Sábado passado eu resolvi tomar uma overdose de boate gay. Primeiro, fui conferir a reinauguração da Megga; depois, terminei minha noite na The Week. Minha ideia original era escrever um post comparativo, na linha daqueles testes de revista que avaliam dois carros similares de fábricas concorrentes, analisando aspectos como desempenho, consumo, conforto, estilo, espaço interno e porta-malas. Enquanto eu me dirigia para a Barra Funda, minha cabeça já rascunhava os quesitos - pistas, música, bares, área externa, atendimento, público - e a estrutura do texto, que prometia dar um certo trabalho.
Depois que entrei na Megga, após esperar pacientemente pela minha vez na fila (o que pessoas que se consideram educadas sempre deveriam fazer, mas muitas vezes não fazem), acabei desistindo dessa ideia. É que essa segunda visita reforçou minha impressão de que a Megga e a The Week não são exatamente boates concorrentes. A proposta de ambos os clubes parece similar mas, na prática, os públicos são distintos e pouco se misturam. Os clientes da The Week não se animaram com a casa nova: nas duas inaugurações, preferiram continuar fiéis à casa de André Almada. Já os freqüentadores da Megga são seguidores do clã da Bubu - e, na falta da Megga, se aproximam mais da Flexx do que da TW. Claro que existem pessoas que não têm um clube preferido e pulam de galho em galho para variar, mas me parece que são minoria: não consigo enxergar que uma das casas roube o público da outra.
A Megga estava bem cheia. Da primeira inauguração para cá, praticamente nada mudou. A única diferença que percebi foi na área do antigo café: a insólita estufa de coxinhas deu lugar a um sushi bar, bem mais adequado. A pistona continua sendo o grande destaque da casa. Ampla e confortável, é mais clara que a da The Week, o que facilita aquele contato visual prévio antes de abordar o gato. Pena que dessa vez o som estava mal equalizado e estourando, o que não aconteceu na estreia original. No bar central, o número de funcionários era nitidamente insuficiente para atender à demanda - algo compreensível em um clube tão novo, que ainda está fazendo ajustes e treinando seu staff. Nesse aspecto, seria até injusto comparar o atendimento ao de uma casa que vem sendo lapidada há cinco anos. Em geral, essas pequenas falhas não incomodaram, e o clima geral era de alegria. E a decisão de abrir apenas uma vez ao mês certamente contribuirá para manter o público entusiasmado, sentindo-se parte de uma noite especial, não rotineira.
Se eu já tinha decidido não fazer comparações objetivas entre as duas baladas (até porque uma delas é semanal e a outra, mensal), emendar uma na outra me deu uma sensação mais clara de qual delas é mais a minha praia. Achei ótimo poder ver caras novas na Megga - incluindo vários rapazes bonitos, dos baby faces aos cafuçus. E o clima mais happy também me contagiou. Por outro lado, eu considero o espaço físico da The Week insuperável. A pista pode ser mais escura e não tão agradável se você não quiser fritar, mas sempre há a opção de fugir para a bela área externa, e isso não tem preço. Em relação à música, infelizmente o bate-cabelo é onipresente nas duas mas, na média, o som da TW ainda me convence mais - na Megga, o dispensável desenterro de "Chorando Se Foi", do Kaoma, foi a deixa que eu precisava para ir embora dali.
No fim das contas, consegui entender melhor por que o público gay de São Paulo é tão polarizado. Quando cheguei na The Week, senti uma agradável sensação de familiaridade, de encontrar muitos amigos, de estar num espaço conhecido, de ver o cuidado com certos detalhes. No fundo, é isso que faz os gays serem tão fiéis aos clubes que escolhem, quaisquer que sejam: a sensação de estarem em casa. Não acho que a TW seja um "universo perfeito" - para ficar num único exemplo, pagar a comanda é sistematicamente um suplício - mas, entre as opções gays que temos hoje, ela ainda é que mais me agrada. O que não me impede de apreciar o frescor da mudança para um clube com mais leveza e menos carão de vez em quando.
terça-feira, 29 de setembro de 2009
sexta-feira, 25 de setembro de 2009
Rapidinhas do fim de semana
ÔLHA O PASSARRINHO Uma dica para aficcionados por fotografia é a exposição de fotos do francês Henri Cartier-Bresson (1908-2004) no SESC Pinheiros, dentro dos eventos do Ano da França no Brasil. Considerado um dos pais do fotojornalismo, ele fez registros belíssimos de suas andanças pelo mundo, a maioria deles usando uma antiga Leica, câmera alemã que virou objeto de culto. Seus flagras do cotidiano são uma verdadeira aula de enquadramento, composição e sensibilidade. A mostra, gratuita, se estende até meados de dezembro.
UM NEGÃO CHAMADO BASTIÃO Lembram que um passarinho verde cochichou no meu ouvido, há dois meses atrás, que Salvador estava prestes a ganhar um novo clube? A casa, chamada San Sebastian, será inaugurada amanhã, com os convidados Felipe Lira e Eric Cullemberg no som. Fica na Rua da Paciência, a poucos metros do Boomerangue e, a exemplo do já não tão concorrido vizinho, tem três andares e programação variada (apenas o sábado é gay). A novidade vem em boa hora: as bunitas da cidade já estavam enjoadas da Off e quase não saíam mais de casa, o que deixava a noite de Salvador com um certo quê de Porto Alegre. Se a casa agradar, é natural que se torne líder aos sábados, deixando para a Off o posto de melhor opção das sextas-feiras.
