largo da Pólvora (Liberdade) e está sempre cheio. Uma boa pedida para quem quer ir além do sushi e explorar outros terrenos da cozinha japonesa. Outro lugar de que tenho gostado muito é o Sobaria, na Vila Mariana, uma casa dedicada à cozinha do... Mato Grosso do Sul. Isso mesmo: por conta de uma imigração maciça de japoneses da ilha de Okinawa, o sobá tornou-se a comida mais típica de Campo Grande, onde é consumida nas ruas e em todo lugar, inclusive como prato-de-resistência das bees na saída da boate. Feita de trigo sarraceno, a massa vem num reconfortante caldo de shoyu e gengibre, com cebolinha e tiras de lombo e omelete. Uma delícia - por apenas R$20 no Sobaria.

THE AMERICAN WAY Uma boa surpresa deste ano que está acabando foi o 210 Diner, em Higienópolis. Depois do francês Ici Bistrô e do italiano Tappo Trattoria, o chef Benny Novak resolveu abrir uma terceira casa, desta vez para servir especialidades da cozinha dos Estados Unidos. Não espere o clima adolescente de casas como Friday's e Outback: 0 210 é mais low profile, quase minimalista. O cardápio é variado e tem preços diferenciados (ligeiramente menores) no almoço. Entre os hambúrgueres, recomendo o piggie burger, coberto com uma saborosa costelinha de porco desfiada em molho barbecue. Se quiser algo mais leve, não perca a omelete, que põe a do Ritz no chinelo. Você escolhe os ingredientes - a combinação de cogumelos, queijo de cabra e molho pesto é simplesmente fodástica.

ÁRABE NADA CLICHÊ Até curto comer uma esfiha benfeita de vez em quando, ou mesmo fazer um pratinho saudável de kibe cru com tabule. Mas acho restaurante árabe/sírio/libanês um programa meio boring. Não me anima a ideia de gastar nisso o meu orçamento de "comer fora". No entanto, fui ao Saj e adorei. Talvez porque não se pareça com restaurante árabe. A casa fica na Vila Madalena e tem aquele "jeitão Palermo de ser" do bairro, com mesas dispostas em uma espécie de terraço interno com muita luz natural. Por uma janela, é possível ver o trabalho de preparação do pão sírio - que chega à mesa quentinho e macio e é um dos pontos altos. Já que está num lugar diferente, saia do lugar-comum e peça a fraldinha cozida na coalhada. Os cubos da carne desmancham no garfo [quer tentar fazer em casa? a receita está aqui].

PARA COMER COM AS DUAS MÃOS Na esquina da Melo Alves com Alameda Tietê, o bar Balcão vem animando os papos-cabeça do povo culturette há mais de 15 anos. Mas só recentemente fui descobrir que, no simpático balcão que serpenteia por todo o salão e dá o nome à casa, é possível comer alguns dos melhores sanduíches da cidade, num pão ciabatta macio como há muito tempo eu não via. Gostei especialmente do Vegetariano, com cogumelos frescos, tomates secos pra lá de saborosos, pesto, rúcula e mussarela de búfala (ingrediente que não consta da receita original, mas pode ser incluído). Tão bom que voltei para repetir a dose já no dia seguinte.

BÍBLIA ANUAL A revista Veja já publicou a edição 2010-2011 do seu anuário Comer & Beber, em São Paulo e no Rio de Janeiro. Na semana em que saem, os guias são vendidos junto com a revista Veja. Depois, algumas bancas de jornal continuam oferecendo o volume separado por algum tempo. É uma fonte de consulta obrigatória, seja pelos restaurantes (divididos por especialidades), seja pelos bares (separados por região da cidade), seja pelas comidinhas (com todas as guloseimas de que você precisava e não sabia). Outras capitais como Salvador e Curitiba também devem estar para ganhar suas edições [aliás, se algum leitor caridoso quiser me mandar os guias dessas cidades, ficarei agradecido!]. Em tempo: o Rio está vivendo sua terceira Restaurant Week, até o dia 31/10. Os cardápios, você confere aqui.

