Quando amigos que vão conhecer Buenos Aires nos próximos dias me pediram dicas gastronômicas, percebi que meu roteiro andou mudando e deixou antigos clássicos de lado. O Broccolino, por exemplo, foi meu favorito por décadas, e hoje está em franca decadência, infelizmente. Faço aqui um apanhado dos lugares que mais agradaram nas minhas últimas viagens. Aos que estiverem se aventurando, recomendo cautela especial no trato com o dinheiro. Em tempos negros de inflação e dólares proibidos pelo governo, o risco de receber notas falsas está maior do que nunca. Comprem seus pesos ainda no Brasil.
SORRENTO Não sou lá muito fã de Puerto Madero - lugares caretas e sin onda,
frequência de turistas desavisados, preços acima da média - mas sempre
abro exceção para o Sorrento. A especialidade são pratos à base de
peixes e frutos do mar. Meu favorito absoluto são os Raviolis Neri con crema de gambas:
massa feita com tinta de lula e recheada com creme de salmão e camarão,
servida com molho à base de creme de leite, um toque de vinho, camarão e
ovas de caviar. As mesas externas têm a vista fabulosa do rio que todo
mundo quer, mas o vento pode incomodar e esfriar rápido a comida. Onde: Alicia Moreau de Justo, 410, Puerto Madero.
i FRESH MARKET e i CENTRAL MARKET Depois do renascimento de Puerto Madero, a região do outro lado do rio, chamada de Madero Este, vive um boom
de verticalização e investimentos - em cinco anos, a área estará
irreconhecível. Estas duas casas-irmãs são um misto de empório,
delicatessen e restaurante: dá para comer algo ligeiro nas mesas da
entrada, comprar flores ou um bom vinho, ou então partir para uma
refeição mais elaborada, nas mesas do fundo ou no terraço com vista para
o rio. O menu, versátil, tem sanduíches, saladas e pratos que mudam
periodicamente, como o risoto de ternera (vitela) con champignons y tomates secos. A limonada com hortelã e gengibre e os licuados de frutas com iogurte são sensacionais. Onde:
o i Fresh Market fica no Boulevard Azucena Villaflor, esquina com Olga
Cossetini. O i Central Market fica na Pierina Dealessi, esquina com
Macacha Güemes.
SIPAN A onda nipo-peruana não dá sinal de cansaço em Buenos Aires. Enquanto alguns lugares pendem para a metade oriental, caso do pretensioso Osaka, este aqui abre mais espaço para pratos quentes peruanos. Claro que os ceviches e tiraditos estão no menu, mas não deixe de provar algo como o salteado de arroz com camarões ao molho de tamarindo. A porção é grande e, se complementada por uma porção de Rolls Costa Verde (deliciosos e sem sinal de cream cheese, na foto), serve três pessoas. A carta de drinques é uma atração à parte. Onde: Paraguay, 624, Microcentro (fica escondido dentro de uma galeria comercial, com entradas pela Paraguay e Florida; há uma filial em Palermo, mas essa é um "ceviche bar" e não tem o mesmo cardápio).
CRIZIA Com luz baixa e pé-direito altíssimo, cumpre bem a função de restaurante bacanudo para aquele jantar mais especial. A cozinha tem matriz argentina e acento contemporâneo. Para quem gosta de ostras, as de lá são ótimas. O risoto de langostinos y mascarpone [foto principal] é um arraso absoluto. Os pratos de cordeiro, os ñoquis de queso y ricota gratinados con brie, crema, tomates secos caseros y parmesano e o linguini com caranguejo e creme suave de limão também agradaram. É a casa mais cara deste roteiro, mas os preços não são maiores que os de um bom jantar tipo Carlota. Reservar é fundamental. Onde: Gorriti, 5143, Palermo Soho.