MARA OU MICO? E falando em Bahia, alguém aí vai se jogar no festival Heaven & Hell, na Costa do Sauípe? Sei que ainda faltam dois meses (o evento começa em 20 de novembro), mas já era para o burburinho ter começado. É claro que o evento não se destina apenas aos paulistas (até mesmo pela proximidade geográfica, faz mais sentido que Salvador e Recife estejam em polvorosa do que SP), mas a organização certamente também esperava receber muita gente destas bandas, e não estou vendo nenhum tititi em cima dele por aqui. O que vocês me dizem: decola ou não sai do chão?
NUEVOS BOLICHES Outra cidade cuja cena noturna parece estar sacodindo a poeira e dando a volta por cima é Buenos Aires. Depois que o Palacio Alsina deixou de fazer as melhores noites gays da cidade para receber apenas eventos eletrônicos, muita gente que não vive o culto aos DJs não gostou nadinha de ter que se contentar com o Amerika. Chegou aos meus ouvidos que agora há alternativas por lá. Na sexta, o que está pegando é o Rheo Bar, ali no Paseo de la Infanta, dentro dos Bosques de Palermo, onde nos anos 90 funcionava o Buenos Aires News (não entendi se é algo light tipo Sonique ou um clube mesmo). Já no sábado, o boliche gay do momento é o novíssimo Human, que fica perto do Aeroparque (o aeroporto doméstico de BsAs). O blogueiro Gurizão (que está se revelando um ótimo olheiro de beldades) foi e adorou.
A BRANCA E A MEGA Já em São Paulo, a chapa tá esquentando. Amanhã acontece a reabertura da Megga, que prometia ser o segundo grande clube gay da cidade, mas saiu misteriosamente de cena poucas semanas depois da inauguração [que eu descrevi aqui]. A casa abrirá apenas uma vez por mês, justamente para garantir a bombação e a expectativa - na pista principal, Paulo Agulhari prometeu menos bate-cabelo e mais progressive. Enquanto isso, a The Week lançará uma nova festa, Nuit Blanche, com decoração all-white e cenografia especial. Grá Ferreira, que fará seu casamento religioso na mesma noite, sairá da igreja direto para lá e se apresentará de véu e grinalda, na pista principal. No mínimo, vale pela oportunidade única de ver uma DJ tocando vestida de noiva.
UM NEGÃO CHAMADO BASTIÃO Lembram que um passarinho verde cochichou no meu ouvido, há dois meses atrás, que Salvador estava prestes a ganhar um novo clube? A casa, chamada San Sebastian, será inaugurada amanhã, com os convidados Felipe Lira e Eric Cullemberg no som. Fica na Rua da Paciência, a poucos metros do Boomerangue e, a exemplo do já não tão concorrido vizinho, tem três andares e programação variada (apenas o sábado é gay). A novidade vem em boa hora: as bunitas da cidade já estavam enjoadas da Off e quase não saíam mais de casa, o que deixava a noite de Salvador com um certo quê de Porto Alegre. Se a casa agradar, é natural que se torne líder aos sábados, deixando para a Off o posto de melhor opção das sextas-feiras.
MARA OU MICO? E falando em Bahia, alguém aí vai se jogar no festival Heaven & Hell, na Costa do Sauípe? Sei que ainda faltam dois meses (o evento começa em 20 de novembro), mas já era para o burburinho ter começado. É claro que o evento não se destina apenas aos paulistas (até mesmo pela proximidade geográfica, faz mais sentido que Salvador e Recife estejam em polvorosa do que SP), mas a organização certamente também esperava receber muita gente destas bandas, e não estou vendo nenhum tititi em cima dele por aqui. O que vocês me dizem: decola ou não sai do chão?
NUEVOS BOLICHES Outra cidade cuja cena noturna parece estar sacodindo a poeira e dando a volta por cima é Buenos Aires. Depois que o Palacio Alsina deixou de fazer as melhores noites gays da cidade para receber apenas eventos eletrônicos, muita gente que não vive o culto aos DJs não gostou nadinha de ter que se contentar com o Amerika. Chegou aos meus ouvidos que agora há alternativas por lá. Na sexta, o que está pegando é o Rheo Bar, ali no Paseo de la Infanta, dentro dos Bosques de Palermo, onde nos anos 90 funcionava o Buenos Aires News (não entendi se é algo light tipo Sonique ou um clube mesmo). Já no sábado, o boliche gay do momento é o novíssimo Human, que fica perto do Aeroparque (o aeroporto doméstico de BsAs). O blogueiro Gurizão (que está se revelando um ótimo olheiro de beldades) foi e adorou.
A BRANCA E A MEGA Já em São Paulo, a chapa tá esquentando. Amanhã acontece a reabertura da Megga, que prometia ser o segundo grande clube gay da cidade, mas saiu misteriosamente de cena poucas semanas depois da inauguração [que eu descrevi aqui]. A casa abrirá apenas uma vez por mês, justamente para garantir a bombação e a expectativa - na pista principal, Paulo Agulhari prometeu menos bate-cabelo e mais progressive. Enquanto isso, a The Week lançará uma nova festa, Nuit Blanche, com decoração all-white e cenografia especial. Grá Ferreira, que fará seu casamento religioso na mesma noite, sairá da igreja direto para lá e se apresentará de véu e grinalda, na pista principal. No mínimo, vale pela oportunidade única de ver uma DJ tocando vestida de noiva.
quarta-feira, 23 de setembro de 2009
Comida com um pé atrás
Saiu a edição 2009-2010 do Comer & Beber, anuário de restaurantes, bares e comidinhas da Veja São Paulo. Minha mãe, tão ligada em comida quanto eu, manuseou o pesado volume por alguns minutos e depois o encostou, com um certo desinteresse. "Essas indicações são todas compradas. Não acredito mais nelas. A Dulca com o melhor doce da cidade? Pfff!", desdenhou. Quando falei sobre a edição do ano passado aqui no blog, recebi alguns comentários no sentido de que esse guia era "vendido". Para ilustrar seu raciocínio, um deles mencionara que um jurado que era "do ramo" havia indicado o insosso America como a melhor cozinha rápida da cidade.
