domingo, 28 de fevereiro de 2010

Uma noite no Lions, novo clube eletrônico de SP

O circuito eletrônico de São Paulo acaba de ganhar um novo endereço. O Lions Nightclub, parceria entre sócios dos clubes Vegas, Clash e Royal, abriu as portas na última quarta-feira, em uma localização tão charmosa quanto improvável: o número 277 da Brigadeiro, quase na esquina com Maria Paula, já no Centrão (a Praça da Sé fica a apenas 100 metros). A casa ocupa o primeiro andar de um prédio dos anos 50, e o projeto valoriza referências estéticas dessa época. Pé-direito altíssimo, pesadas cortinas de veludo, paredes ornadas por azulejos (de Anita Malfatti, segundo li por aí), sofás de couro, piso de tacos e até animais empalhados dão o tom e recriam a atmosfera dos antigos clubes fechados para cavalheiros, inspiração declarada do sócio Facundo Guerra nesse novo empreendimento. O resultado é de um requinte antiquado, escurinho e intimista – mal comparando, é como se jogassem no mesmo liquidificador o clube Vegas, o edifício Copan, a lanchonete Frevo e o finado restaurante Pandoro.

O bar ocupa o centro do salão principal, dividindo-o em dois ambientes: um deles é uma área “social”, para conversar em pé, e o outro é o lobby, que funciona como uma pista secundária de dança e tem um janelão envidraçado com vista para os prédios do Centro. A tal área social tem ainda dois camarotes vips, construídos sobre pequenos tablados, com sofás de veludo e os tais azulejos de época para enfeitar. Em uma das extremidades, uma porta giratória conduz à pista principal, isolada acusticamente, com projeções sobre os espelhos das paredes, emulando uma espécie de efeito 3D. A parte mais bacana da casa, porém, é a enorme varanda que se acessa pelo lobby, e que revela uma linda vista da região, incluindo a cúpula da Catedral da Sé e as copas das árvores que margeiam a 23 de Maio, avenida que passa ali embaixo.

O conceito de clube de cavalheiros não orienta apenas a decoração. Seguindo o exemplo de antigas casas como o Gallery paulistano, o Lions é um clube para sócios. Mil pessoas estão sendo escolhidas pela casa (“as pessoas mais bacanas da noite, moda, cultura, arte, rock e música eletrônica, entre DJs, promoters, agitadores culturais, travestis, gays, héteros, playboys e undergrounds”, segundo Facundo) para receber um cartão de sócio, que as dispensará do pagamento de entrada e consumação e permitirá que convidem quatro amigos por mês, com a mesma isenção de custo. O acesso a quem não for contemplado com a tal carteirinha não é totalmente fechado: a casa permitirá a entrada de 100 não-sócios por noite, impondo uma consumação mínima entre R$80 e R$120. Quem conseguir colocar o nome na lista de algum DJ amigo pode garfar um descontinho.

Na programação, as quintas-feiras ficam por conta do núcleo de festas Chocolate, com black, funk, soul e afins; as sextas seguem a sistemática do Vegas e alternam vários projetos – incluindo MOO e Buati, as festas que têm feito a cabeça dos modernos do Rio de Janeiro; já os sábados são de responsabilidade da 3Plus, maior agência de DJs do país, que tem em seu casting nomes como Mau Mau, Marky e Renato Cohen. Para surpreender o público, os DJs serão convidados a inovar, tocando estilos que fujam de suas especialidades – Marky, lenda do drum n’bass, pode fazer um set de house, por exemplo.

Fui conferir o Lions anteontem. Magal e Márcio Vermelho recebiam o inglês Tim Sweeney (do selo DFA, o mesmo do Hot Chip e LCD Soundsystem), mais os DJs da festa carioca Moo. Clube novinho em folha, inauguração hypada pela imprensa, cardápio musical de qualidade: fui preparado para uma noite de flashes, brilhos e muita lotação, com direito a drama na porta. Qual não foi minha surpresa ao me deparar com um clube tranquilo e até meio morno – a casa devia estar operando com uns 30% de sua capacidade, quando muito. A maior parte das pessoas ficou dançando na pista secundária do lobby ou conversando na varanda, e a pista principal foi fechada na metade da noite, após ter recebido não mais do que vinte pessoas. Foi uma noite agradável, sem dúvida, mas eu esperava mais – no mínimo, um clube cheio e bombante, animado pelo frisson da novidade.