IRIFUNE A ideia de ir até Buenos Aires para comer sushi lhe parece absurda? Pois é, a cidade sempre foi meio capenga nesse quesito, mas finalmente encontrei um japa de responsa para chamar de meu. Na parte de enrolados, eu e minha mãe nos surpreendemos com o equilíbrio de sabores do Tropical Roll, de camarão, manga, kiwi e redução de maracujá com saquê. A cozinha vai bem também nos pratos quentes, com opções feitas na wok, tempuras e ramens. Também escondido numa transversal da Florida, vive cheio e demora para servir a comida, portanto não vá com pressa. Onde: Paraguay, 436, Microcentro.
LOTUS NEO THAI
Muita gente não sabe, mas Buenos Aires também tem sua Chinatown, que
fica dentro do bairro de Belgrano. O Lotus tem tudo o que você espera de
um bom restaurante tailandês: drinques exóticos, entradinhas para
dividir, curries verdes e vermelhos com a picância controlada pelo leite de coco e, para quem não é fã de temperos fortes, deliciosas tiritas de lomo
salteadas com molho de ostra. O ambiente, com paredes pintadas, tem
poucas mesas (algumas delas bem baixas), então é melhor ligar antes e
fazer reserva. Onde: Arribeños, 2265, Belgrano.
EL FEDERAL Intimista e invernal, mostra a culinária típica de outras regiões da Argentina, sobretudo da Patagônia, em interpretações modernas. Uma entrada interessante é o trío de provoletas (de vaca com brotos de rúcula, de cabra com chutney de tomates e de ovelha com cebola e bacon crocante). Entre os principais, o cordeiro patagônico ao Malbec é o hit da casa, e o fantástico cuchinillo (leitão assado durante seis horas em forno de barro, servido com suflê de milho e purê de mandioca, na foto) desmancha ao simples toque do garfo. Onde: San Martín, 1015, Microcentro.
bBLUE DELI Boa parada para um lanchinho entre as compras em Palermo Soho. Não faz a raspberry lemonade incrível do Mark's, mas também não tem a lotação e o atendimento horroroso do concorrente. A pegada do cardápio é saudável, com criativos licuados de frutas, sopas, saladas e sanduíches. Leve para casa os clafoutis (espécie de cookie) de chocolate branco com arándanos (mirtilos/blueberries), perfeitos para quem prefere doces não tão doces. Onde: Armenia, 1692, Palermo Soho.
NUCHA Outro bom endereço para um intervalo calórico em Palermo, tem tortas salgadas e doces, quiches, brownies (deliciosos!), muffins, cookies e, claro, alfajores. Para uma refeição mais substancial, os pratos do dia são escritos numa lousa. A quiche de presunto e queijo é sensacional - leve uma para fazer um lanchinho fora de hora em casa ou no hotel. Onde: Armenia, 1540, Palermo Soho (e outros cinco endereços).
CLUNY Restaurante charmoso e agradável, com menu contemporâneo a preços honestos. O cardápio do almoço é um pouco menor que o do jantar, mas felizmente não deixou de fora o meu prato predileto: o risoto parmesano (de vitela cozida em vinho Malbec com misto de cogumelos). Os ráviolis de cordeiro também valem o confere. Como a cozinha não fecha entre o almoço e o jantar, é uma opção segura para aquele dia de horários desregrados em que você só vai ter fome no meio da tarde. Onde: El Salvador, 4618, Palermo Soho
FILO Não dá para deixar esse clássico de fora. O ambiente festivo e colorido, com música descolada e garçonetes bonitas, e o cardápio de saladas, panini, massas e pizzas lembram muito o Piola. Mas a comida é melhor. Gosto especialmente das pizzas, com massa fina, molho saboroso e bons ingredientes. Boa pedida para jantar sem gastar muito: se os apetites não forem tão grandes ou a noite for terminar em balada, uma pizza média basta para dois e uma grande, para três. Aliás, no balcão do bar, você encontra todos os flyers e guias de bolso de que precisa para se situar na noite portenha. Onde: San Martín, 975, Microcentro.