A indicação de um restaurante como o melhor em uma certa categoria é uma escolha totalmente subjetiva de cada jurado. Mas alguns casos são intrigantes. Na categoria cozinha contemporânea, por exemplo, 9 entre 10 jurados escolheram o Maní, e sua dona, Helena Rizzo, ainda foi eleita a chef do ano. Gosto do lugar - agradável, charmosinho, com um pé no rústico-chique e uma chef linda - mas acho que existe um excesso de babação de ovo e deslumbramento no fato de as (diminutas) receitas serem preparadas com técnicas da vanguarda espanhola (o próprio Ferran Adrià já esteve lá). Pode até ser um dos dez contemporâneos mais interessantes (e hypados) de SP, mas não consigo enxergar nele o cacife de ser uma unanimidade absoluta. [Aliás, meu preferido é justamente o que o jurado dissidente escolheu: o Sal].
Essas desconfianças em torno da crítica gastronômica me lembraram um post que li em um blog especializado, o Que Bicho Me Mordeu, questionando o mérito do guia Josimar Melo (editado pelo próprio, que é crítico da Folha de S.Paulo). O que chamou minha atenção não foi propriamente o texto, mas sim os comentários exaltados de donos de restaurantes sobre Josimar. "Ele leu o cardápio durante 10 minutos e depois escolheu o RODÍZIO! E ainda teve a cara de pau de falar dos pratos à la carte na crítica!". "Novidades não muito bem sucedidas, como o nhoque de beterraba com molho de alho poró, ou de ricota defumada - Nunca servi tal aberração! Escreveu sobre o que não comeu e nem existe!""Ele foi só uma vez ao restaurante, logo na inauguração, mas o guia continuou atualizando e até deu estrelas. Será que ele está terceirizando seu serviço?" "Quem é do meio sabe a picaretagem!" Enfim, bafos e mais bafos.
É preciso saber relativizar o que se lê em uma crítica. Além da questão da subjetividade, existe a própria limitação da avaliação, que não dá conta de ir além de uma primeira impressão. Como bem observou um leitor do blog que eu citei, "na maior parte das vezes, nem 10% de um cardápio é avaliado. Então fica difícil tirar conclusões justas sobre o trabalho do restaurante todo. É como se um crítico de música escutasse apenas uma música do disco, ou visse apenas 10 minutos de um filme: será que daria pra confiar na opinião desse sujeito?".
Outro ponto importante: se for reconhecido, um crítico tem grandes chances de receber comida e tratamento diferenciados em relação aos demais mortais, produzindo resenhas artificiais, que não retratam a experiência do cliente comum. Os manuais de ética de órgãos como a Associação dos Jornalistas de Comida (EUA) e da própria Folha recomendam que os críticos permaneçam anônimos o tempo todo, mas isso não é fácil para os que mostram a cara em jornais, cursos e eventos (como o próprio Josimar). Moral da história: em meio a tantos conflitos de interesse, resta a mim e a você ler as resenhas com um saudável pé atrás. O guia da Veja pode ser um catálogo fantástico e imprescindível - mas quem tira as minhas conclusões sou eu.
A indicação de um restaurante como o melhor em uma certa categoria é uma escolha totalmente subjetiva de cada jurado. Mas alguns casos são intrigantes. Na categoria cozinha contemporânea, por exemplo, 9 entre 10 jurados escolheram o Maní, e sua dona, Helena Rizzo, ainda foi eleita a chef do ano. Gosto do lugar - agradável, charmosinho, com um pé no rústico-chique e uma chef linda - mas acho que existe um excesso de babação de ovo e deslumbramento no fato de as (diminutas) receitas serem preparadas com técnicas da vanguarda espanhola (o próprio Ferran Adrià já esteve lá). Pode até ser um dos dez contemporâneos mais interessantes (e hypados) de SP, mas não consigo enxergar nele o cacife de ser uma unanimidade absoluta. [Aliás, meu preferido é justamente o que o jurado dissidente escolheu: o Sal].
Essas desconfianças em torno da crítica gastronômica me lembraram um post que li em um blog especializado, o Que Bicho Me Mordeu, questionando o mérito do guia Josimar Melo (editado pelo próprio, que é crítico da Folha de S.Paulo). O que chamou minha atenção não foi propriamente o texto, mas sim os comentários exaltados de donos de restaurantes sobre Josimar. "Ele leu o cardápio durante 10 minutos e depois escolheu o RODÍZIO! E ainda teve a cara de pau de falar dos pratos à la carte na crítica!". "Novidades não muito bem sucedidas, como o nhoque de beterraba com molho de alho poró, ou de ricota defumada - Nunca servi tal aberração! Escreveu sobre o que não comeu e nem existe!""Ele foi só uma vez ao restaurante, logo na inauguração, mas o guia continuou atualizando e até deu estrelas. Será que ele está terceirizando seu serviço?" "Quem é do meio sabe a picaretagem!" Enfim, bafos e mais bafos.