Talvez meu raciocínio tenha sido condicionado pela minha experiência clubber recente, vivida quase exclusivamente na noite gay, que é muito mais polarizada. Ali, as pessoas devoram as novidades loucamente, e aderem com paixão aos seus clubes do coração – theweekeiros e bubuzeiros são tão fiéis às bandeiras que carregam como corintianos ou palmeirenses o são com seus times. Na noite moderna, isso não acontece tanto: as pessoas transitam mais entre lugares diferentes, e escolhem sua noite muito mais com base nas atrações convidadas do que pelo clube em si. Nesse sentido, o Lions não veio para ameaçar ou desbancar os outros clubes – ele é apenas mais uma opção no circuito, mais uma casa em que bons nomes da eletrônica poderão se apresentar, um lugar para ir dançar ocasionalmente.

E o público? As meninas vieram vestidas de periguete-dos-anos-80, com maquiagem daquela época e cabelo repicado ou com penteado poodle; entre os homens, muito bigodinho de líder sindical, alguns de gravata fininha com All Star e outros tantos com pólos listradas à la marinheiro, tipo aquelas roupas da Staroup e US Top que eu via nas araras da Mesbla quando era pequeno. OK, brincadeiras à parte, na segunda noite de funcionamento após a inauguração, ainda é cedo para traçar um perfil dos frequentadores da casa. Mas achei o público menos gay e carudo que o do D-Edge, menos flashy e fashionista do que o do Glória, menos teenager que o do Clash e, sem dúvida, muito menos despojado que o do Vegas.

Também, com os preços praticados pela casa, não poderia ser diferente: por um suco de uva, cobram-se R$9. Os drinques, preparados por barmen engomadinhos em camisas de listras finas, não são nada generosos e custam a partir de R$24 – além de coquetéis clássicos como Cosmopolitan, Bellini e Kir Royal, há poucas invenções, como o cremoso Saphari (vodka, abacaxi e lima), a R$28. A vodka mais barata, com energético, custa R$29. Não convém exagerar, já que é preciso estar sóbrio na hora de conferir a conta – tive bebidas cobradas em duplicidade e precisei reclamar com a gerência. E eles ainda cobram mais 10% de serviço.

O Lions é uma novidade bem-vinda na cena eletrônica paulistana, que acabou de ganhar o Hot Hot e em breve terá também a expansão do D-Edge. O próprio Facundo Guerra abrirá um segundo clube no Centro, o Pan Am, que terá perfil menos elitista e receberá os projetos remanescentes do Vegas (que fechará as portas). Essa política de clube para sócios com preços salgados será um entrave para a popularização da casa, mas, pelo visto, a proposta é justamente essa: ser um espaço mais exclusivo e para um público mais velho, bem diferente da bombação do D-Edge e das filas nonsense do Hot Hot. Muitas pessoas certamente apreciarão esse diferencial, sobretudo os clubbers da Velha Guarda.

Sabem o que eu acharia realmente incrível? Se alguém alugasse o espaço do Lions para uma festa gay na semana da Parada. Ideal seria um grande after (o clima decadente do Centro e a luz baixa do ambiente dão ao clube uma inegável vocação de inferninho), ou mesmo uma day party de inverno, tipo das 9h às 19h. As bichas ficariam deslumbradas com o espaço, o terraço seria palco de momentos inesquecíveis, e nós teríamos uma dessas raras festas que entram para a história. Fica a dica para os produtores que leem este blog...[Lions Nightclub na noite de inauguração - foto de Paulo Otero]

17 comentários:

Reicla disse...

Adorei a descrição do lugar, com certeza assim que eu tiver oportun idade tentarei ir lá.
Os ambientes como foram descritos são muito convidativos.

Music is my boyfriend disse...

sinceramente nada contra, mas preguicinha da cena...

