
Fiquei mais passado com os brutais ataques homofóbicos no Rio (onde três soldados do Exército agrediram e balearam um civil indefeso no Arpoador, e felizmente serão responsabilizados) e em SP (onde, em plena Avenida Paulista, cinco delinquentes de classe média atacaram três rapazes com requintes de barbárie, incluindo golpes de artes marciais e até lâmpadas fluorescentes). Segundo a Folha de hoje, o segurança que defendeu as vítimas relatou à polícia que uma delas foi encurralada, levou socos e chutes na cara e continuou apanhando mesmo após desfalecer. Ou seja, teria sido assassinada se não fosse a intervenção do vigia - que, ao perguntar aos marginais o motivo de tudo aquilo, ouviu: "Porque ele é viado".
Se não há justificativa capaz de endossar um ódio tão sem sentido (nem mesmo a cegueira da religião, como pretendem as nossas tão mal-intencionadas igrejas), episódios como esses parecem estar inseridos dentro de algo maior. Depois de anos de avanço da tolerância e do respeito à diversidade, sobretudo entre as camadas mais esclarecidas, parece que a sociedade resolveu andar na contramão. Estamos vivendo o crescimento de uma terrível onda conservadora, com um recrudescimento do moralismo, da segregação e do preconceito. Como não lembrar do caso da estudante Geisy, que quase foi linchada e currada pelos colegas, e depois expulsa da universidade onde estudava, apenas porque usava um vestido curto? Semana passada, chegamos ao cúmulo de prender um garoto de 18 anos, por ter dado um inocente beijo (!) em outro, de 13 anos - o que certamente não teria acontecido se o beijo tivesse sido recebido por uma menina. No Twitter, mensagens como "mate um viado queimado" se alastram, agrupadas na hashtag #HomofobiaSIM. E o assassinato bárbaro do garoto Alexandre Ivo, de 14 anos, em São Gonçalo (RJ), que foi esquecido em menos de 15 minutos? Tempos bicudos!
Eu gostaria de entender o que está por trás desse rebote reacionário. Talvez a sociedade esteja tão desorientada (o que dizer dos pais dos agressores da Paulista, que passaram a mão na cabeça de seus filhos?) e tão em crise com seus valores, que esse "encaretamento" acabe sendo visto como uma tábua de salvação para preencher os vazios e as inseguranças. Não sei! Alguém arrisca um palpite nos comentários? O que está acontecendo, afinal?
Se há um lado bom em todos esses absurdos, é que existe uma parcela mais lúcida e esclarecida da sociedade que está se indignando e esboçando uma reação. Bem ou mal, o tema homofobia está sendo discutido na mídia e na sociedade com bem mais freqüência do que há, digamos, cinco anos atrás. O simples fato de a motivação homofóbica dos crimes estar sendo explicitada pela imprensa já revela que existe hoje uma preocupação que não se via. É preciso ficar alerta. Afinal, a ignorância e o ódio só se combatem com união, esclarecimento e informação. Até porque nossos algozes também estão articulados: nas ruas, nos templos e agora, mais do que nunca, em Brasília.
Se você mora em São Paulo e quer ajudar a fazer a diferença, apareça amanhã (domingo) no vão livre do MASP, a partir das 15h. O movimento LGBT paulista vai promover uma manifestação de repúdio e reivindicação de providências para o caso dos agressores da Paulista (que foram liberados no mesmo dia, porque a lei assim permite), com caminhada até o local do crime, próximo à estação Brigadeiro do Metrô. Eu também estarei por lá. Mostrar que não toleramos essa atrocidade é o mínimo que podemos fazer. [UPDATE: Considerando que foi divulgada com pouca intensidade e antecedência, a manifestação foi ótima: cerca de 300 pessoas apareceram na Paulista e deram seu recado, de forma muito positiva e tranquila. Inclusive dois dos três rapazes atacados na Paulista deram as caras por lá. Só faltou o segurança-herói aparecer na porta do prédio pra gente homenageá-lo! O único senão foi a apropriação partidária do ato pelo PT e PSTU, que encabeçaram a parada com suas faixas, como se a iniciativa tivesse sido deles. Mas esse tipo de desonestidade já é praxe].