É preciso saber relativizar o que se lê em uma crítica. Além da questão da subjetividade, existe a própria limitação da avaliação, que não dá conta de ir além de uma primeira impressão. Como bem observou um leitor do blog que eu citei, "na maior parte das vezes, nem 10% de um cardápio é avaliado. Então fica difícil tirar conclusões justas sobre o trabalho do restaurante todo. É como se um crítico de música escutasse apenas uma música do disco, ou visse apenas 10 minutos de um filme: será que daria pra confiar na opinião desse sujeito?".
Outro ponto importante: se for reconhecido, um crítico tem grandes chances de receber comida e tratamento diferenciados em relação aos demais mortais, produzindo resenhas artificiais, que não retratam a experiência do cliente comum. Os manuais de ética de órgãos como a Associação dos Jornalistas de Comida (EUA) e da própria Folha recomendam que os críticos permaneçam anônimos o tempo todo, mas isso não é fácil para os que mostram a cara em jornais, cursos e eventos (como o próprio Josimar). Moral da história: em meio a tantos conflitos de interesse, resta a mim e a você ler as resenhas com um saudável pé atrás. O guia da Veja pode ser um catálogo fantástico e imprescindível - mas quem tira as minhas conclusões sou eu.
segunda-feira, 21 de setembro de 2009
Um livro cheio de bons modelos
Com a homossexualidade saindo das sombras e conquistando maior aceitação, é de se esperar que a indústria cultural passe a dar espaço para produtos que nos retratem com menos pudor e mais naturalidade. Estamos assistindo, inclusive, à gestação de dois seriados 100% brasileiros - caRIOcas e Farme 40° - em que os gays passarão de meros coadjuvantes a protagonistas. Mesmo longe de uma inclusão social efetiva, nossa geração sai da toca, consome e se conecta com o mundo, e suas histórias de vida também merecem ser contadas. Um recorte bastante fiel do gay urbano de hoje, que vive a era da internet, do sexo fácil e do culto ao corpo, está em Depois de sábado à noite, romance de estreia do escritor fluminense Kiko Riaze.
Cadu, o protagonista, é um rapaz bonito e inteligente, mas se sente incompleto por não ter um namorado. Em sua busca pelo amor, o mocinho vive uma série de desencontros e fracassos, ao se envolver com tipos variados que ele encontra em suas aventuras pelo Rio de Janeiro (mas que poderiam estar em qualquer lugar). Entre uma tentativa e outra, Cadu se apoia em sua fiel turma de amigos, que o leitor conhecerá melhor ao longo das diversas tramas paralelas que serão desenvolvidas no livro. Do enrustido que vive atormentado (Félix) até a fag hag fervida e devoradora de homens (Michele), passando pelo casal que se vê no impasse de abrir a relação (Laerte e Rubinho), o autor constrói um núcleo de amigos-que-são-uma-família que lembra muito a versão norte-americana do seriado Queer as folk.
Em entrevista concedida à revista Junior poucos meses depois do lançamento, Kiko declarou: "É um mundo praticamente invisível para a sociedade em geral. Quando existe um casal gay na novela, é totalmente estereotipado, eles não têm amigos gays, não fazem programas de gays. Isso precisa ser mostrado". Essa declaração diz muita coisa sobre o livro. Longe de ser uma obra hermética, impenetrável por quem não for do meio, Depois de sábado à noite parece ter sido feita para os héteros lerem e aprenderem sobre o "admirável mundo novo" dos gays. Da descrição dos cenários às gírias faladas por Michele, tudo é apresentado em tom didático, quase professoral, para que até os mais desenturmados consigam saber como as coisas funcionam. Dá para emprestar o livro pros pais tranquilamente - eles não terão dificuldades em aprender o que é uma barbie, por exemplo.
Mas é justamente nas melhores intenções que o livro encontra seu calcanhar de aquiles. O maior problema de Depois de sábado à noite é o excesso de bom-mocismo, que contamina toda a obra. Enquanto os homens que passam pela vida de Cadu (e frustram as expectativas do moço sonhador) são mostrados apenas em seus defeitos, todos os amigos do protagonista são fofos, certinhos, moralmente irrepreensíveis. Entendo que o autor queira construir uma imagem saudável e positiva dos homossexuais, reforçando sua autoestima e destoando dos retratos tradicionalmente angustiados e problemáticos da literatura tradicional, e acho esse esforço louvável. No entanto, na tentativa de passar o máximo de bons exemplos a um público maior, Riaze extrapola na dose do politicamente correto e cria alguns diálogos pouco críveis, transformando os personagens em professores e modelos de conduta. Chama a atenção, sobretudo, o tom exageradamente maniqueísta com que são tratadas questões como o sexo casual e as drogas. Mamãe certamente aprovaria, mas não é assim que a banda toca.
Feitas essas ressalvas, Depois de sábado à noite é um livro agradável e muito bem escrito. O texto hipercorreto de Riaze compromete a oralidade dos diálogos, mas dá conta de descrever as várias passagens de sexo do livro com riqueza e sofisticação, sem descambar para a pornografia. Além disso, os personagens são cativantes (meus prediletos foram o casal Laerte e Rubinho) e as tramas, muito bem amarradas, com desfechos nem sempre previsíveis. Dá para se identificar em vários trechos - e lembrar que a dificuldade de arranjar alguém é a mesma para todos. Agora que Kiko já deu seu bom exemplo à sociedade, vamos ver se no segundo livro (que já está no forno) ele se preocupa menos em ser correto o tempo todo e se solta mais, com personagens menos certinhos e mais humanos. Afinal, nós não precisamos provar nosso valor o tempo todo.