K. disse...

pela sua descrição, ele não tem um futuro incerto? esses que você descreveu, que não levantam bandeira por balada nenhuma e transitam anturalmente entre algumas, tendem a não gostar dessa mania de lugar vip, pra gente escolhida, etc. Se gostassem, estariam circulando sempre pelo Bar Secreto, que ficou mais para os moços de polo. =)

Thiago Lasco disse...

Leandro, eu acho que os sócios estão apostando justamente nesses "vips" escolhidos por eles. São, afinal, os amigos dos donos, e são gente que eles vão privilegiar porque querem receber na casa sempre, já que acham que eles dão pro clube a cara que eles querem que o clube tenha.

Marcelo Doon disse...

Desculpe Thiago, mas os vips de modernos nao gastam e não sustentam casa nenhuma. Nao dou 60 dias pra essa regra cair e as portas serem abertas a playbas... Quanto a deixarem bichas entrarem prum after, DO-VI-DO! Jamais um dono de casa nova abre para um after pois isso degrada a casa ja que os habitués de after sao patrolas drogadas. É coisa pra clube decadente. Thiago, será mais uma casa-carão que sera consumida em 2 anos e depois vira carne-de-pescoço pois o Centro nao melhora nada. HT quer mulher fresca, mulher fresca quer cenario e carteiras gordas. Ja viu no que vai dar néam...

TONY GOES disse...

O Doon tem razão. VIP não sustenta nenhum lugar. E toda casa que abriu dizendo ser só para poucos e bons acabou sendo só para poucos, e durou menos ainda.

Lembra da Creações Walli? Acho que não, foi no começo dos anos 90, você era de menor. Era ali na Augusta entre Oscar Freire e Estados Unidos, mais ou menos em frente onde hoje é o Mookai (esse sim para poucos e bons HTs, porque é carerrérimo). A casa resolvou instituir uma hostess seletiva, daquelas tipo Studio 54, que ficava na porta dizendo quem estava elegante o suficiente para entrar e quem não. A "Folha" até fez uma matéria de capa na "Ilustrada" com a moça, onde ela dizia quais celebridades mereciam ser barradas. Resultado: afugentou o público. Ninguém sai de casa ante a perspectiva de ser barrado e humilhado em público. A casa fechou em 2 meses.

Don Diego De La Vega disse...

Concordo com Doon e Tony.

Cansado de casas que são exclusivérrimas, chiquérrimas, carésimas.

O pior acaba sendo nem a casa em si, mas o tipo de gente q vai nela: gente q SE ACHA a bala que matou Kennedy...

Tô fora de gente assim. Quem REALMENTE é importante, inteligente ou tem grana não fica indos nesses lugares pra mostrar/exibir/ostentar isso tudo. Quer discrição.

Tava pensando nisso ontem, por causa da publicidade. Recebi uma carta de empresa de cartão de crédito com a frase "Vc é tão especial que nem paga anuidade" impressa. Cansaço. Pra vender dizem que todo mundo é especial, chique, rico, lindo, o último Trakinas do pacote, mesmo não sendo. Preguiça com isso.

No último post mesmo vc estava destacando a questão do povo q se olhava, se olhava e nada. Pois me parece q nesse clube vai ser por aí...mentalidade Studio 54 em pleno 2010 é o fim.

Nessas horas q eu fico felicíssimo de gastar meu dinheiro com outras coisas.

Aliás, depois quero saber QUANTO vc gastou nessa investigação/noite....porque acredito q não deve ter sido pouco...

Thiago Lasco disse...

Não deixo de dar razão a vocês. No fundo, eu tb fiquei pensando por quanto tempo essa proposta "exclusiva" da casa irá se sustentar. Não vejo neles um discurso arrogante-playba, acho até que eles são bem intencionados, estão tentando controlar os detalhes ao máximo para tudo sair ao gosto deles. O problema é que, com tantas restrições, a coisa deixa de ser espontânea, e aí torna-se chata. Será que eles vão conseguir criar o clima bacana que estão idealizando? Como vcs bem observaram, pra virar mais um reduto de metidos, é um pulo.

Doon: sobre o after, a minha ideia não era que a casa começasse um projeto fixo! As próprias bees são enjoadas/limitadas e ia dar um trabalho danado convencê-las a freqüentar um clube nessa região. Eu me referia a uma única festa na Semana da Parada. O espaço é bacana, seria uma locação inusitada e acho que teria um resultado incrível! Especialmente com os DJs certos.