10 comentários:

David® disse...

fodástico é o seu conhecimento gastrômico...nunca vi igual...rs..dá um livro fácil.

beto disse...

ando curioso com o Sobaria desde que soube da sua existência, mas ainda não cheguei até lá...

acho o Saj muito bom, e a relação custo-benefício é positiva. pena que sofre da síndrome do sucesso paulistano: sempre cheio, muita espera.

eu vi que vc adorou o omelete do 210 Diner, rs. Mas, a casa não me convenceu. Achei um diner bem comum, sem nada de mais que me faça me deslocar até lá. e o público me pareceu pós-adolescente (ou seja, não é o meu).

eu gostava muito do Balcão, já fui muito lá. mas aí virei heterofóbico e esqueci dele sem perceber! merece um retorno.

K. disse...

Vale falar que o atendimento do Balcão é bem legal. Já peguei garçons ótimos, que deram dicas de pratos, falaram sobre funcionamento, etc.

Mas prefiro as mesas de cima - o balcão pode ser complicado se as pessoas à frente ou aos lados não têm bom senso.

O dry martini deles é ótimo!

wair de paula disse...

O 210 me surpreendeu de imediato. Serviço impecável, costelinha derretendo na boca, batatinhas sequinhas, tudo muito bom. Dona Onça tem uma panelinha de rabada de comer rezando - super light...
Mas o serviço continua complicado, apesar de simpático. Agora não conheço o Balcão, e como adoro sanduiche, vou dar um pulo a.s.a.p.
tks pela dica!

poor guy fashion victim disse...

Então teve que ler Lobo Antunes, mas pelo que deduzi do seu comentário no meu blog, não foi fácil.Os cus de Judas é um dos primeiros livros do escritor e a partir daí, Lobo Antunes foi explorando e desenvolvendo cada vez mais "plasticamente" o modo de escrever. Embora essa plasticidade seja de díficil leitura para um primeiro contacto à sua literatura, após ter-se percebido o seu esquema de construção, a coisa fica mais fácil e até bastante divertida, porque Lobo Antunes consegue sempre conjugar com o lado mais negro da existência humana uma visão irónica da vida.Veja a coisa como um filme negro e um quadro expressionista, aplicado à literatura.

Depois Lobo Antunes é um personagem complexo enquanto pessoa, vive obcecado pelo facto de nunca ter ganho o Nobel e que em meu entender nunca ganhará, porque lhe falta enquanto pessoa e enquanto escritor uma dimensão política, no sentido de justiça social. É um personagem extremamente narcisíco o que pessoalmente me chateia profundamente, ainda mais que esse egocentrismo acaba por contaminar em crescendo a esta última fase da sua obra.

"O Explendor de Portugal" continua a ser para mim uma das suas melhores obras.

Too-Tsie disse...

Será que o Sobaria melhorou o serviço? Fui logo que inaugurou, e o soba demorou 50 minutos pra chegar, e olha, foi bem decepcionante o sabor, não estava ruim, mas é algo que qualquer descendente nipônico consegue fazer em casa com poucos ingredientes (macarrão soba+hondashi+shoyu+cebolinha picada).

De resto, adorei a sugestão dos lugares, vou procurar conhecê-los :)

João disse...

Boas dicas embora não sejam totalmente válidas para mim, devido minha localização. Mas, vale pelo conhecimento. rs

Beijao

railer disse...

ótimas dicas.

Luciano disse...

Eu acho incrível como você consegue trazer sabor e aroma para o seu texto.
Muque de Peão

Diógenes disse...

A chefe do Nico P&B é amiga minha e ela é sensacional.
Pena que me mudei assim que o restaurante abriu, mas em Dezembro eu volto pra não fazer feio! :)

Que bom que gostou..