Cadu, o protagonista, é um rapaz bonito e inteligente, mas se sente incompleto por não ter um namorado. Em sua busca pelo amor, o mocinho vive uma série de desencontros e fracassos, ao se envolver com tipos variados que ele encontra em suas aventuras pelo Rio de Janeiro (mas que poderiam estar em qualquer lugar). Entre uma tentativa e outra, Cadu se apoia em sua fiel turma de amigos, que o leitor conhecerá melhor ao longo das diversas tramas paralelas que serão desenvolvidas no livro. Do enrustido que vive atormentado (Félix) até a fag hag fervida e devoradora de homens (Michele), passando pelo casal que se vê no impasse de abrir a relação (Laerte e Rubinho), o autor constrói um núcleo de amigos-que-são-uma-família que lembra muito a versão norte-americana do seriado Queer as folk.
Em entrevista concedida à revista Junior poucos meses depois do lançamento, Kiko declarou: "É um mundo praticamente invisível para a sociedade em geral. Quando existe um casal gay na novela, é totalmente estereotipado, eles não têm amigos gays, não fazem programas de gays. Isso precisa ser mostrado". Essa declaração diz muita coisa sobre o livro. Longe de ser uma obra hermética, impenetrável por quem não for do meio, Depois de sábado à noite parece ter sido feita para os héteros lerem e aprenderem sobre o "admirável mundo novo" dos gays. Da descrição dos cenários às gírias faladas por Michele, tudo é apresentado em tom didático, quase professoral, para que até os mais desenturmados consigam saber como as coisas funcionam. Dá para emprestar o livro pros pais tranquilamente - eles não terão dificuldades em aprender o que é uma barbie, por exemplo.
Mas é justamente nas melhores intenções que o livro encontra seu calcanhar de aquiles. O maior problema de Depois de sábado à noite é o excesso de bom-mocismo, que contamina toda a obra. Enquanto os homens que passam pela vida de Cadu (e frustram as expectativas do moço sonhador) são mostrados apenas em seus defeitos, todos os amigos do protagonista são fofos, certinhos, moralmente irrepreensíveis. Entendo que o autor queira construir uma imagem saudável e positiva dos homossexuais, reforçando sua autoestima e destoando dos retratos tradicionalmente angustiados e problemáticos da literatura tradicional, e acho esse esforço louvável. No entanto, na tentativa de passar o máximo de bons exemplos a um público maior, Riaze extrapola na dose do politicamente correto e cria alguns diálogos pouco críveis, transformando os personagens em professores e modelos de conduta. Chama a atenção, sobretudo, o tom exageradamente maniqueísta com que são tratadas questões como o sexo casual e as drogas. Mamãe certamente aprovaria, mas não é assim que a banda toca.
Feitas essas ressalvas, Depois de sábado à noite é um livro agradável e muito bem escrito. O texto hipercorreto de Riaze compromete a oralidade dos diálogos, mas dá conta de descrever as várias passagens de sexo do livro com riqueza e sofisticação, sem descambar para a pornografia. Além disso, os personagens são cativantes (meus prediletos foram o casal Laerte e Rubinho) e as tramas, muito bem amarradas, com desfechos nem sempre previsíveis. Dá para se identificar em vários trechos - e lembrar que a dificuldade de arranjar alguém é a mesma para todos. Agora que Kiko já deu seu bom exemplo à sociedade, vamos ver se no segundo livro (que já está no forno) ele se preocupa menos em ser correto o tempo todo e se solta mais, com personagens menos certinhos e mais humanos. Afinal, nós não precisamos provar nosso valor o tempo todo.
quarta-feira, 16 de setembro de 2009
A redenção da Koni Store
As temakerias chegaram a São Paulo em 2004, três anos antes de virarem febre Brasil afora. A primeira grande rede, Temaki Express, conquistou os baladeiros como uma opção leve, rápida e barata de lanche na madrugada - mas o arroz era ruim, o peixe tinha gosto de congelado e o salmon skin estava mais para "assolan skin", pois parecia uma palha de aço. Dois anos depois, surgiu no Itaim uma temakeria chamada Ícone, e nela finalmente me encontrei, elegendo o temaki do chef (salmão, shimeji e cream cheese) como meu preferido.
No verão 2007/2008, a mania dos cones chegou ao Rio de Janeiro. A rede Koni Store começou a espalhar suas lojinhas laranjas pela Zona Sul e fui conferir. Achei a qualidade da comida bastante irregular e acabei preferindo os temakis da Yiá!, que disputava o público da Farme. Mas o céu acabou caindo sobre a cabeça deles: a fachada da lanchonete vizinha desabou, colocando um fim precoce à simpática lojinha, que era toda decorada com mangás.
Como eu tinha ficado com um certo bode da Koni Store, mantive-a na geladeira por um bom tempo. No domingo passado, decidi dar uma segunda chance a ela. Saí da praia apressado para o aeroporto e entrei na loja da Farme para pedir dois temakis de salmão com shiitake para viagem. Tive uma impressão bem melhor: os cones eram caprichados, com o peixe fresquinho e as lascas do cogumelo bem macias, e vieram recheados até a base. Gostei tanto que ontem, depois da aula, resolvi ir conhecer a bonita filial que a rede abriu na Joaquim Floriano. Dessa vez, provei uns temakis meio diferentões. E não me arrependi.