Caju disse...

Vodka a R$ 29?

Sem chances, definitivamente! E olhe que eu nem moro aí! hahahahaha

caio disse...

clube de cavalheiros = clube269.
adoro!!!

beto disse...

pela sua descrição, o hardware (espaço físico) parece ser interessante. mas o software (seleção musical e público-alvo) pareceu o oposto. e pelo visto tampouco agradou o público que deixou a pista às moscas (pista vazia em balada pra mim é sinônimo de fracasso).

essa coisa de "amigos-do-dono + 1000 pessoas interessantes da noite" entrando sem pagar me parece fórmula que só dá certo em lugar pequeno. e, pela foto que vc publicou, não me pareceu tão pequeno.

acho que faço coro com os comentários anteriores que isso não dura muito... e tome lista de desconto depois... pois será que tem tanto sucker modernoso em SP disposto a (e capaz de) pagar uma consumação mínima de R$80-120 para bancar os amigos do dono?

Anonymous disse...

Nossa, esse lugar deve ser cafonééééérrrrrimo!!!! To impressionado com tanta jequice! Realmente, dinheiro lá tem. Só lhe falta o "gramour"!!!!

Lourival Lima Jr disse...

Vale lembrar que a consumação mínima é proibida por lei conforme a Lei Estadual 11.886 e no Código de Defesa do Consumidor. Também é proibido a cobrança de um valor imposto pela casa em caso de perda da comanda, pois a lei também especifica que é obrigação da casa manter o controle de quanto seu frequentador está gastando.

A Veja SP fez uma matéria sobre casas noturnas e comentou sobre essas duas irregularidades. Para os dois casos, a recomendação é procurar o Procon munido do cupom fiscal. Aliás, em São Paulo, o Procon só possui 50 fiscais para dar conta de 50.000 casas noturnas.

Luiz disse...

Preguiça de tudo que é para "gente selecionada". Sinonimo de chatice.
Luiz A.

Anonymous disse...

Mais uma vez voce valorizando "o-lugar-certo-as-pessoas-certas"!!!

Mil pessoas estão sendo escolhidas pela casa (“as pessoas mais bacanas da noite, blá-blá-blá), e VOCE NO MEIO DELAS, CLAROOOO!!!

Obvio que essa atitude de selecionar pessoas seria mal visto por todos, mas mesmo assim voce dá um jeito de se colocar entre os eleitos dessa arca-de-noé-fashion-futil!

Alguem ae ja perguntou: "Aliás, depois quero saber QUANTO vc gastou nessa investigação/noite....porque acredito q não deve ter sido pouco..."

Também acredito que nao foi pouco... se pagou, não foi pouco dinheiro.. se foi convidado de uma das "celebridades", lhe custou mto investimento nesse networking social-com-as-pessoas-certas, que vc tanto venera!!

non-sense não são as filas do hot-hot, mas sim um texto desse tamanho (mesmo descontada a sua prolixidade), para um lugar tão metido a besta!

mais uma vez aguardo a "imparcialidade" do Mr moderador de comments..

Thiago Lasco disse...

Anônimo acima: Desculpe, mas você está falando bobagem. Não me coloco como eleito de coisa alguma. Não fui uma das mil pessoas escolhidas pela casa, nem é isso que está escrito no texto, nem eu endossei essa atitude dos sócios da casa. Você é daquelas pessoas que mal leem o texto e já saem metralhando o autor, porque já tinham uma opinião formada antes da leitura, de forma que o texto em si pouco importa. Pois pode ficar com suas opiniões formadas, tire as conclusões que desejar. Não tem problema: cada um constrói a meu respeito a imagem que quiser, isso não é problema meu. Ah sim, só para satisfazer sua curiosidade, informo que paguei minha entrada normalmente. Queria ver qual era a do lugar, conferi e pronto. Satisfeito?

Anonymous disse...

Eu sou VIP da casa e com certeza a casa se sustenta. Sempre lotada!!! E todos bebem vodka a 29,00.
Quem tiver oportunidade vá conhecer...uma proposta bem diferente que SP estava precisando.