Primeiro chamei um Roast Tuna, com rosbife de atum crocante ao shoyu e mel. Novamente muito bem recheado, com o toque suave do mel nos muitos cubos do peixe. Depois, seguindo a dica da simpática Keila, escolhi o Hot Steel, temaki mais pedido do cardápio. No recheio, cubos de truta-da-patagônia envoltos numa finíssima e crocante massinha de harumaki e, para dar o arremate, cream cheese e uma inusitada palha de alho-poró. Gamei: a combinação é mesmo muito boa, e o resultado fica ainda melhor com um reforcinho extra de cream cheese (politicamente incorreto, eu sei!) e da tal palha de alho-poró. Bye bye, Ícone: agora já tenho meu novo temaki favorito.
No verão 2007/2008, a mania dos cones chegou ao Rio de Janeiro. A rede Koni Store começou a espalhar suas lojinhas laranjas pela Zona Sul e fui conferir. Achei a qualidade da comida bastante irregular e acabei preferindo os temakis da Yiá!, que disputava o público da Farme. Mas o céu acabou caindo sobre a cabeça deles: a fachada da lanchonete vizinha desabou, colocando um fim precoce à simpática lojinha, que era toda decorada com mangás.
Como eu tinha ficado com um certo bode da Koni Store, mantive-a na geladeira por um bom tempo. No domingo passado, decidi dar uma segunda chance a ela. Saí da praia apressado para o aeroporto e entrei na loja da Farme para pedir dois temakis de salmão com shiitake para viagem. Tive uma impressão bem melhor: os cones eram caprichados, com o peixe fresquinho e as lascas do cogumelo bem macias, e vieram recheados até a base. Gostei tanto que ontem, depois da aula, resolvi ir conhecer a bonita filial que a rede abriu na Joaquim Floriano. Dessa vez, provei uns temakis meio diferentões. E não me arrependi.
Primeiro chamei um Roast Tuna, com rosbife de atum crocante ao shoyu e mel. Novamente muito bem recheado, com o toque suave do mel nos muitos cubos do peixe. Depois, seguindo a dica da simpática Keila, escolhi o Hot Steel, temaki mais pedido do cardápio. No recheio, cubos de truta-da-patagônia envoltos numa finíssima e crocante massinha de harumaki e, para dar o arremate, cream cheese e uma inusitada palha de alho-poró. Gamei: a combinação é mesmo muito boa, e o resultado fica ainda melhor com um reforcinho extra de cream cheese (politicamente incorreto, eu sei!) e da tal palha de alho-poró. Bye bye, Ícone: agora já tenho meu novo temaki favorito.
segunda-feira, 14 de setembro de 2009
Verdinha simpática
Meu feriado no Rio deixou um gostinho de quero mais e resolvi, de sopetão, voltar à cidade no último fim de semana. Como decidi a viagem de última hora, ia ser difícil encontrar tarifas justas (em se tratando de ponte aérea, só pago mais de R$150 por trecho em caso de emergência). Fui cotar preços no Submarino Viagens e me deparei com a WebJet, companhia aérea da qual eu nunca havia ouvido falar (depois as aeromoças me contariam que a empresa, carioca, já tem cinco anos de mercado). Como o preço estava bem OK - R$ 139 por um trecho avulso, comprado com apenas 24 horas de antecedência - resolvi experimentar.
E tive uma ótima surpresa. O voo foi pontualíssimo e a tripulação, muito amável. E o que dizer da poltrona? O ângulo de reclinação do encosto é o maior que já vi em 31 anos de classe econômica. Para arrematar, um serviço de bordo muito além do que eu poderia esperar numa ponte aérea, com sanduíche de presunto defumado, queijo gouda e cream cheese e um úmido e fresquinho brownie com calda de chocolate. E o melhor: sem pedirem um tostão a mais por isso (enquanto a Gol passou a cobrar pelo lanche oferecido aos passageiros).
As companhias aéreas alegam que não podem oferecer serviços mais baratos por conta da carga tributária brasileira. Após a saída de cena de Vasp, Transbrasil e Varig, as duas empresas que dominaram o mercado doméstico (TAM e Gol) sentiram-se numa posição bastante confortável. Com a chegada de novos concorrentes, finalmente precisarão rebolar para fisgar e manter a clientela. Em abril, testei a Ocean Air até Belo Horizonte e também fiquei bem impressionado - o avião é confortável e tem bom espaço entre as fileiras. A Azul só não me pegou ainda porque a ideia do deslocamento até o aeroporto de Viracopos dá uma certa preguiça, ainda que a companhia ofereça ônibus de graça. Com a Webjet, passarei a ter uma quinta opção antes de recorrer aos ônibus-frigoríficos da Viação 1001. A única coisa que eu dispensaria é a saudação "uma web-boa noite a todos", que me lembrou os "pat-beijos" do Clube da Criança.
E tive uma ótima surpresa. O voo foi pontualíssimo e a tripulação, muito amável. E o que dizer da poltrona? O ângulo de reclinação do encosto é o maior que já vi em 31 anos de classe econômica. Para arrematar, um serviço de bordo muito além do que eu poderia esperar numa ponte aérea, com sanduíche de presunto defumado, queijo gouda e cream cheese e um úmido e fresquinho brownie com calda de chocolate. E o melhor: sem pedirem um tostão a mais por isso (enquanto a Gol passou a cobrar pelo lanche oferecido aos passageiros).
As companhias aéreas alegam que não podem oferecer serviços mais baratos por conta da carga tributária brasileira. Após a saída de cena de Vasp, Transbrasil e Varig, as duas empresas que dominaram o mercado doméstico (TAM e Gol) sentiram-se numa posição bastante confortável. Com a chegada de novos concorrentes, finalmente precisarão rebolar para fisgar e manter a clientela. Em abril, testei a Ocean Air até Belo Horizonte e também fiquei bem impressionado - o avião é confortável e tem bom espaço entre as fileiras. A Azul só não me pegou ainda porque a ideia do deslocamento até o aeroporto de Viracopos dá uma certa preguiça, ainda que a companhia ofereça ônibus de graça. Com a Webjet, passarei a ter uma quinta opção antes de recorrer aos ônibus-frigoríficos da Viação 1001. A única coisa que eu dispensaria é a saudação "uma web-boa noite a todos", que me lembrou os "pat-beijos" do Clube da Criança.
quarta-feira, 9 de setembro de 2009
All you can eat
"Que bom que você me procurou", disse-me o rapaz do Flamengo, cujo perfil eu havia visto em um desses sites de encontros, tipo Disponível. "Confesso que pensei que você não fosse ligar quando estivesse aqui no Rio". Estranhei: eu não tinha dado nenhum sinal de que fosse um daqueles enroladores que não ousam sair do virtual. E ele não era o tipo de cara que alguém em sã consciência colocaria na geladeira - gostoso, másculo, não havia mentido em nada no perfil e parecia ainda mais atraente ao vivo. Por que eu não ligaria, então?
"É que os caras de fora em geral nunca ligam. Quando combinam a coisa virtualmente, eles até acham que vão te ligar. Mas aí eles chegam aqui no Rio e ficam loucos com tanta oferta, e então simplesmente colocam você de lado, esquecem mesmo". Ele explicou que já estava acostumado com isso, mesmo quando o papo virtual era promissor e sugeria afinidades dentro e fora da cama. Apesar dos freqüentes desencontros, insistia na internet. Estava cansado desse jogo de consumo imediato do qual ele mesmo já participara tanto, e tinha a esperança de que ali pudesse encontrar pessoas que não o descartassem tão rápido.
Botar as asas para fora e tirar uma casquinha dos sabores locais é um prazer que faz parte da aventura de sair de casa e visitar um lugar novo - negar esse desejo é pura hipocrisia. No Rio de Janeiro, a cidade mais sacana do mundo, onde a carne é de primeira e o radar sexual das pessoas funciona 24 horas por dia, esse comportamento parece ainda mais justificável. Não estou aqui para ditar o "certo" ou condenar o "errado", em tom moralizador, mas parei e pensei nas pessoas que devoram todos os homens que aparecem pelo caminho, tudo ao mesmo tempo agora, mesmo quando não estão na pele do turista.
De fato, muitos encontram nesse tipo de atitude um caminho de realização plena - livre, saudável, bem resolvido e sem culpas. Mas outros tantos são o tipo de gente que não liga para o moreno do Flamengo, mas depois vive se queixando da solidão, sem se dar conta das chances que desperdiça a todo momento. Ao atirar para todos os lados e se empanturrar no bufê all you can eat, que fome é essa que eles estão tentando aplacar e não conseguem? Talvez nem eles saibam a resposta.
"É que os caras de fora em geral nunca ligam. Quando combinam a coisa virtualmente, eles até acham que vão te ligar. Mas aí eles chegam aqui no Rio e ficam loucos com tanta oferta, e então simplesmente colocam você de lado, esquecem mesmo". Ele explicou que já estava acostumado com isso, mesmo quando o papo virtual era promissor e sugeria afinidades dentro e fora da cama. Apesar dos freqüentes desencontros, insistia na internet. Estava cansado desse jogo de consumo imediato do qual ele mesmo já participara tanto, e tinha a esperança de que ali pudesse encontrar pessoas que não o descartassem tão rápido.
Botar as asas para fora e tirar uma casquinha dos sabores locais é um prazer que faz parte da aventura de sair de casa e visitar um lugar novo - negar esse desejo é pura hipocrisia. No Rio de Janeiro, a cidade mais sacana do mundo, onde a carne é de primeira e o radar sexual das pessoas funciona 24 horas por dia, esse comportamento parece ainda mais justificável. Não estou aqui para ditar o "certo" ou condenar o "errado", em tom moralizador, mas parei e pensei nas pessoas que devoram todos os homens que aparecem pelo caminho, tudo ao mesmo tempo agora, mesmo quando não estão na pele do turista.
De fato, muitos encontram nesse tipo de atitude um caminho de realização plena - livre, saudável, bem resolvido e sem culpas. Mas outros tantos são o tipo de gente que não liga para o moreno do Flamengo, mas depois vive se queixando da solidão, sem se dar conta das chances que desperdiça a todo momento. Ao atirar para todos os lados e se empanturrar no bufê all you can eat, que fome é essa que eles estão tentando aplacar e não conseguem? Talvez nem eles saibam a resposta.
sexta-feira, 4 de setembro de 2009
Férias cor-de-rosa
Quando eu troquei a esfiha pelo kibe, no final da década passada, a ideia de "turismo gay" no Brasil se resumia a uma única palavra: Rio. Rapazes do país inteiro se encontravam na Cidade Maravilhosa para o Réveillon, o Carnaval e as tão aguardadas festas X-Demente, em torno das quais o povo agendava viagens e programava a própria vida. Alguns anos depois, as cidades de Florianópolis e São Paulo também entraram no páreo, a primeira como destino alternativo de verão e a segunda por conta da Parada Gay, com visibilidade crescente e uma programação paralela de festas e eventos. O Brasil começava a descobrir que esse público exigente, consumista, hedonista e sem filhos tinha um potencial de consumo formidável: ganharia um bom dinheiro quem aprendesse a respeitá-lo e entender suas necessidades. Mas, tirando uma festa aqui e uma pousadinha acolá, não havia ainda sinal de produtos pensados especificamente para os LGBT.
Nos dias de hoje, parece que o mercado está finalmente dando um passo nesse sentido. Enquanto prefeituras de grandes centros como Recife, Rio e Salvador investem em capacitação - do setor turístico/hoteleiro aos policiais militares - para lidar com o público gay, a iniciativa privada vai ensaiando uma profissionalização e criando produtos específicos para esse nicho, nos moldes do que se vê no Exterior, onde a segmentação é tanta que há empresas diferentes para organizar cruzeiros para homens e mulheres. O Brasil começou a navegar por esses mares neste ano: em fevereiro zarpou de Santos o primeiro cruzeiro gay nacional, chamado Freedom on Board, que levou um grupo bem animado até Florianópolis. A experiência deu certo e a segunda edição já tem data marcada: 05/02/2010, desta vez com destino a Búzios.
Agora a mídia começa a divulgar um novo projeto que vai acontecer em novembro, na Costa do Sauípe (BA), chamado Heaven & Hell. O formato vem da América do Norte: um resort é fechado por alguns dias para uma programação direcionada ao público gay. No caso do H&H, o mote do evento são festas eletrônicas que acontecerão durante três dias, com produção a cargo de selos brasileiros, argentinos e norte-americanos. No lugar de famílias com crianças pentelhas, as piscinas serão tomada por marmanjos interessados em travessuras bem mais adultas. Se houver tempo hábil para que o evento seja promovido satisfatoriamente (não entendo por que demoraram tanto para começar a divulgação, se eu já estava sabendo do H&H desde abril!), o resultado pode ser bem interessante.
Ao mesmo tempo em que vejo essas novas iniciativas com entusiasmo, não deixo de pensar se realmente faz sentido a ideia de um turismo gay altamente segmentado. No fundo, isso se insere naquela discussão mais ampla, sobre se há ou não uma "cultura gay". Concordo que temos alguns gostos peculiares, mas será que realmente precisamos transportar nosso gueto para onde quer que viajemos? Será que somos tão diferentes e temos necessidades tão especiais assim? Talvez não seja essa a questão. No fundo, não precisaríamos de nada disso se pudéssemos nos divertir, brincar e trocar carinhos em qualquer lugar, sem nos preocuparmos com a reação de terceiros, sem sermos recriminados e perseguidos. Como não nos é dado esse direito, o jeito é permanecer na redoma, e prestigiar lugares onde sabemos que seremos bem tratados. Afinal, férias não rimam com frustração e constrangimento.
Nos dias de hoje, parece que o mercado está finalmente dando um passo nesse sentido. Enquanto prefeituras de grandes centros como Recife, Rio e Salvador investem em capacitação - do setor turístico/hoteleiro aos policiais militares - para lidar com o público gay, a iniciativa privada vai ensaiando uma profissionalização e criando produtos específicos para esse nicho, nos moldes do que se vê no Exterior, onde a segmentação é tanta que há empresas diferentes para organizar cruzeiros para homens e mulheres. O Brasil começou a navegar por esses mares neste ano: em fevereiro zarpou de Santos o primeiro cruzeiro gay nacional, chamado Freedom on Board, que levou um grupo bem animado até Florianópolis. A experiência deu certo e a segunda edição já tem data marcada: 05/02/2010, desta vez com destino a Búzios.
Agora a mídia começa a divulgar um novo projeto que vai acontecer em novembro, na Costa do Sauípe (BA), chamado Heaven & Hell. O formato vem da América do Norte: um resort é fechado por alguns dias para uma programação direcionada ao público gay. No caso do H&H, o mote do evento são festas eletrônicas que acontecerão durante três dias, com produção a cargo de selos brasileiros, argentinos e norte-americanos. No lugar de famílias com crianças pentelhas, as piscinas serão tomada por marmanjos interessados em travessuras bem mais adultas. Se houver tempo hábil para que o evento seja promovido satisfatoriamente (não entendo por que demoraram tanto para começar a divulgação, se eu já estava sabendo do H&H desde abril!), o resultado pode ser bem interessante.
Ao mesmo tempo em que vejo essas novas iniciativas com entusiasmo, não deixo de pensar se realmente faz sentido a ideia de um turismo gay altamente segmentado. No fundo, isso se insere naquela discussão mais ampla, sobre se há ou não uma "cultura gay". Concordo que temos alguns gostos peculiares, mas será que realmente precisamos transportar nosso gueto para onde quer que viajemos? Será que somos tão diferentes e temos necessidades tão especiais assim? Talvez não seja essa a questão. No fundo, não precisaríamos de nada disso se pudéssemos nos divertir, brincar e trocar carinhos em qualquer lugar, sem nos preocuparmos com a reação de terceiros, sem sermos recriminados e perseguidos. Como não nos é dado esse direito, o jeito é permanecer na redoma, e prestigiar lugares onde sabemos que seremos bem tratados. Afinal, férias não rimam com frustração e constrangimento.
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